Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 17 de junho de 2015

Deixa Rolar (2015): mais do mesmo clichê de sempre

Uma obra tão genérica quanto vazia, que poderia muito bem ser resumida em um pedaço de guardanapo.

É cansativo tedeixarolar_1r que ficar repetindo expressões como “clichê”, “comédia romântica pasteurizada”, “fórmula hollywoodiana” e coisas do tipo, toda vida que chega aos cinemas… uma comédia romântica pasteurizada e clichê que segue a mesma fórmula hollywoodiana presente em 90% da indústria em questão. Neste sentido, o próprio texto crítico vira uma espécie de espelho daquilo que se propõe a criticar. Todavia, este “Deixa Rolar” merece uma atenção em especial, levando os níveis de previsibilidade e cafonice a um patamar jamais imaginado, ainda que o casal protagonista e o dinamismo da narrativa impeçam um desastre completo.

Aqui, o cara (Chris Evans) conhece a garota (Michelle Monaghan) em uma festa beneficente e se apaixona por ela. Escritor de cinema em fase de bloqueio criativo e pressionado pelo chefe, ele procura material e ideias para concluir seu roteiro, e a aparição daquela que parece ser a “mulher de seus sonhos” pode ajudá-lo nessa missão. Ela, comprometida e prestes a noivar, começa a ter segundos pensamentos a respeito do seu relacionamento e encontra na figura interpretada por Evans aquilo que sempre desejou em um companheiro, estabelecendo, assim, toda uma esquemática dinâmica ‘desejo/paixão X dever/ética’ que conduz a ação do longa.

É bom deixar claro que a expressão “o cara conhece a garota” não é apenas uma referência à fórmula “boys meets girl” já tão conhecida do grande público, mas sim como os protagonistas são referidos durante todo o enredo. Em nenhum momento ficamos sabendo os seus nomes. Ele, o narrador, assume o papel do contador da história; toda ela, portanto, é acompanhada sob o seu ponto de vista masculino. Uma abordagem tão fria como  pouco inovadora, de modo que a falta de nomes para o casal apenas reforça o quão genérico é o conteúdo daquilo que estamos acompanhando.

De fato, pouco importa a alcunha de ambos, uma vez que qualquer estereotipo de Hollywood poderia ser encaixado naquele contexto, e os realizadores, ironicamente, parecem saber disso e tirar sarro da situação. Algo que, se eles não se autossabotassem ao se render às resoluções fáceis que costumamos ver em obras do gênero, poderia soar como um elemento interessante e inteligente, o que não é o caso. Assim, acredito que faltou experiência ao diretor estreante Justin Reardon para conduzir melhor o sarcasmo presente no roteiro dos também novatos Chris Shafer e Paul Vicknair, ainda que a maior parte da culpa pela previsibilidade e fragilidade da história, provavelmente o maior problema do filme, seja inegavelmente da dupla escritora.

O conteúdo vago e genérico que acompanhamos é perfeitamente representado pela cena onde o chefe do “cara” o apresenta, em um pedaço de guardanapo, como é fácil fazer uma comédia romântica, numa tentativa de cobrar-lhe resultados mais efetivos quanto a entrega do roteiro que ele se comprometeu a fazer. Basicamente o filme inteiro está desenhado naquele pedaço de papel, numa constrangedora metalinguagem que acabou por sair pela culatra; o “boy meets girl”, o conflito forçado para gerar um drama meia boca, os amigos sidekicks que servem como alívio cômico e eventualmente desempenham um papel de abrir os olhos do protagonista, as discussões superficiais sobre o que é amor, amizade entre homem e mulher, etc.

O que impede uma catástrofe completa é mesmo o carisma de Monaghan e Evans, que encarnam com carinho e doçura os personagens rasos que personificam. Almejando ser algo como modelos a serem seguidos tanto por homens quanto mulheres, como normalmente acontece em obras do tipo, ambos entregam o que se pede deles, ainda que isso não seja muito. Além disso, Reardon é inventivo o suficiente para bolar inserções em tela que representam uma espécie de esquetes que acontecem na imaginação do protagonista, mas que também encontram ressonância no fio principal da narrativa, em uma tentativa razoavelmente bem sucedida de dar mais estofo ao longa, uma vez que o enredo e as camadas presentes na história, per si, não “seguram as pontas” com eficiência.

Assim, entre gags visuais e um truque ou outro, com bons atores conduzindo o romance adiante, o fato é que não sobra muita coisa quando analisamos o conteúdo e a trama como um todo. O padrão mediano (medíocre) de sempre e mais do mesmo.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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