Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de março de 2005

Fantasma da Ópera, O

Vou ser sincero: quem não tiver saco para assistir a um filme quase em sua totalidade cantado, vai achar chato, dormir ou sair no meio da exibição. "O Fantasma da Ópera" é primoroso tecnicamente, musicalmente e tem uma direção de arte espetacular, mas não convence como romance.

Refazer um clássico para as telonas é complicado. Principalmente quando se trata de peça que foi vista por mais 50 milhões pessoas em todo o mundo, que aborda uma trágica história de amor que já fora adaptada para o cinema várias vezes. Mesmo assim, nenhuma adaptação fez mais sucesso do que o musical da Broadway de e Andrew Lloyd Webber, baseado no original de Gaston Leroux. O musical é espetacular, majestoso e grandioso (enfim, quero dizer é bonitão e bem trabalhado). Para entender melhor o porquê de tanto “auê” em relação a essa história, segue um resumo …

A voz dele chama o nome dela, alimentando o seu talento extraordinário pelas sombras do teatro que a ingênua garota do coro, Christine Daae (Emmy Rossum, de “Sobre Meninos e Lobos”, em um bom momento), fez um lar. Somente a mestra de balé, Madame Giry (Miranda Richardson), sabe que o misterioso “Anjo da Música” de Christine é, na verdade, o Fantasma (Gerard Butlerde "Tomb Raider"), um gênio musical desfigurado que assombra as catacumbas do teatro, aterrorizando a todos os artistas que vivem e trabalham ali. Quando a diva temperamental, Carlotta (Minnie Driver), abandona o ensaio da mais recente produção da companhia, os novos gerentes do teatro não têm outra escolha, se não colocar Christine sob a luz dos holofotes.

Sua noite de estréia encanta ao público e também ao Fantasma, que se empenha em transformar a sua protegida na próxima estrela da ópera. Mas ele não é o único homem poderoso a ficar impressionado pela jovem soprano. Christine logo se vê cortejada pelo rico patrono do teatro, o Visconde Raoul de Chagny (Patrick Wilson, numa fraca atuação). Apesar de sentir-se enfeitiçada por seu carismático mentor, Christine fica inegavelmente atraída pelo elegante Raoul, provocando a ira do Fantasma e preparando o palco para um crescente dramático onde paixões arrojadas, ciúme violento e amor obsessivo ameaçam deixar os predestinados amantes — como diz a música — “num ponto sem volta”.

A versão cinematográfica dessa história possui uma excelente trilha sonora. Aliás, o filme é praticamente todo cantado. São poucos os diálogos. Por isso, às vezes, chega a irritar tanta cantoria. Sem falar da ausência da química entre as personagens. Nenhum deles possui carisma. E os casais, tanto o Fantasma e Christine, como Raoul e a mesma moça, não conseguem convencer. É notável o esforço, mas, infelizmente, este não obtém sucesso. Talvez se houvesse inversão nos papéis dos atores que fazem Fantasma e Raoul, pudesse funcionar melhor.

Percebe-se que para a produção do filme, o top da lista de qualidades era a musical. Era necessário que os dotes musicais fossem elevados para que todos cantassem sem dublagens. Infelizmente Minnie Driver foi exceção, e cantou dublando. A maioria é profissional da área, por isso as músicas são bem cantadas. Já interpretadas, não podemos dizer o mesmo. Às vezes chega doer na testa da falsidade na interpretação dos atores. Gerard Butler e Emmy Rossum, o Fantasma e Christine, nunca haviam visto uma encenação de "O Fantasma da Ópera" antes de suas contratações para o filme. Talvez isso tenha pesado um pouco, pois, ao assistir, a pessoa sendo contratada para o filme, o lado emocional não transborda tanto quanto ao assistir por vontade própria. Talvez esteja aí o enigma da "falta de amor" nessa grande adaptação.

O filme era pra ter sido lançado em 1990, com Michael Crawford e Sarah Brightman (linda cantora, por sinal) como protagonistas. Porém, após o divórcio de Sarah e Andrew Lloyd Webber (responsável pelo roteiro, musica e produção do filme), fez com que o sonho fosse adiado. Joel Schumacher ("Tempo de Matar", "Batman & Robin", "Por Um Fio") sempre esteve na preferência de Webber. Tanto que ele disse para Joel que poderia escolher o elenco que quisesse, contanto que os próprios atores cantassem suas canções na história. Talvez esse tenha sido o principal pecado do filme. Mesmo assim, por um excelente trabalho em especifico setores, ele foi indicado a três categorias no Oscar em 2005: Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia e Melhor Canção Original (a linda música "Learn to Be Lonely").

O figurino é maravilhoso. Talvez seja o que mais chama a atenção no filme. O diretor Joel Schumacher mandou caprichar nas roupas das personagens. Mesmo que os cenários possuam uma escuridão natural, tudo foi bem caprichado. A fotografia também está ótima. O Teatro de Ópera Popular está espetacular no filme. É majestoso ver sua ressurreição no início do longa, junto com uma grande música de ópera tocando ao fundo. É empolgante. É apenas o começo. Eu não esperava que o filme todo fosse cantado. Daí vem a chatice. Às vezes você quer escutar as vozes dos personagens sem efeitos musicais (dá para perceber um pouquinho nas poucas falas não-musicais que acontecem no decorrer das 2 horas e 23 minutos de filme). E as "velas" que aparecem durante o filme? Meu Deus! Quanta vela. Imagino o sacrifício que daria para ascender todas se não fossem automatizadas. Chega a ser paranóico o número de velas na bat-caverna do Fantasma.

Você deve estar se perguntando: mas afinal, o filme é bom ou ruim? Em resumo, é um filme mediano. Mérito para a história, bola preta para os atores. Ainda bem que as músicas e a arte do filme são excelentes, pois seria bem chato ver um bando de atores cantando músicas non-sense vestindo trapos. Fazer um filme sem aptidões comerciais é para poucos, mas, da próxima vez, espero algo mais animador. Se bem que é um filme de amor trágico, mas, enfim, dava pra ter sido melhor. Os lados solitários, vingativos e obsessivos do Fantasma é exemplo de que ninguém é dono de ninguém, mesmo que a rejeição seja horrível e praticamente insuportável. O filme fica mais pra “A Bela e a Fera” do que para “O Fantasma da Ópera”. Por querer imitar cenas de outros filmes, ele acaba sendo bem brega no que propõe.

Jurandir Filho
@jurandirfilho

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