Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 17 de novembro de 2007

Loja Mágica de Brinquedos, A

Escrito e dirigido por Zach Helm, “A Loja Mágica de Brinquedos” traz uma trama literalmente encantadora, que quase abafa os talentosos Dustin Hoffman e Natalie Portman. Dialogando com crianças e adultos, o filme marca a estréia de Helm como diretor.

O Sr. Magorium (Dustin Hoffman, de “A Primeira Noite de Um Homem”) tem 243 anos de idade e é dono da loja de brinquedos mais fantástica do mundo. Há anos ele vem construindo os brinquedos mais criativos, permeando de magia a vida de várias crianças que freqüentam seu empório como se fosse a sua própria casa. Quando este simpático senhor decide que é sua hora de partir, como ele mesmo diz, percebe que a única que pode dar continuidade ao seu trabalho é a encantadora Molly Mahoney (Natalie Portman, de “Em Qualquer Outro Lugar”). Só que Mahoney não se sente pronta para o trabalho. Apesar de acreditar na magia que envolve o lugar, ela credita todo esse poder ao Sr. Magorium, achando ser impossível para ela tomar conta de tudo aquilo. Entre a dupla, aparecem dois personagens que completam a trama: Henry Weston, o contador contratado para fazer os dados da loja; e o pequeno Eric Applebaum, uma criança com dificuldade em fazer amizades.

Apesar de dialogar especialmente com crianças, o filme proporciona interesse no público adulto por trazer citações de produções antigas, fazendo com que o clima de fábula e encantamento circule pela sala de cinema, bem no estilo Frank Capra de trabalhar. Com claras referências às produções das décadas de cinqüenta e sessenta, a começar pelo figurino, a película brinca com as sensações que só víamos nos filmes mais antigos. A direção estreante de Zach Helm, que vinha trilhando uma carreira respeitada como roteirista, acerta ao conseguir transmitir mensagens para adultos e crianças: a fantasia não é perdida, e o espectador sai da sala certamente tocado pela sensibilidade que envolve o longa.

Helm, que assinou o roteiro do elogiado “Mais Estranho Que a Ficção”, é responsável também pelo roteiro deste longa-metragem. Falando de maneira acessível às crianças, sem tornar o filme de todo infantil, ele aborda a dificuldade que todos as pessoas têm em aceitar a morte. Em um dos momentos mais belos da película, ele cita Shakespeare de uma maneira terna que reflete exatamente o clima que preenche toda a produção. Sem falar nos momentos em que discute a capacidade (ou a falta dela) dos adultos em acreditar, em simplesmente ter fé em algo que não precisa ter lógica de todo. Apontando para o fato de que, ao encarar a realidade diária, os problemas, os medos, enfim, as responsabilidades que assumimos ao longos dos anos, nós acabamos perdendo incríveis oportunidades pelo simples medo de viver, não enxergando de verdade as coisas boas que estão por aí.

Portman interpreta uma moça insegura, que tem medo de ter parado no tempo e no espaço. Quando pequena, tinha talento como pianista. Hoje em dia, frustra-se por querer prender-se a um momento que já passou, deixando de lado as coisas que poderia estar vivendo agora. De encontro a ela, vem o contador Henry Weston, que costuma preencher suas frases com "só": "sou só um contador"; "esta é só uma loja"; "eu só faço meu trabalho". Ele é o típico adulto que já está inteiramente fechado em seu mundo.

Essa discussão é levada ainda adiante de uma maneira interessante, que faz possível a interação mais direta com o público. Os personagens, assim como os espectadores adultos, enfrentam o problema de não conseguir acreditar em todas essas coisas que fogem à nossa lógica. E mais complicado ainda: eles parecem não acreditar em si mesmos, o que é ainda mais grave. Parece que sonhar nos dias de hoje está cada vez mais difícil – porém não impossível.

Beatriz Diogo
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