Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 11 de novembro de 2007

Leões e Cordeiros

Focado principalmente em seu roteiro, "Leões e Cordeiros" acerta em não querer forçar soluções ou apontar maneiras fechadas de enxergar uma situação – no caso, a tão falada guerra contra o terrorismo, travada no eixo Afeganistão-Iraque. Abrindo portas para reflexões, o filme traça sua trama em cima de três lados de uma mesma história.

Jasper Irving (Tom Cruise, de "Minority Report") é um senador ambicioso que um dia deseja chegar à presidência. Para tanto, chama para uma conversa de uma hora a jornalista veterana Janine Roth (Meryl Streep, de "Entre Dois Amores"), para quem pretende vender seu novo trunfo: uma estratégia de guerra que promete levar os Estados Unidos à vitória "contra o terrorismo". O professor Stephen Malley (Robert Redford, de "Proposta Indecente") tenta dissuadir Todd (Andrew Garfield), um aluno brilhante que perdeu a fé nos ideais que antes o motivaram. Enquanto isso, dois jovens, colegas de Todd, arriscam-se nas montanhas do Afeganistão, onde lutam pela fé de que cada um pode fazer a sua parte, mesmo que aquilo não faça sentido para muita gente.

Com roteiro situado entre essas três situações, Matthew Carnahan conseguiu segurar várias discussões que desembocam no mesmo tempo: de que maneira exatamente formamos a nossa consciência crítica? Desmembrando personagens caricaturados, ele promove uma discussão que a princípio soa extremamente vazia. Porém, ao se debruçar um pouco mais naquela história, e deixar as desconfianças de lado, aos poucos percebemos que ele não tem nenhuma intenção além de simplesmente questionar. A repórter que aprendeu a encarar cinicamente afirmações e questiona tudo e todos, se vê em uma crise de consciência quando é colocada em xeque: se o governo empurra no povo uma versão errada dos fatos, qual é exatamente o papel da mídia nisso?, levando em consideração que eles promovem tais notícias para vender melhor? O senador, que afirma que o governo errou por colocar em poder de decisão homens que nunca enfrentaram uma batalha, assume que mesmo tendo um plano revolucionário de vitória, nunca foi a uma guerra de fato. E o professor que encoraja tanto o idealismo de um jovem, está na verdade sentado em uma cadeira, vendo o mundo virar de cabeça para baixo, sem no entanto aplicar nenhuma tese das quais tanto ensina.

O último trabalho de Robert Redford como diretor havia sido há sete anos atrás, em "Lendas da Vida". Recebido sem muita empolgação pela crítica, o longa-metragem foi taxado por ser leve e neutro demais. Exatamente o que acontece com "Leões e Cordeiros" agora, só que dessa vez com consideráveis diferenças: em meio a filmes hollywoodianos que insistem em querer empurrar em seus espectadores uma única maneira de ver as coisas, este faz o contrário, apoiando-se em questionamentos que levam à reflexão. Acusado de não tomar nenhum partido, o longa realmente não se propõe a encontrar soluções: ele tenta achar alguma maneira de proporcionar ferramentas e dados sob vários aspectos da história, para que cada um pense por si próprio. Indagações como: Até onde vai o nosso cinismo nos dias de hoje? E até mesmo, será que somos de fato cínicos? O próprio título do filme já é, em si, uma grande pergunta.

Existem diversas maneiras de se assistir a um filme: podemos observá-lo com maior preocupação em sua técnica, vê-lo como entretenimento ou documentação de algo e até mesmo como uma junção de duas ou mais formas. O importante realmente é conseguir perceber o que há para ser apreciado nele. Se "Leões e Cordeiros" é falho em termos técnicos e não traz uma preocupação estética mais presente, ele prima pela qualidade de sua história, que é, na minha opinião, o mais importante a ser constatado neste trabalho.

Beatriz Diogo
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