Cinema com Rapadura

Críticas   segunda-feira, 01 de junho de 2015

Trocando os Pés (2015): uma bobagem honesta e divertida

Longa de premissa curiosa esbarra na limitação de seu roteiro para alçar voos mais altos, mas resultado final é razoavelmente satisfatório.

Sempre que estreia utrocandoospesm novo filme do Adam Sandler, o grande público se divide basicamente em dois lados: os que lamentam sua chegada, esperando mais uma bizarrice (com razão, na maior parte das vezes); e os que comemoram, ainda que de modo mais ou menos contido, uma vez que gostam do tipo de humor do astro hollywoodiano. Nem tanto, nem tão pouco. Adam Sandler já fez alguns filmes interessantes ao longo de sua carreira e é um ator melhor, ainda que nada espetacular, do que a enxurrada de obras constrangedoras que protagonizou lhe (des)creditam. É o caso deste “Trocando os Pés”, um longa de premissa curiosa, bobinho, mas que consegue prender a atenção do espectador de maneira divertida e descontraída.

Dirigido por Thomas McCarthy e escrito por este juntamente com Paul Sado, aqui acompanhamos a história do infeliz Max Simkin (Sandler), descendente de uma tradicional linhagem de sapateiros do centro de Nova York, onde ele próprio agora toca o negócio. Triste, trabalhando num ramo que não lhe satisfaz, com o pai afastado da família e morando junto com a idosa mãe que mal sai da cama, Max possui fortes tendências depressivas. Sua vida muda quando ele descobre, no porão de sua loja, uma antiga máquina de moldar solas de calçados (introduzida no início do filme) que parece possuir propriedades mágicas.

Transitando com eficiência entre o drama e a comédia, em momento algum o longa se leva muito a sério. Afinal, diante de tal pressuposto fantasioso, a última que coisa o público irá fazer é justamente levá-lo a sério. Todavia, McCarthy é extremamente feliz ao apostar naquilo que é a essência de toda boa fantasia: a utilização de elementos fantásticos para explorar angústias humanas e reais. Existe certa poesia em você acompanhar uma pessoa que não gosta de si nem do que faz se transformar em outro indivíduo apenas colocando outro calçado; e é nisso que os realizadores apostam como a subjetividade que dá toda uma outra conotação a um conto superficialmente ingênuo.

Apoiado por um figurino de roupas sempre largas, despojadas, juntamente com uma barba que lhe dá a aparência de um homem de meia-idade já desgastado pelo tempo e pelas infelicidades que o rodeiam, Adam Sandler entrega um trabalho digno, ainda que não seja uma atuação particularmente marcante, uma vez que este diferencial esbarra na limitação de sua capacidade como ator. Quem rouba a cena é mesmo Dustin Hoffman, no papel do pai de Max, por mais que apareça poucas vezes. Junte-se a isso uma trilha sonora que pontua bem as diversas facetas da película e uma fotografia correta, então temos uma composição técnica e artística bastante satisfatória.

O grande problema fica mesmo por conta do roteiro esquemático, que aposta na velha fórmula hollywoodiana de encontros e desencontros, conflitos forçados, piadinhas sem graça e desfechos previsíveis, e acaba ficando bem aquém daquilo que seu potencial indicava que poderia alcançar. As motivações de Max, por vezes, são basicamente incompreensíveis, como que colocadas ali apenas para justificar as situações que se desenrolam ao longo dos quase cem minutos de projeção.

De todo modo, é um filme que consegue entregar com relativa eficiência aquilo que promete. Ainda que de maneira formulaica, temos uma “dramédia” um tanto quanto irregular, inofensiva, que se usa de elementos fantasiosos para discorrer, com bom humor, sobre nossos medos, anseios e angústias mais profundas. Pena que não tenha ido tão “profundo” quanto poderia.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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