Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 07 de maio de 2005

Cruzada

Ridley Scott dirige novamente um grande épico que pode não ser excelente, mas que pelo menos serviu para nos mostrar que o mundo está saturado de "grandes épicos".

Ridley Scott influenciou muito o cinema quando lançou o seu “Gladiador”. Confesso que não sou muito fã deste filme, mas tenho que tirar o chapéu para ele: muito bem filmado, com atores muito bons, uma direção competente, e, principalmente, trouxe novamente à moda um gênero que havia sido esquecido pelos produtores cinematográficos: os ‘grandes épicos’.

E agora, cinco anos depois, ele novamente mostra algo para nós, meros mortais: está encerrada a temporada de ‘grandes épicos’. Porque afirmo isso? Simples! Responda-me uma pergunta: qual pessoa em sã consciência ainda agüenta, depois dos excepcionais “O Senhor dos Anéis”, o ótimo “Alexandre” e a bomba que atende pelo nome de “Tróia”, filmes que retratam grandes feitos por grandes homens em grandes batalhas? Ganha um doce para quem responder ‘Ninguém!’.

Mas enfim, desabafos à parte, vamos ao que interessa. Afinal, esse novo ‘grande épico’ é bom? É muito bom, quase ótimo até, mas peca muito pela enorme sensação de deja vu que paira no ar quando o filme se inicia.

A história é sobre um ferreiro chamado Balian (Orlando Bloom) que, após a morte da esposa e do filho, seu pai, até então ausente, aparece e convida-o para ir com ele para a Terra Santa e lá construir outra vida. Chegando ao tal local, Balian, após alguns fatos, se torna cavaleiro e conquista a confiança do rei Balduino IV (Eduard Norton, que passa o filme todo coberto por uma máscara). Nesse ínterim, o ferreiro se apaixona, cria uma verdadeira obsessão por seguir seus ideais e acaba liderando um exército inteiro.

Como vocês podem ver o roteiro não acrescenta nada de novo ao cinema, tendo em vista que ele (ou algo genérico) já foi exaustivamente explorado pelos diretores e produtores.

Orlando Bloom está correto, praticamente repetindo seu papel em “O Senhor dos Anéis” e assim, continuando na mesmice e não apresentando nada de novo para o expectador. Já Eva Green, a figura feminina de “Os Sonhadores”, faz o papel de Sibylla, a irmã do rei Balduíno e casada, por obrigação, com Guy de Lusignan (Marton Csokas). Green se mostra bem à vontade e é, assim como no filme de Bertolucci, a única personagem feminina relevante. Quanto aos outros atores não se tem o muito que comentar, tendo em vista que eles interpretaram seus papeis de forma competente e satisfatória para o longa.

Agora o bicho pega quando falamos de algo chamado Cenografia e Direção de Arte. Vocês lembram das duas batalhas mais impressionantes já produzidas no cinema (a do Abismo de Helm, no “O Senhor dos Anéis – As Duas Torres” e a que se passa nos Campos de Pelennor, no terceiro capitulo da trilogia “O Senhor dos Anéis”)? Pois bem, o que vemos durante a principal batalha em “Cruzada” é uma verdadeira remontagem delas duas. Não estou exagerando não! A comparação é inevitável: um verdadeiro forte como o Abismo de Helm (consta!), catapultas enormes arremessando bolas de fogo (consta!), um herói que não fica somente no front e sai pro “mano-a-mano” (consta!), uma região incrivelmente grande na frente do alvo a ser atacado pelos “inimigos” (consta!), e por ai vai, a lista é interminável.

E ai está o grande, enorme, descomunal erro de “Cruzada”. Ao invés de trilhar um caminho mais desconhecido, com cenários originais e locações novas, apesar de não ter, ele aparenta ter sido rodado na Nova Zelândia (ou Terra-Média, como convém chamá-la atualmente) tamanha a similitude com “O Senhor dos Anéis”.

Agora, quanto à trilha sonora, ela difere completamente da trilogia de Peter Jackson. Mas se aproxima muito da de “Falcão Negro em Perigo”, que por ventura, é também de Scott. Você pode pensar: “Eita, esse filme é uma verdadeira colcha de retalhos cinematográfica?” Sinceramente eu acho que não, tenho esperança ainda de encontrar algo original nele, mas infelizmente ainda não tive a felicidade com tal ato.

Meu comentário acerca da direção se resumirá em apenas um conselho: “Scott, entenda como uma critica de amigo, volte aos tempos áureos de “Blade Runner” e se torne novamente um diretor consagrado, com certeza será melhor para você e para a humanidade”.

Apesar de todas essas imitações, “Cruzada” é interessante. Um bom filme para ir com a namorada (apesar de não ter final lacrimoso), para se ver quando quer apenas diversão e/ou quando você sai com uma turma de amigos, tendo em vista que, nessas ocasiões ninguém presta realmente atenção ao filme. Agora, se você vai esperando um filme inteiramente empolgante (o começo é chato demais), com cenas arrebatadoras, fotografia originalíssima, utilização de câmeras de modo diferente (sim, para variar, Scott utilizou o mesmo efeito de “Gladiador”, com aquelas leves paradas durante as lutas), irá se decepcionar um pouco. Espere muito dele e você sairá enganado, espere pouco e você sairá divulgando, para os quatro cantos do mundo, “Esse é o melhor filme do ano”.

Pedro Marques
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