Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 09 de agosto de 2008

Grande Dave, O

Depois do fracasso de “Norbit”, Eddie Murphy retorna às telas de cinema em mais um pastelão. Dessa vez, com uma história teoricamente politizada e deixando de lado as tradicionais e desnecessárias piadas escatológicas, ele tenta se redimir com mensagens de amor, tolerância e paz.

A trama não é grande coisa. Um grupo de minúsculos alienígenas chega ao planeta Terra com o objetivo de buscar algo já esgotado em seu próprio planeta: combustível. Para realizarem a missão, eles precisarão correr atrás de uma bola de beisebol, que foi parar por acaso na casa de uma típica família de Nova York. Essa bola precisa ser jogada ao mar a fim de solucionar os problemas dos pequenos extraterrestres, mas essa ação provocará a drenagem das águas, acabando de vez com a Terra. Como a nave escolhida para executar a missão é, nada menos, feita à imagem e semelhança de seu capitão (ampliada várias vezes), caberá a ele estabelecer contato com os humanos, estudá-los e aprender suas crenças e costumes. Mas aí começa o problema: Dave, que aprende a amar os humanos, começa a se questionar se os terráqueos realmente merecem ser extintos.

As idéias questionadas no roteiro são até interessantes, e porque não dizer, atuais. Trata de questões ambientais, onde os seres de um determinado planeta esgotaram seu recurso natural; e colocam em xeque outras questões importantes: travar conhecimentos, aprender a amar e aceitar aqueles que são diferentes. Os estreantes no cinema Rod Greenberg (do seriado “Frasier”) e Bill Corbett conseguem amarrar uma história perpetuada de discussões sobre o mundo atual, mas que também traz a comédia exagerada à la Murphy. Conseguir unir essas duas vertentes sem cair na ironia já é um ganho, especialmente quando se deixam de lado as piadas com gosto duvidoso.

Mas como nem tudo são flores, os roteiristas caem na besteira de transformar em grandes e inusitadas algumas situações que, só de saber a história, já se pode induzir. É o caso das tentativas de entendimento entre pessoas que vivem em realidades diferentes e a adaptação de alguém que tem a oportunidade de conhecer um mundo de coisas as quais não estava acostumado. Se você faz uso de situações óbvias, é importante que, pelo menos, sejam mostradas de maneira a fazer alguma diferença. Não que os clichês sejam inimigos, mas passar por eles de maneira superficial gerando um erro básico: cansa o espectador, que sabe exatamente o que o espera.

Já quando se trata da direção, o trabalho volta a ganhar um plus. Brian Robbins, também interessado em desfazer a péssima imagem que ganhou seu trabalho após o medonho (e já citado) “Norbit”, capricha nas referências e dá ao longa a cara de inocência que quase encanta. Talvez por tratar de temas básicos, porém fundamentais, ele tenha tido maior dificuldade em expressá-los em tela. Não obstante, o cineasta acerta ao traçar como principais referências os clássicos da década de cinqüenta, que tratam de maneira sutil questões como essa.

Porém, tudo isso é transformado sutilmente em um bom plano de fundo, já que o filme, em si, é Eddie Murphy. Desde que lançou o sucesso de bilheteria “O Professor Aloprado”, o ator adquiriu o “vício” de interpretar mais de um personagem – que é justamente o enfoque neste longa-metragem, já que ele interpreta o pequeno comandante da nave e a própria nave. E nesse ínterim, caem por terra todos os outros atores (e não à toa, são todos desconhecidos do público), já que eles são largados a mera ilustração na demonstração do que Murphy é capaz de fazer, trazendo à tona todos os trejeitos e maneirismos faciais que o tornaram famoso.

Se em “Norbit”, o ator caiu na besteira de tratar de maneira vulgar de alguns cotidianos americanos, aqui ele cai nas graças principalmente das crianças, trazendo à tona lições que são especialmente absorvidas por elas. E apesar de ter um quê de película feita para agradar os menores, ela também pode ser apreciada por adultos, que identificam referências feitas a filmes de uma outra geração, como a década de setenta, que inclusive impera na trilha sonora.

No fundo, bem lá no fundo mesmo, “O Grande Dave” é um bom filme. Não sei se pela qualidade em si (um pouco conturbada), ou se porque ultimamente tem aparecido nos cinemas comédias tão toscas e de piadas tão chulas. Talvez em um meio como esse, se destaca aquele que pelo menos tenta investir em algo que mande algumas lições de moral.

Beatriz Diogo
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