Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 10 de março de 2021

A Viúva das Sombras (2020): à sombra de “Bruxa de Blair”

Desprovido de originalidade, o longa de terror busca sem êxito replicar uma fórmula de sucesso apostando em uma trama presumível e repleta de personagens rasos.

Em 1999, as plateias do mundo todo teorizavam a respeito da veracidade dos acontecimentos perturbadores apresentados no falso documentário “A Bruxa de Blair“, o consagrando de vez como um enorme fenômeno cultural. Previsivelmente, tamanho sucesso gerou uma leva de filmes do gênero found footage, isto é, obras fictícias cuja estética e narrativa emulam filmagens de fatos reais. Devido ao baixo custo dessas produções e ao genuíno interesse do público, tal tendência se manteve em alta até os dias atuais, culminando assim, no terror russo “A Viúva das Sombras”. Apesar de não ser um autêntico expoente do gênero, flerta bastante com o estilo, além de reproduzir diversos elementos do clássico que o popularizou.

Supostamente baseada em fatos, a trama acompanha uma equipe de resgate que adentra uma densa e sinistra floresta à procura de um adolescente desaparecido. Nesse mesmo local, inúmeras vítimas desapareceram nas últimas três décadas, e apenas alguns corpos foram encontrados, todos nus. Ao anoitecer, a comunicação com o mundo externo é misteriosamente cortada. Sem sucesso na procura pelo jovem, o grupo passa a testemunhar estranhos fenômenos sobrenaturais que os leva a acreditar numa lenda local sobre o fantasma de uma viúva que foi linchada pelos habitantes da região após ser acusada de assassinar o marido. Desde então, o espírito passaria a assombrar a floresta a fim de saciar sua eterna sede de vingança.

Dirigido pelo estreante Ivan Minin, o filme até possui um início promissor, cujo ritmo paulatino é capaz de gerar tensão e rapidamente despertar o interesse do público. Também há um bom uso intradiegético da câmera usada pela personagem jornalista Kristina (Anastasiya Gribova), que acompanha os paramédicos. Assim, é criada uma alternância fluida de perspectiva que poderia ser mais bem explorada. No entanto, à medida que a trama avança, a boa impressão inicial vai dando lugar ao tédio, devido a uma sucessão de clichês e momentos estapafúrdios presentes ali apenas para tapar os furos do roteiro, e conduzir a história rumo ao seu desfecho decepcionante.

Apesar das performances convincentes de parte do elenco, a falta de um maior desenvolvimento dos personagens acaba contribuindo significativamente para a perda de interesse do espectador. Afinal, para que uma morte seja impactante é preciso antes ter estabelecido algum vínculo com a vítima. Caso contrário, tal evento não passará de um mero artifício sem nenhuma importância. Outro defeito do enredo é jamais se aprofundar na mitologia que visa explorar, tratando de maneira superficial algo que possivelmente ajudaria a narrativa a sair do lugar-comum que se encontra.

Muito aquém de seu potencial, “A Viúva das Sombras” desperdiça uma atmosfera de terror e suspense bem construída ao não ser capaz de se aprofundar na lenda do folclore russo que dá título à obra. Ao invés disso, prefere simular a fórmula de outro filme de sucesso e alterar apenas alguns detalhes, porém mantém praticamente toda sua estrutura e premissa. Além disso, apresenta personagens mal desenvolvidos, cuja única função é serem descartados um a um no decorrer da trama. Como se tudo isso não bastasse, o longa-metragem ainda entrega um final clichê que reforça a experiência negativa, alimentando ainda mais comparações.

Alan Fernandes
@alanfdes

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