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OPINIÃO   terça-feira, 21 de maio de 2024

Furiosa: Uma Saga Mad Max (2024): a fúria gloriosa de George Miller

A prequel de George Miller para "Estrada da Fúria" expande consideravelmente o universo de "Mad Max", ainda que a Furiosa de Anya Taylor-Joy não tenha o mesmo carisma da versão anterior.

A história do universo de “Mad Max” é uma de decadência. Desde o primeiro filme, no final dos anos 1970, o australiano George Miller narra a derrocada do que sobrou do mundo, o desmanche da sociedade e os indivíduos recorrendo a atos de barbárie para sobreviver, tornando-se cada vez mais animalescos, e seus veículos, cada vez mais máquinas de destruição. Mas, no meio disso, ainda houve por um tempo um oásis de paz. É lá que a história de “Furiosa: Uma Saga Mad Max” se inicia, tomando um ritmo frenético que só para nos créditos.

O novo filme é uma prequel de “Mad Max: Estrada da Fúria“, clássico que mudou a forma de se fazer e pensar o cinema de ação em 2014. “Furiosa” acompanha a derrocada da personagem-título, que marcou o público no longa anterior mais do que o protagonista usual da franquia, o bruto e lacônico Max Rockatansky. Vivida então por Charlize Theron, Furiosa impressionou por sua determinação em resgatar as esposas de Immortan Joe, um raio de humanidade em meio à barbárie. Quem esperar a Furiosa de Theron vai se decepcionar, pois a versão de Anya Taylor-Joy está mais próxima de Max com seu jeito quieto, mas assertivo. Ainda assim, a nova atriz não deixa a desejar em nada no papel.

Quem começa o filme no papel de Furiosa, entretanto, não é Taylor-Joy, mas a jovem e talentosíssima Alyla Browne. A atriz mirim vive a personagem-título em sua infância e juventude, tudo com a mesma fúria de Theron, e que Taylor-Joy trabalha em uma versão ainda menos contida. A experiência que Furiosa demonstra na obra anterior é aprofundada em sua prequel, com todo o processo pelo qual ela precisou passar para se acostumar com a forma com que o deserto funciona. Um processo de desumanização, ainda que a protagonista tente de todo jeito manter-se conectada a suas raízes. É no retrato desta fúria que o trabalho da nova intérprete se destaca, ainda que não tenha o mesmo brilho e carisma de Charlize Theron no papel.

Porém, independente de quem esteja na pele da protagonista, o grande trunfo de “Furiosa” reside na ação. Como todo filme de “Mad Max“, a prequel tem sequências extensas quem valem mais que mil linhas de diálogo para o desenvolvimento da narrativa e de Furiosa enquanto personagem. O refino com que as sequências de ação foram concebidas é algo sem igual na indústria atualmente. Com uma câmera que facilmente se esgueira pelo espaço reduzido de carros e caminhões sem esquecer de focar nos personagens (eles os reais responsáveis pela ação), a sensação de imersão é ainda maior do que em “Estrada da Fúria“, o que é impressionante por si só.

A ação, aliás, é o fio condutor de uma narrativa com escopo muito maior do que o de qualquer “Mad Max” até agora. O mundo é essencialmente o mesmo do visto anteriormente, mas expandido e aprofundado de forma realista. Lugares apenas mencionados, como a Vila Gasolina e a Fazenda de Balas, agora são chave para a história, principalmente com a chegada de Dementus (Chris Hemsworth) e sua gigantesca gangue de motoqueiros para aterrorizar os demais senhores da guerra. O retrato de Hemsworth é perfeito nesse sentido, já que Dementus provavelmente é o personagem mais falante de toda franquia, um ser desprezível e extremamente irritante – ou seja, perfeito para o universo “Mad Max”. Ver o ator podendo finalmente trabalhar um personagem é refrescante, e evidencia um talento que não tinha como transparecer em enlatados de super-heróis ou em filmes de ação algorítmica em streaming.

O conflito entre Hemsworth e Taylor-Joy é a tônica de “Furiosa”, de uma forma pessoal e intensa como ainda não havia em “Mad Max”. Apesar do carisma que ela demonstra em “Estrada da Fúria“, sua história é de decadência e perda, e a prequel deixa isso muito claro. No entanto, apesar de expandir o universo da franquia, o filme ainda se ampara demais em seu predecessor, o que por vezes o deixa um pouco repetitivo. Para quem só quer a boa e velha ação que apenas George Miller é capaz de entregar atualmente, então “Furiosa” é mais de um excelente mesmo.

Julio Bardini
@juliob09

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