Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de março de 2005

Eliana em O Segredo dos Golfinhos (2005): um filme repetido e repugnante

Quando se vai ao cinema com a intenção de assistir a "Eliana em O Segredo dos Golfinhos" já se sabe o que esperar (muito embora, seja esta a primeira aventura cinematográfica da loira). Querendo ou não, o filme tem 99% de chances de ser (muito) ruim.

eliana-posterO que se nota, logo ao entrar na sala de cinema, é que a sessão não está tão lotada quanto se esperaria, sinal de que o filme não se saiu muito bem frente à concorrência de produções do quilate de “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida” (meu Deus, quando essa mulher vai parar?!).

No filme, Eliana (no papel de si mesma) promove um concurso de redação, cujo prêmio é uma viagem à paradisíaca ilha de Riviera Maya, no México. Calé (João Paulo Bienemann), um garoto que, embora nunca tenha visto o mar, é apaixonado por golfinhos, faz uma redação. Seu colega Rogério (Thomas Levisky) fica encarregado de enviar a redação à Eliana e, como aparentemente não possui uma índole exemplar, põe seu nome como co-autor do texto, desejando com isso conhecer Eliana e aparecer na TV. O texto, como é de se esperar, é escolhido pela apresentadora, e os dois garotos viajam ao México, na companhia da irmã chata e esnobe de Rogério, Veralú (Fernanda Souza).

Na ilha, coisas estranhas começam a acontecer. Os golfinhos de Riviera Maya ficam misteriosamente doentes. Eliana tem uma conexão com os golfinhos a lá “E.T. – O Extraterrestre” e consegue sentir quando um deles morre, o mesmo acontece com Calé. A morte dos golfinhos é explicada por um dos funcionários do delfinário, Pepe (Jackson Antunes), como sendo conseqüência do roubo de uma relíquia ancestral, um crânio de cristal, que era protegida pelos golfinhos de Riviera Maya. O ladrão do crânio é o milionário Esquivel (Fulvio Stefanini), que usa os poderes da relíquia para comprar todos os parques aquáticos da ilha e transformá-los em parques de tubarões (com sessões de carnificinas aos fins de semana). Eliana, o biólogo Fred (Daniel Del Sarto) e Calé têm, então, a missão de recuperar o crânio de cristal e devolvê-lo à tutela dos golfinhos mexicanos.

O filme não chama atenção em nenhum aspecto. Na realidade, é verdadeiramente entediante (até mesmo para crianças, creio eu). Alguns pontos interessantes merecem ser destacados. Todos na ilha, por exemplo, parecem falar fluentemente português, sem sotaques estrangeiros e sem nem sombra do bom e velho portuñol. Na verdade, todos que aparecem no filme parecem ser bem brasileiros. Um grupo de manifestantes, liderados por Supla (em uma engraçada participação especial), urra seus gritos de protesto em português, embora seus cartazes e faixas estejam todos em espanhol! Estranho, não?

A desastrosa atuação de Eliana é superada pela do jovem João Paulo Bienemann (que mostra muito talento). Na verdade, a atuação de Eliana é superada por todo o resto do elenco, pelos golfinhos (mecânicos ou não), peixes, corais, lagostas, caranguejos e esponjas-do-mar que dão o ar de suas graças no longa.

O filme é interrompido por uma injustificada apresentação da banda Rouge. As meninas do grupo dançam e mexem a boca em frente a uma tela verde, onde são projetadas imagens de golfinhos. Tudo isso torna a cena bastante parecida com o programa “Dance o Clipe”, da Mtv. O filme tenta passar a mensagem de proteção à natureza, mas nem isso realiza satisfatoriamente. Os golfinhos, ao contrário do que poderia se imaginar, não são ameaçados por caçadores ou pela poluição. O que ameaça a vida dos cetáceos é o roubo do tal crânio de cristal pelo milionário. Dessa forma, a mensagem não chega por vias certas às nossas crianças que, ao contrário do que pensa Eliana, são bastante inteligentes. Se o filme passa alguma mensagem, é a de companheirismo e amizade, através de Calé e Rogério. Pelo menos isso.

O filme passa por momentos de repetição insuportáveis, como quando o crânio vai passando de mão em mão, conferindo poderes especiais por onde vai. Em mais de uma ocasião, são apontadas armas de fogo às crianças, o que, ao meu ver, é bastante inoportuno e repugnante. Mas, afinal, como já havia sido mencionado no início dessa crítica, o que poderia ser esperado de um filme como esse?

A triste verdade é que o cinema brasileiro ainda está muito longe de oferecer às nossas crianças filmes infantis de qualidade. Enquanto isso, os infantos são bombardeados por tudo o que presta e o que não presta que países como Estados Unidos e Japão têm a nos oferecer. O que não falta no Brasil são autores infantis de qualidade, como Monteiro Lobato e, mais atualmente, Pedro Bandeira e Ruth Rocha. O que falta é iniciativa para fazer com que contos infantis de autores como esses aqui mencionados ganhem vida nas telonas, encantando nossas crianças com o melhor de nossa cultura.

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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