Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 01 de junho de 2015

Terremoto – A Falha de San Andreas (2015): um desastre sem impacto

Uma obra que não funciona como drama familiar, menos ainda como um filme-catástrofe. É genérico por essência.

O subgênero chamado de filmes-catástrofes sempre foi algo bastante explorado na sétima arte, principalmente em grandes produções. É um filão que, em Hollywood, nunca saiu dos holofotes, já que os desastres empreendidos são inúmeros. Eventos que vão desde flagelos ambientais e rupturas espaciais – “Twister” (1996), “O Impossível” (2012), “O Dia depois de Amanhã” (2004) e “Impacto Profundo” (1998) – a incidentes terrenos e invasões alienígenas ou mesmo contaminações virais – “Titanic” (1997), “Inferno na Torre” (1974), “Independence Day” (1996) e “Guerra Mundial Z” (2013).

O sucesso está relativo ao medo e curiosidade das pessoas sobre como foi ou será se tais casos ocorressem eminentemente. Imagine voltar no tempo e registrar o naufrágio de uma enorme embarcação, ou presenciar o terror de um acidente aéreo. Mais ainda, ter acesso aos últimos momentos do nosso planeta, devastado por uma inundação. Com a tecnologia que temos o limite é quase nenhum. No entanto, mesmo que os fatos sejam bem representados por incríveis efeitos práticos e digitais, é fundamental que o drama humano seja o ponto central da trama. Não é à toa que lembramos mais da aflição dos personagens e torcemos pelo resgate.

De certa maneira, esta é a lógica seguida pelo blockbuster da semana, “Terremoto – A Falha de San Andreas”, uma superprodução estrelada pelo astro Dwayne Johnson, que interpreta o piloto de salvamento Ray, um sujeito que sofre e se culpa pela morte da filha, o distanciamento da família e com o dia do divórcio, que se aproxima. O mundo parece desabar ao seu redor, o que literalmente acontece, quando um gigantesco terremoto atinge a Califórnia e, segundo dados pseudocientíficos, causará uma enorme destruição em massa, afetando boa parte do território americano.

Na trama também é destacada a filha de Ray, a jovem e resolvida Blake, vivida pela lindíssima Alexandra Daddario, que acaba sendo o único elo entre o piloto e sua esposa, Emma (Carla Gugino). Não vemos aqui um herói salvando pessoas – aliás, o auxílio à população mal é comentado –, mas um homem aflito indo ao resgate da família. O que devia ter sido uma interessante decisão por parte do cineasta Brad Peyton (“Como Cães e Gatos 2: A Vingança de Kitty Galore“), o lance de focarem na luta pela sobrevivência do grupo – mesmo porque, o outro núcleo da história, liderado pelo geógrafo Lawrence (Paul Giamatti), serve apenas como critério informativo da trepidação.

Disse que devia, pois a maioria dos personagens não é identificável com o público. Justamente pelo fato de serem simples arquétipos, figuras unidimensionais que servem a um propósito, sabotando completamente a ideia proposta inicialmente.

Não bastasse o arco dramático não funcionar, o filme é recheado de clichês mal utilizados e cenas requentadas de títulos já citados aqui. Se não nos preocupamos com os protagonistas, imagine então os figurantes que são inseridos apenas parte do cenário. Um andamento representa bem isso, quando na tentativa de vilanizar ainda mais o atual marido de Emma, o empresário Daniel Riddick (Ioan Gruffudd), depois de já ter abandonado sua enteada e parecer um monstro louco pelo poder, o vemos jogar um dos figurantes na berlinda, no intuito de se salvar. Algo completamente maniqueísta.

Esse é o menor dos incômodos, uma vez que as muletas usadas para que o frágil roteiro ande são intragáveis. Texto que é assinado por Carlton Cuse (“Lost“). A suspensão de descrença tem que ser elevada ao mais alto nível de estupidez. Em situações mais difíceis, objetos simplesmente surgem, encontros inesperados acontecem e poderes sobre-humanos aparecem. Vemos pessoas com ferros transfixados no corpo ignorarem os ferimentos, outros passarem longos minutos sem respirar submersos por água, ou sobreviverem a incríveis acidentes tendo só alguns arranhões. Ou seja, em nenhum momento tememos pelas consequências.

Nem os efeitos visuais impressionam como em outrora. Os muitos prédios, construções e represas destruídas soam absolutamente artificiais. Principalmente quando há ações em meio a todo falso cenário, onde o uso do chroma key é notado claramente. O elenco, ainda que não comprometa, também está aquém do que podia. Talvez a Daddario ganhe destaque por participar de mais cenas e, no fim das contas, aparecer como a verdadeira protagonista do conto. Sobre The Rock, novamente é beneficiado pelo carisma latente, mas que quando é exigido em cenas mais dramáticas, o resultado é tão ruim que quase beira o ridículo.

No frigir dos ovos, mesmo que tenha ido inicialmente por um caminho inteligente, “Terremoto – A Falha de San Andreas” acaba sendo um dos exemplos mais negativos do estilo. Não funciona como drama familiar, menos ainda como um filme-catástrofe. É genérico por essência e não traz nenhuma novidade. Deverá ser esquecido em breve, por ser extremamente inócuo a qualquer tipo de proposta. Não consegue causar tensão ou mesmo emocionar, ainda que aborde um fenômeno tão devastador e recorrente. Uma obra que não diz bem a que veio.

Wilker Medeiros
@willtage

Compartilhe