Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 21 de abril de 2013

Thérèse Desqueyroux (2012): adaptação morna tem ritmo incerto

Roteiro problemático e irregular torna a nova adaptação do romance de François Mauriac estagnada e monótona.

kinopoisk.ruDurante a sua campanha publicitária, “Thérèse Desqueyroux” adotou em seus pôsteres tanto seu nome original quanto a abreviação “Thérèse D”. A opção de suprimir o sobrenome dá destaque à personagem título, vivida por Audrey Tautou, de maneira mais individual, abstraindo sua origem. Este contraste entre a individualização da protagonista e seu sobrenome, como a estrutura social na qual está inserida, é o eixo da produção francesa, uma segunda adaptação do romance de François Mauriac.

Na região rural da França de 1920, a infância de Thérèse se desdobra ao lado da amiga Anne, entre brincadeiras e conversas sobre o futuro. Desde criança, a primeira apresenta-se independente e questionadora, porém indecisa e confusa com as próprias ideias. Por medo dessas ideias, já adulta, casa-se com Bernard Desqueyroux (Gilles Lellouche) em uma união arranjada que garantirá a estabilidade econômica de ambas as famílias dos noivos.

Até que o motivo de seu casamento, as terras com pinheiros a serem herdadas pelo casal, torna-se uma prisão, dentro da qual ela lentamente definha enquanto sua liberdade é podada. As árvores retratadas na bela fotografia de Gérard de Battista tornam-se grades que rodeiam a moradia da protagonista, domando seus anseios dentro de uma sociedade prosaica e teatral. E se contrastada com as cores escuras e uma paleta mais fechada predominante no filme, o barco de velas vermelhas do sonhador Jean Azevedo exala desejo e emoção.

O jovem amante de Anne (Anais Demoustier), vivido por Stanley Weber, aproxima-se de Thérèse como um homem apaixonado pela vida e, em conversas com ela, tanto a inspira quanto a faz realizar sobre sua infeliz situação. O figurino acompanha a infelicidade e a resultante decadência da personagem, à medida que se torna predominantemente escuro até culminar no ponto de confrontarmos uma mulher pálida e magra, como uma assombração dos antigos filmes de terror em preto e branco.

Entretanto, o roteiro é tão monótono quanto as cores do figurino ou o clima nublado da região. O script se desenvolve em um ritmo lento e com inúmeras falhas e, aliado a uma montagem que abusa de fade outs, torna o filme tedioso. A partir do segundo ato, ao presenciarmos os conflitos da protagonista e suas reações, esta se configura como estática e não notamos grande evolução ou aprofundamento em seu estado. O descuido com a filha recém-nascida ou uma posição indiferente a um ato extremo de escape estão imersos em uma estagnação tão grande que dificulta a ligação emocional com o espectador. Além disso, o clímax desvalorizado tem final em uma resolução abrupta e pouquíssimo efetiva, como se um problema trabalhado durante toda a projeção fosse resolvido com pressa, de forma simples e superficial.

Mesmo a atuação da talentosa Audrey Tautou é prejudicada pelos problemas do roteiro, enquanto ela tenta construir uma personagem complexa, mas sem maior desenvolvimento ao longo da trama. Gilles Lellouche acaba sendo o grande destaque, vivendo Bernard Desqueyroux como um homem rígido moldado pela estrutura social da época e que chega a seu limite. Assim, esse último trabalho do diretor Claude Miller,que faleceu no ano passado, acerta na caracterização da época e na fotografia contrastante, mas tem em seu roteiro um grande problema de ritmo que acaba por prejudicar o andamento do filme, tornando-o uma produção caracterizada pela monotonia e estagnação.

Mateus Almeida
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