Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 29 de janeiro de 2011

Caça às Bruxas

Nicolas Cage apronta mais uma.

Por mais que esteja se tornando repetitivo abordar nos textos sobre os filmes estrelados por Nicolas Cage as péssimas escolhas que o ator tem feito na carreira, nunca é demais reforçar quando estamos diante de mais uma. Com uma média ridícula de quase três lançamentos por ano, Cage segue autoboicotando o seu antes inquestionável talento ao optar protagonizar obras como “O Aprendiz de Feiticeiro”, “Perigo em Bangkok” e “O Vidente”, enquanto tenta compensar o mau-gosto de suas preferências com o sensacional “Vício Frenético” e o ótimo “Kick-Ass – Quebrando Tudo”. No entanto, quando se coloca na balança, seu resultado é inegavelmente negativo, pendendo ainda mais para o mesmo lado depois deste horroroso “Caça às Bruxas”, um sonolento e vazio thriller de terror que não dá susto em ninguém.

Com mais um visual capilar bisonho (agora ele está meio louro), Cage interpreta o cavaleiro medieval Behmen, um homem até então dedicado a servir à Igreja Católica e conhecido pelas vitórias sangrentas obtidas durante as famosas e polêmicas Cruzadas. O cavaleiro, porém, decepciona-se com a falta de justificativa e o autoritarismo da chamada “guerra santa” e deixa o movimento militar-religioso, partindo em direção à Europa, de volta à sua terra natal, mas ainda atormentado pelas experiências vivenciadas.

Durante o caminho, ao lado do amigo Felson (Ron Perlman), ele esbarra em um povoado devastado pela fome e pela peste negra, além de tomado por crenças extremistas. Depois de aprisionada, a dupla é forçada a se unir a um grupo de guerreiros encarregados de levar uma garota, tida como bruxa e acusada de ser a causadora da disseminação da peste negra, para um distante monastério. E não demora muito até que estranhos acontecimentos transformem a viagem deles numa aventura “cheia” de fatos sobrenaturais.

Vendido como um filme que traria, além do evidente terror, muita ação (e o fato de Nic Cage estar nele já é outra garantia, vide sua filmografia), “Caça às Bruxas” está mais para um road movie obscuro do século XIV com quase nenhum atrativo. Tudo porque mais da metade do longa se passa durante a ida do grupo para o monastério do qual eles tanto falam e demoram bastante, bastante a chegar. E pelo caminho aparecem alguns lobos, uma ponte desafiadora, mais um povoado dizimado e… só. Por mais impressionante que possa parecer, não há mais nada além disso na caminhada deles, incluindo no pacote zero sequências dignamente sobrenaturais que justifiquem o gênero da obra.

Dirigido por Dominic Sena (“60 Segundos”), a produção é dona de um ritmo tão lento que pode fazer o espectador adormecer durante a projeção. Aos que resistirem, um “aleluia” é inevitável quando o grupo finalmente avista o monastério e a promessa de algo minimamente relevante capte a nossa atenção. Por mais que traga alguma ação, a péssima qualidade das cenas finais, porém, confirma que se está diante de uma bomba e a vontade é de voltar no tempo e recuperar os noventa minutos perdidos com algo que mais parece escrito por adolescentes. Mas não é.

O roteiro, na verdade, é de responsabilidade de Bragi F. Schut, em seu primeiro trabalho realizado para os cinemas. Mas falta de experiência nenhuma justifica a sucessão de erros do script. O maior deles, sem dúvidas, é a enorme pretensão da obra ao escolher um evento histórico de grandes proporções para incluir sua trama de suspense. Por isso, ainda temos de lidar com sequências de lutas medievais mal coreografadas no primeiro ato, enquanto rasos dilemas morais e alguma atmosfera obscura também são acrescentados. Hollywood, mais uma vez, reescreve a História da maneira mais comercial possível.

O roteirista é capaz ainda de criar uma trama completamente sem nexo, na qual não se entende a real necessidade de levar a garota para o julgamento no monastério, nem mesmo de quais poderes ela é dona, além do que faz dela uma bruxa. Em determinado momento no filme, um dos personagens coadjuvantes informa que seu povoado também foi devastado pela peste negra e que nenhuma bruxa teria surgido por lá, derrubando por terra todos os argumentos do padre responsável pelo aprisionamento da garota, e consequentemente, deixando às claras a completa falta de sentido de toda a história do longa.

Schutz falha também ao incluir uma sequência de abertura que jamais dialoga com o resto da projeção. E o que dizer da necessidade de, ao final de cada luta, introduzir uma frase de efeito digna dos mais clichês filmes de herói? Chega a ser bizarro ouvir Nicolas Cage bradar um “Agora sim ela está sedada!” ao esmurrar a garota-bruxa, depois de ela se desvencilhar do controle dos outros cavaleiros. Aliás, é bom que se ressalte que o enredo busca ainda construir o seu próprio nascente cavaleiro, dando a ele um destino nem tão assustador quanto inverossímil.

Com direção de arte digna de filmes de época feitos para TV, além de efeitos especiais que mais parecem amadores, “Caça às Bruxas” é mais uma bomba protagonizada por Nicolas Cage que aqui está, mais do que nunca, no piloto automático, vomitando suas falas sem se preocupar em acrescentar qualquer expressão a elas. Um filme que não cumpre nem mesmo o que o seu próprio título propõe (quem ousar assistir saberá do que está se falando) não pode satisfazer nem ao menos exigentes dos espectadores.  Já passou da hora de Cage tirar umas longas férias!

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Darlano Dídimo é crítico do CCR desde 2009. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é adorador da arte cinematográfica desde a infância, não a substituindo por nenhum outro entretenimento, por maior que ele possa ser.

Darlano Didimo
@rapadura

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