Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 17 de abril de 2019

Na Escuridão (2018): e não trouxe luz alguma

O longa protagonizado por Natalie Dormer apresenta trama promissora, mas se perde em seus conceitos e roteiro.

Existem filmes que vamos assistir às cegas, sem expectativa alguma. Isso pode ser bom, pois aumenta as chances do longa ser satisfatório. No entanto, como a sinopse da obra já é o suficiente para se esperar algo, o que pensar de uma pianista cega envolvida num crime? Poderia ser bem mais interessante e bem aproveitado do que foi em “Na Escuridão”.

O longa acompanha a rotina bem organizada e marcada de Sofia (Natalie Dormer, da série “Game of Thrones”), uma pianista acostumada com sua cegueira que é retirada da sua zona de conforto ao escutar, no apartamento acima do seu, uma briga que levou à morte de sua vizinha. O filme vai bem até aqui, mas a trama acaba crescendo mais do que o longa pede, e se perde até dentro de seu gênero.

Justiça seja feita, a história se preocupa com o fato da protagonista ser cega. Além de ser bem interessante acompanhar toda a investigação sabendo dessa peculiaridade, todo o cenário se envolve na cena, e a câmera acompanha tudo junto da personagem. Cada detalhe da casa é milimetricamente organizado por motivos óbvios, e o longa foca em como Sofia “vê” o mundo, ao menos no primeiro ato, precisando usar a boa audição. E isso muito tem relação com a música, algo que simplesmente é esquecido ao longo do filme.

O que parece ter sido deixado para trás também foram os personagens ao redor de Sofia. Com desenvolvimentos pífios, alguns acabam necessitando de cenas bastante expositivas. Um filme que parecia fazer o que melhor faz o cinema, mostrar mais do que falar, acaba fazendo o contrário. E se não há um desenvolvimento satisfatório entre os personagens, a boa atuação de Natalie Dormer é prejudicada pelo roteiro (que a própria escreveu). Sofia se envolve tanto na trama que chega a deixar o espectador um tanto quanto confuso, e encerra com um plot twist que, apesar de representar alguma surpresa, não acrescenta tanto, principalmente em sentido.

E confuso também se torna o gênero do filme. Algo que poderia, e digamos até que promete, ser um bom suspense, acaba se perdendo entre a ação e guerra, e chega a forçação de barra de um romance completamente desnecessário e sem sentido algum na história. Por outro lado, o longa é cheio de simbolismo, o que de certo modo enriquece. O fato de Sofia ser cega abre bastante espaço para isso, além de trazer a reflexão sobre viver na escuridão (como diz o óbvio título) e quem enxerga de fato quem são as pessoas. O reflexo também é algo muito utilizado na obra, que inclusive trabalha muito sobre o dualismo das pessoas.

“Na Escuridão” é uma obra atraente pelo talento de Natalie, mas que não consegue se encontrar e nem decidir o que quer trazer para o público. Nem mesmo a cega expectativa foi capaz de tirar algo bom daqui, e manteve o filme nas trevas.

João Victor Barros
@jotaerrebarros

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