Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 25 de agosto de 2012

A Casa Silenciosa (2011): terror não aproveita o potencial da trama

Refilmagem americana do longa uruguaio traz roteiro inteligente, mas não consegue manter as discussões propostas e cai em um desfecho raso e desinteressante.

“Se você cobrir, quem irá saber?”, diz Sarah (Elizabeth Olsen) referindo-se ao buraco na parede da casa enquanto seu pai John (Adam Trese) e seu tio Peter (Eric Sheffer Steves) pensam em um modo de consertar o problema. A metáfora se torna (desnecessariamente) mais clara em outra cena, onde a protagonista diz que parece ter buracos na cabeça, queixando-se por não se lembrar de Sophia (Julia Taylor Ross), uma suposta amiga de infância.

Neste cenário de representações, mergulhamos no terror (quase) psicológico de “A Casa Silenciosa”. O silêncio da casa é o silêncio de Sarah, que quer “tapar o buraco”, quer esquecer o passado, pois este é terrível e inaceitável. Mas um dia, ele volta para firmar uma resolução, satisfazendo um desejo contido à força por muito tempo.

Esta é claramente a ideia da sequência de abertura do filme, onde a protagonista se encontra pensativa em frente ao mar e depois caminha até a casa. Assim como o mar, o inconsciente é vasto e desconhecido, e assim como Sarah, algo mal resolvido precisa se manifestar, emergindo e reclamando seu lugar, tomando a forma que for (a casa). Dessa maneira, o longa demonstra um ótimo trabalho simbólico, pouco comum em produções do gênero.

Como na versão original uruguaia de 2010, “A Casa”, a premissa não poderia ser mais simples e aberta. Sarah ajuda seu pai e seu tio a organizar a antiga casa da família para posterior venda. Durante o processo, coisas estranhas e ameaçadoras começam a acontecer. O roteiro de Laura Lau – que também dirige o filme ao lado de Chris Kentis – procura evitar o didatismo, trabalhando a personagem principal por meio de diálogos e situações banais, mas que guardam pistas sutis a respeito do que realmente se trata a história.

Além do enredo, o filme também importa a estética do original: a câmera na mão, a fotografia sombria e dessaturada, os enormes planos sequência e a montagem com cortes pontuais e “escondidos”, simulando uma filmagem contínua. A direção de Kentis e Lau resolve muito bem a mise-en-scène – o que é bastante complicado em planos sequência –, elaborando uma coreografia entre os movimentos dos personagens e a câmera de Igor Martinovic que resulta em uma dinâmica narrativa eficiente.

A partir do segundo ato, o longa mostra suas falhas, a começar pela atriz Elizabeth Olsen (irmã mais nova das famosas gêmeas Ashley e Mary-Kate). Se no início Olsen tinha uma atuação carismática e naturalista, quando começa a correr e a chorar já não convence mais. Algumas expressões de horror contido – para não chamar a atenção de quem a persegue – chegam a ser risíveis de tão forçadas. Isso quebra o grande vínculo que havia entre o espectador e a personagem, tornando-a distante apesar dos constantes planos fechados.

Além disso, boa parte do mistério e suspense construídos no primeiro ato é perdida quando a fonte do terror é revelada cedo demais. No momento em que há uma identificação visual, sabemos com o que estamos lidando e reagimos de acordo com isso. Perde-se uma boa oportunidade de gerar dúvidas e inseguranças sobre a natureza da figura em questão: real ou sobrenatural? Ainda que mais adiante esta identificação seja repensada, ela prejudica consideravelmente a atmosfera do filme até lá, repetindo o mesmo erro da versão uruguaia.

O terceiro ato apresenta algo que compensa muitos defeitos do longa, mas o desfecho desta ideia é bastante aquém de seu potencial. Um exemplo disso é Sophia, uma personagem introduzida de forma interessante no começo, mas que é muito mal aproveitada durante a resolução da trama, não tendo sua função justificada. Além disso, o conflito que era interno e sugestivo se torna puramente físico, desvirtuando mais uma vez a atmosfera tenebrosa da obra.

“A Casa Silenciosa” trabalha com simbolismos interessantes – o mar, o buraco, os espelhos, a lareira, a cor vermelha e a própria casa –, mas apresenta o mesmo problema de boa parte dos filmes de gênero: começa bem, mas o final deixa muito a desejar. O medo de perder o grande público caso desenvolva melhor as discussões propostas limita a obra apenas à metade de seu potencial. A utilização de clichês e convenções torna tudo mais fácil de fazer e de agradar, deixando os espectadores mais exigentes com o gosto amargo do comércio hollywoodiano.

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Thiago César é formado em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mas aspirante a cineasta. Já fez cursos na área de audiovisual e realiza filmes independentes.

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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