Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 12 de abril de 2020

#RapaduraRecomenda – Mortal Kombat (1995): nostalgia wins

Abraçando o tom caricato, filme consegue mostrar respeito pelo jogo no qual é baseado. Mesmo com roteiro simplório e preguiçoso, o bom visual e a boa escalação de atores resulta numa obra divertida que é fruto de seu tempo.

Em 1993, Hollywood produzia “Super Mario Bros.”, a primeira adaptação em live-action de um vídeo game feita pelo mercado americano. A má qualidade deste filme se manteve no ano seguinte, com a estreia de “Double Dragon” e “Street Fighter – A Última Batalha”. Um ano mais tarde, chegava aos cinemas “Mortal Kombat”, baseado no jogo de mesmo nome e que, se está longe de ser uma boa obra da sétima arte, ainda consegue ter algum tipo de respeito pelo material original e entreter o suficiente.

A história gira em torno de três combatentes humanos: Sonya Blade (Bridgette Wilson-Sampras), Johnny Cage (Linden Ashby) e Liu Kang (Robin Shou). O trio é convocado pelo deus do trovão Rayden (Christopher Lambert) para disputar o “Mortal Kombat”, torneio para disputar o controle da Terra. Segundo uma regra, se as forças de Shao Kahn, lideradas por Shang Tsung (Cary-Hiroyuki Tagawa), vencerem o que seria seu décimo torneio em sequência, terão direito a invadir e conquistar o mundo. Indagações sobre quem regulamenta o torneio são sumariamente ignoradas e fica para a imaginação dos espectadores especularem sobre quem seria a entidade mais poderosa que rege sobre todos os presentes no filme.

É uma premissa simples, de o Bem contra o Mal, mas quando se leva em consideração o que existia de storytelling nos jogos de luta do início da década de 90, funciona. É bem linear e direto ao ponto, o que seria uma ótima oportunidade para apresentar camadas e personalidade aos protagonistas, mas o filme nunca os leva aonde poderia, ilustrando um roteiro raso, ultrapassado e até preguiçoso, que se salva na boa escalação do elenco.

Elenco que entendeu a proposta da obra de não se levar a sério demais. Principalmente em Ashby, como a estrela de artes marciais de Hollywood Johnny Cage, que consegue entregar a mescla necessária de canastrice e humor honestos. Wilson-Sampras começa a trama numa jornada pessoal de vingança em busca do criminoso Kano (Trevor Goddard – o mais carismático em tela), mas assim que sua luta acaba, é reduzida a uma donzela em perigo. Shou se provou um ótimo Liu Kang, com leveza na sua missão que envolve honra e justiça.

O trio é competente nas cenas de luta, com alguns dispensando dublês e tendo sua dose de lesões. Quando lutam contra inimigos clássicos como Scorpion (Chris Casamassa) e Sub-Zero (François Petit), não só rendem bons momentos de kung fu como o bom uso de figurinos atinge o coração dos fãs mais nostálgicos. Para os golpes especiais, o CGI hora funciona bem, hora é patético – como na forma de lagarto de Reptile (Keith Cooke).

Entretanto, o grande feito visual do longa é o animatrônico de Goro.  Fonte de grandes dificuldades e problemas, tendo sido necessário até dezesseis artistas para operá-lo e dando constantes defeitos, ele não pôde ser transportado até a Tailândia, onde várias cenas foram filmadas fazendo bom uso das paisagens locais. Porém, é notável como o personagem representa o que efeitos práticos conseguem fazer por um filme. Sua presença física o torna real e palpável, resultando interações críveis com pessoas e fornecendo um efeito especial que não fica datado.

Dirigido por Paul Anderson W. S. Anderson, responsável pela franquia “Resident Evil” nos cinemas, o longa consegue achar bom equilíbrio entre a canastrice absurda da sua própria premissa com boas coreografias de lutas e respeito pela iconografia do jogo. Ciente de sua proposta em abraçar o brega, o filme chega a ter a voz de Shao Kahn anunciando um lutador do mais absoluto nada e personagens declamando as famosas frases “flawless victory” e “finish him”, em momentos que não parecem nada naturais, mas que divertem pela forma com o que o filme mostra carinho pela franquia.

Muito disso vem de Tagawa, intenso e divertidamente cafona em sua interpretação do antagonista. Tal equilíbrio também aparece em Lambert, que foca mais no lado comido do tom da obra. Quanto a outros personagens clássicos dos jogos, temos uma ponta de Jax (Gregory McKinney) e uma participação esquecível de Kitana (Talisa Soto).

Um inesperado sucesso do filme veio na forma de sua trilha sonora, que acabou sendo o primeiro álbum de música eletrônica a receber o disco de platina da história. Várias músicas, incluindo a música tema que faz uso de vozes dos jogos e nomes dos personagens, foram um estouro, tocando em boates ao redor do mundo.

Precedido por três adaptações de jogos de vídeo game catastróficas, o longa pode não ser da mais alta qualidade, mas certamente garante seu lugar como uma obra que procurou respeitar o material original. Com um roteiro que soube abraçar sua proposta canastra, atores bem escalados, boas cenas de luta e uma descida de escada memorável de Sub-Zero, “Mortal Kombat” é uma tentativa sincera de homenagem que entrega bom entretenimento.

Bruno Passos
@passosnerds

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