Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 06 de agosto de 2009

Retorno de um Herói, O

O diretor Ross Katz amplificou a voz do Tenente-Coronel Michael Strobl e propagou esta emocionante história real de um jovem soldado americano que perdeu a vida no Iraque.

O jovem Chance Phelps poderia ter seguido por diversos caminhos em sua vida, mas após os atentados de 11/09 apenas uma coisa parecia certa para ele: Se alistar no exército americano. O filme “O Retorno de um Herói” apresenta o trajeto de volta para casa do corpo de Phelps, que morreu em combate. Ele foi conduzido pelo Tenente-Coronel Michael Strobl que, seguindo o procedimento padrão do exército, anotou detalhes da viagem para elaborar o relatório de serviço, mas tudo se tornou tão pessoal para o militar, que desta viagem nasceu o texto que no final se transformaria no filme em questão.

Com um enredo aparentemente simples, a obra tenta não escolher lados diante a guerra do Iraque e suas motivações, mas sutilmente demonstra certa oposição à ocupação do país. Ao invés de fazer uma obra política, tanto Strobl como o diretor Ross Katz (roteirista e co-roteirista) escolheram narrar de forma contemplativa todo o ritual por trás do sepultamento de um soldado americano. O filme fala da dor, da honra e principalmente do respeito para com os mortos, ainda mais daqueles que se foram cedo e para defender seu povo. De forma serena, a obra demonstra o real patriotismo americano, sua maior qualidade e também sua maior sina, tendo em vista o país descarrilado que todos esses jovens tentaram ajudar a controlar.

Kevin Bacon dá vida a Strobl. Com poucas palavras, o ator faz transparecer toda a emoção e surpresa de um militar que se vê rodeado de solidariedade e compreensão por todo o trajeto que tem de trilhar para entregar este soldado falecido para seus familiares. No longa, Strobl ocupa um cargo burocrático após ter servido no Golfo e se sente incomodado ao ver tanta coisa acontecendo naquele momento, tantos jovens carregando seus amigos mortos e ele não pode ajudar, e por ter mulher e filhos tudo acaba sendo uma conveniência de difícil aceitação para o soldado que um dia jurou ser “sempre fiel”. É por essa inquietação que ele precisa ir um pouco além de sua mesa e seus dados. Ele vai como voluntário nessa missão de levar um desses soldados mortos para casa.

O diretor Katz, que fez a produção de filmes como “Encontros e Desencontros” e “Maria Antonieta” (ambos da diretora Sofia Coppola), acertou neste seu primeiro filme no andamento tranquilo e muito bem administrado, que foi complementado pela trilha sonora de Marcelo Zarvos, que se mostra muito eficiente, pois em um filme conscientemente carregado de sentimento, a trilha sonora é parte essencial desta funcionalidade como obra. O diretor apresentou e exaltou apenas pessoas normais, nada de egos atormentados pela guerra, revoltados e ensandecidos pelos horrores vividos.

Seguindo a linha de um “road movie”, o personagem de Bacon se depara com diversas ocasiões inusitadas e que serviram para construir este testemunho de cumplicidade de uma sociedade aparentemente fragilizada pela guerra. São os funcionários de um aeroporto que respeitam a continência perante o corpo em uma caixa que é embarcada no avião, a solidariedade de uma aeromoça que entrega um crucifixo ao militar, ou o vigia que entende a dedicação do soldado que dorme ao lado do corpo em um galpão a caminho de seu destino final. O filme fala do americano médio, potencialmente bom, que enxerga no uniforme do soldado a vida de seu filho, seu amigo, seu marido, mulher ou sobrinho e com gestos simples, como uma continência seguida de um olhar, realmente emociona.

"O Retorno de um Herói" apresenta, de forma surreal, pode-se dizer, um respeito quase estranho, e infelizmente pouco comum. O filme não tenta lhe arrancar lágrimas em demasia ou te posicionar a favor ou contra a guerra, ele simplesmente conta a história de um jovem que era muito querido por seus amigos e familiares e que morreu em uma emboscada no Iraque ajudando a salvar seus companheiros. Chance, claramente é apenas um entre as mais de 3,500 mortes de soldados nesta guerra, e focar tanta atenção nele pode parecer uma injustiça para com os outros, e realmente é uma injustiça, pois não há celebrações, filmes e documentários o bastante que justifiquem a morte desses soldados ou de qualquer outra pessoa morta em uma guerra.

O que aconteceu ali foi que o Tenente-Coronel Michael Strobl teve a chance e o talento de contar uma história e através dela mostrar um cenário onde muitos desses jovens voltarão mortos para casa. De forma bastante explicativa, ele aborda todos os elementos obrigatórios envolvidos neste momento tão delicado e triste. Elementos estes que podem parecer exagerados, mas que na verdade ressaltam o valor da vida humana, pois o modo como lidamos com nossos mortos exemplifica em muito nossa personalidade.

O DVD, que chegou despercebido no Brasil, traz ainda extras interessantíssimos, que complementam em muito o conteúdo do filme. Os documentários sobre a vida do jovem de vinte anos que perdeu a vida em combate aparentemente serviram como um rico material para o roteiro, pois ali encontramos diversas falas e cenas do filme, todas descritas por pessoas reais, que são os pais, amigos e o próprio Strobl, idealizador por acidente, podemos dizer, desta história no mínimo relevante.

Ronaldo D`Arcadia
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