Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 08 de maio de 2010

A Hora do Pesadelo

Esta bomba é a prova em celulóide de que a atual onda de remakes de filmes de terror clássicos pode gerar um verdadeiro horror para os fãs do gênero.

Freddy Krueger é um daqueles vilões que todos adoram odiar. Um demoníaco sádico infanticida que se diverte simplesmente torturando almas jovens através dos seus sonhos, em ações que se refletiam no mundo real. Some-se isso ao seu visual grotesco, com queimaduras em todo o seu rosto, chapéu tosco e sua camisa rubro-negra, e com a interpretação peculiar de Robert Englund e temos o porquê desta criação de Wes Craven ser um dos mais carismáticos assassinos da história do cinema.

No entanto, 26 anos depois de sua estréia, Freddy tem o seu filme inaugural refeito em um longa produzido por Michael Bay. O resultado deste remake de “A Hora do Pesadelo” é assustador, e não no bom sentido. A história básica do filme-base a repetida, com um grupo de jovens sendo sistematicamente mortos em seus sonhos por Freddy Krueger. Morrendo nos sonhos, eles morrem no mundo real. As vítimas não são escolhidas aleatoriamente, tendo eles uma ligação misteriosa no passado.

Sabemos que os “adolescentes” (ou os atores com mais de 25 anos vivendo os colegiais) no filme são gado para serem abatidos de forma grotesca por Freddy. Acontece que, para a película funcionar, os personagens têm de dialogar com o público e o mundo onde a trama se passa tem de ter algum sentido, principalmente por se tratar de um ambiente urbano. Mas o roteiro de Wesley Strick e Eric Heisserer se apresenta basicamente como uma costura inexplicável de clichês, chavões, diálogos expositivos e personagens rasos.

O filme esquece-se de colocar qualquer sinal de inteligência ou carisma nas potenciais vítimas de Freddy ou mesmo de nos dar uma razão para que nos importemos com elas. Tomemos como exemplo Jesse, vivido por Thomas Dekker, que já nos é apresentado como um babaca, sendo definido desse modo até mesmo por um de seus amigos.

Após um acontecimento grotesco, Jesse sai gritando desesperado que é inocente de um assassinato, mesmo estando banhado no sangue da vítima, não chama a polícia, invade o quarto de outra personagem e, ao ser inevitavelmente preso, é levado direto para um presídio ao invés de ser conduzido à delegacia. A mocinha loira e siliconada Kris (Katie Cassidy) protagoniza alguns momentos embaraçosos em um enterro e em uma sala de aula que chegam a ser ridículos até mesmo para os parâmetros dessa fita. A lógica mandou lembranças para os moradores dessa cidade.

Nancy e Quentin, nosso casal principal, é vivido por Rooney Mara e Kyle Gallner, com ambos os personagens resolvendo brincar de Nancy Drew e Hardy Boy ao investigar as mortes de seus amigos. A investigação é levada de uma maneira tão absurda e forçada que, em dado momento, os dois parecem esquecer que existe a internet e resolvem fazer perguntas a alguém que eles sabem que irão mentir para só depois usarem um genérico do Google para encontrarem a informação que queriam.

No entanto, em uma produção dessas, ninguém liga para detalhes como lógica ou com os fale… opa, “adolescentes”. O rei do show aqui é Freddy Krueger. Ou deveria ser, já que o assassino aparece muito pouco no filme e sempre recoberto em sombras que mal revelam a sua figura.

Enquanto o Krueger de Englund era um monstro carismático, engraçado e sempre com modos criativos de eliminar suas presas, essa coisa vivida pelo talentoso Jackie Earle Haley é simplesmente entediante, solta duas piadas no filme todo e ainda por cima é mostrado como um pedófilo! Sim, pois os produtores e roteiristas do filme acharam que seria genial ligar Freddy ao personagem vivido por Haley em “Pecados Íntimos”.

A maquiagem tosca aplicada sobre o rosto de Haley impede que o ator consiga realizar qualquer expressão facial mais interessante e a fotografia nada imaginativa de Jeff Cutter faz questão de escondê-lo mais ainda. Considerando que Freddy quase não aparece durante o filme todo, é uma surpresa que sobre algo ainda a ser escondido.

Por falar em falta de imaginação, o diretor estreante Samuel Bayer, além de seu patente desrespeito aos clássicos do terror e à lógica, também não possui muitos raciocínios criativos. Com todo o aparato onírico a sua disposição, pouco vemos a capacidade de Freddy de manipular e aterrorizar suas vítimas, com os cenários para as cenas de morte sendo limitados a praticamente ao porão de uma escola e olhe lá!

Durante o clímax do filme até que se tenta apresentar algo diferente, como o bom efeito do chão virando piche, mas é pouca coisa e tarde demais e, bem como a noção interessante do cérebro funcionar por alguns minutos após a parada cardíaca, não passa de uma idéia decente desperdiçada em meio a um oceano de imbecilidades milimetricamente apropriadas para jovens de 14 anos.

Enquanto o primeiro “A Hora do Pesadelo” era um exercício anárquico de um verdadeiro e original mestre do terror, este remake não passa de uma bobagem covarde e sem-graça feita para arrancar dinheiro de adolescentes.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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