Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 25 de fevereiro de 2007

Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América

O filme menos engraçado de 2006. Pausa. Ou Não! Acredite, isso vai fazer sentido quando você assistir à "Borat - O Segundo Melhor Repórter do Glorioso Paí­s Cazaquistão Viaja à América". Completamente non-sense mas, ao mesmo tempo, trazendo uma crítica ferrenha ao politicamente correto americano, o filme vai agradar a muitos e provocar o ódio em alguns.

Faz muito tempo que eu não ria tanto no cinema. Não é segredo nenhum que 90% dos filmes que se passam por comédia hoje em dia falam apenas sobre sexo e gases corporais – e de uma maneira nada engraçada. Daí­ veio Borat, personagem criado no programa do comediante inglês Sacha Baron Cohen, "Da Ali G Show", e tudo mudou.

Em "Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso Paí­s Cazaquistão Viaja à América", temos um quase documentário (quase, já que algumas cenas foram claramente ensaiadas) que chegou ao Brasil carregado de falatório, tanto positivo, quanto negativo. Mas se trata de um filme absurdamente engraçado que esfrega algumas verdades na cara do tal "americano médio". Como não somos norte-americanos, a piada fica ainda melhor para nós.

Borat Sagdiyev (Sacha Baron Cohen) é um repórter de um atrasado (e caricatural) Cazaquistão que é incumbido pelo governo de seu país a ir aos Estados Unidos para aprender o que puder sobre os costumes dos gringos para retransmitir em um documentário a seu povo. Chegando em Nova York com seu (não tão) fiel produtor Azamat (Ken Davitian), ele se apaixona por Pamela Anderson (aquela de "S.O.S. Malibu") ao vê-la na TV. Aí­ começa a jornada de Borat e Azamat rumo a Califórnia e a "Paméla". No caminho, vemos o encontro dos dois com vários americanos (in)comuns. Escrito pelo próprio Cohen em parceria com Anthony Hines, Peter Baynham e Dan Mazer, o roteiro é realmente apenas um fiapo de linha narrativa que serve apenas para nos levar as mais absurdas situações.

O mais interessante sobre o personagem-título é a contradição nele. Borat é sexista, anti-semita, racista, homofóbico, mas há algo de inocente nele, que leva o espectador a relevar esse comportamento completamente fora dos padrões e até gostar do repórter vindo do Cazaquistão. O que torna o filme engraçado é a falta de limites (ou de sanidade) de Cohen em suas tiradas. A cena com o grupo de feministas torna fácil entender a enxurrada de processos contra o comediante. Algumas cenas exploram os esteriótipos americanos, como o vendedor de carros e os riquinhos de fraternidade. Já outras, como a briga no hotel, são puro non-sense, mas todas são incri­velmente hilárias. Preste muita atenção nas cenas com políticos republicanos e na seqüência no rodeio. É de fazer Michael Moore ficar com inveja! Algo que ajuda – e muito – ao filme é a excelente quí­mica entre Cohen e Davitian, com algumas cenas que vão ao limite do humor escatológico.

A direção de Larry Charles (egresso das também ótimas séries "Seinfeld" e "Segura a Onda") aproveita o talento de Cohen de levar tudo aos extremos tanto nas cenas improvisadas quanto nas ensaiadas. A edição, feita por três profissionais da área, teve de trabalhar com mais de 50 horas de material bruto até chegar ao corte final, conseguindo manter um bom ri­tmo por todo o filme (embora perca um pouco de pique na segunda metade do longa).

A motivação de Cohen foi mostrar quão preconceituosa e provinciana a mente do "americano médio" ainda é. As noções de anti-semitismo, homofobia e racismo ainda continuam lá, sendo expostas nas provocações feitas pelo comediante. A cena da igreja protestante mostra um radicalismo que nunca se esperaria num paí­s desenvolvido, quando um dos fiéis faz um discurso inflamado contra a teoria da evolução e a favor do criacionismo (nada contra quem acredita, mas defender sua fé daquele jeito…).

Um filme genial no que se propõe, que alcançou um sucesso inesperado, já que estadunidenses não costumam muito rir de si mesmos (vide os processos que Cohen responde pelo filme). Com uma continuação encomendada e mais alguns outros projetos paralelos a caminho, veremos muito do humor politicamente incorreto de Sacha Baron Cohen no futuro. Ainda bem!

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

Compartilhe

Saiba mais sobre