Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 11 de novembro de 2006

Volver

Com "Volver", Pedro Almodóvar prova que ainda está em plena forma e que, cada vez mais, pode surpreender.

Poucos cineastas tiveram ou têm um estilo tão único quanto o de Almodóvar e conseguem mantê-lo com tanta qualidade como o cineasta espanhol. Desde sua estréia na função de diretor e roteirista, ele tem se mantido, cada vez mais, como um dos mais influentes e marcantes nomes do cinema contemporâneo e seu modo único de conduzir suas películas viraram referência no meio. Como toda obra extensa, no entanto, alguns aspectos passam por modificações através do tempo. Muitos dizem que algumas das mais recentes produções de Almodóvar perderam a essência tão presente em seus filmes mais antigos como o já clássico "Mulheres a Bordo de um Ataque de Nervos" e que teriam ficado mais "leves" em relação à abordagem dos sempre polêmicos temas recorrentes na obra do diretor. Com "Volver", o diretor busca resgatar o seu mais autêntico estilo e o resultado é um dos melhores exemplares "almodovarianos" dos últimos tempos.

Já pela sinopse do filme podemos sentir a aura do diretor. O fantasma de uma mãe parece retornar do além para resolver aspectos inacabados de seu relacionamento com Raimunda, uma de suas filhas. Enquanto isso, uma série de eventos paralelos desencadeia a revelação de vários segredos relacionados à família dessas mulheres. Como sempre, personagens femininos fazem-se as figuras principais dos filmes almodovarianos (salvo alguma exceções como "Fale com Ela" e o suposto auto-biográfico "Má Educação") e, dentro desse universo, o diretor se mostra cada vez mais à vontade.

O primeiro ponto forte de "Volver", partindo-se do roteiro, no mínimo promissor, se traduz, logo de cara, no elenco. Depois de anos sem trabalhar juntos, Almodóvar retoma a parceria com Carmem Maura – estrela de "Mulheres a Bordo de um Ataque de Nervos" -, que, na pele de Irene, a "mãe fantasma", dá realmente um show. Penélope Cruz, que nunca havia se mostrado propriamente extraordinária em cena, parece estar bastante à vontade no papel, além de mais bela do que nunca. Arrisco-me dizer que esse filme traz a atriz em sua mais competente performance em cena. Completando o time principal está Lola Dueñas, talvez mais lembrada por seu papel no premiado drama "Mar Adentro", com uma excelente atuação como a outra filha de Irene. Todas com ótima química, conseguem construir os personagens principais como figuras bastante envolventes.

Como uma boa produção almodovariana que se preze, a fotografia é composta de cores extremamente fortes, constituindo mais uma vez o visual tão peculiar das produções do diretor. As cores de Almodóvar chegam a ser tão características que até mesmo um conhecedor leigo de sua obra pode identificar suas películas por esse aspecto marcante. A trilha sonora também está, sem exagero, divina. Com melodias incidentais tipicamente hispânicas, a trilha traz inclusive Penélope Cruz entoando um dos mais clássicos tangos de Carlos Gardel que, coincidente ou propositalmente, chama-se "Volver".

No mais, a trama se desenvolve de forma bastante envolvente pelas mãos do diretor. Ainda contando com temas recorrentes como a questão do abuso infantil sofrido pelos personagens que acaba justificando toda a essência de seus atos ou pequenas tragédias que acabam sendo desenvolvidas como algo cômico. Enfim, eis um autêntico Almodóvar, com tudo o que os fãs do diretor têm direito.

Para os que não apostavam que Almodóvar pudesse mais uma vez provar seu talento com "Volver", uma grande surpresa os espera no cinema. O filme vem, definitivamente, para provar por quê o diretor é um dos maiores nomes do cinema atual e que continua em sua mais plena forma.

Amanda Pontes
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