Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 25 de novembro de 2007

Assassinato de Jesse James, O

Jesse James é um herói descrito como o Robin Hood do velho oeste. Diferente de muitos contos sobre o personagem, "O Assassinato de Jesse James" é praticamente uma obra literária sobre sua morte e, principalmente, sobre seu assassino, Robert Ford.

Quando abrimos um livro, o primeiro parágrafo do primeiro capítulo é decisivo. É com as primeiras palavras que somos conquistados e levados a descobrir o que as páginas seguintes guardam. Algo parecido acontece com “O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford”. É com uma suave narração e uma imagem embaçada de Brad Pitt que somos apresentados à história de Jesse Woodson James.

James é um famoso fora-da-lei que, devido a sua grande fama, se tornou mais do que um vilão do velho oeste americano. Sua história é lembrada mesmo mais de um século após sua morte, enquanto Robert Ford, seu assassino, esquecido.

O primeiro parágrafo dessa história revela James como um homem de família, amoroso com seus filhos, cuidadoso com sua vida dupla e duvidoso quanto às suas intenções e ações. É durante o último dos assaltos a trens realizados pela gangue dos irmãos Jesse e Frank James que Robert Ford surge, justificando sua coragem e pedindo uma maior participação na gangue.

Bob Ford é o agente da ação. É ele o personagem central do filme dirigido por Andrew Dominik. Acompanhamos a sua evolução mais do que a construção da desconfiança absurda de James em seus comparsas.

Casey Affleck constrói uma figura visivelmente covarde, ainda incerta sobre sua própria natureza e insegura quando está ao lado de seu ídolo, Jesse James. O sorriso tímido de Affleck explica perfeitamente como é Robert Ford, um homem que almeja ser como seu líder, mas sem muita audácia para seguir seus passos.

“O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford” é, como seu título, extremamente longo. Os 160 minutos de projeção se arrastam em uma trama da qual já conhecemos o fim e que possui pouquíssimas reviravoltas. O tom literário do longa-metragem ajuda a amenizar o cansaço decorrente de diálogos monossilábicos e sutilezas nos olhares, mas fica difícil se envolver em uma história sobre a qual nós, brasileiros, conhecemos tão pouco. Alguns nomes permanecem anônimos, alguns casos não ditos e o passado tanto de James quanto de Ford uma sombra do que assistimos.

Brad Pitt, como Jesse James, é Brad Pitt. Um ícone interpretando outro ícone. Realizar um papel recheado de conceitos e ideais pré-formados não é desafio para qualquer ator, mas alguém com a fama de Pitt parece ser uma escolha equivocada. Claro, não há dúvidas sobre o talento do astro, mas é sua vida pessoal, sua longa lista de trabalhos no cinema e a beleza característica que fazem com que Jesse James se perca em Brad Pitt e não o contrário.

O assassinato de Jesse James é um conto de mensagens não ditas, ações reprimidas, uma covardice generalizada. Tanto James quanto os irmãos Robert e Charley Ford pisam em ovos em uma relação de constante desconfiança. O que movimenta o filme é o medo, não apenas do “covarde Robert Ford”, como ficou conhecido até o seu próprio assassinato. Jesse James é um grande covarde que, por desconfiança da sua gangue, elimina um por um dos que agiram em alguns dos muitos assaltos que realizou.

Andrew Dominik acertou ao enfatizar Ford. Seu filme não é sobre as aventuras, narradas sempre com heroísmo de um jovem Robin Hood de Jesse James. Não é sobre as razões que o levaram a um papel de destaque na história. É sobre o medo que sentiu em seus últimos anos de vida e como esse medo fez com que se tornasse instável o bastante para ser assassinado por seu maior admirador. O herói é, de fato, Robert Ford e Casey Affleck o astro escondido por trás de um adjetivo.

Lais Cattassini
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