Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 01 de julho de 2005

Guerra dos Mundos

Apesar de ser baseado em um livro de H. G. Wells (conhecido pelo estilo duro e adulto), o longa se configura como uma diversão infantil e covarde, onde as coisas que deveriam ser mostradas de modo forte, denso e pesado, são mostradas de uma forma tola. Spielberg, volte ao velho estilo e retorne aos corações dos seus fãs cinéfilos.

É incrível como as pessoas mudam com o passar do tempo. Clint Eastwood e Steven Spielberg são duas provas vivas dessa batida teoria. É claro que ambos em lados opostos da moeda: se Clint começou sua carreira fazendo faroestes, passou a trabalhar em dramas e agora é um dos maiores diretores da atualidade, ao mostrar muita competência e amadurecimento; Spielberg é sua oposição.

No início de sua carreira em Hollywood, Spielberg impressionou pela ousadia colocada em suas obras. “Encurralado” é considerado por muitos um dos melhores road moviesjá feitos. Após essa estréia, o cineasta apavorou todo o mundo com o magnífico “O Tubarão” e então caiu nas graças do público. Infelizmente, de uns tempos para cá, só tem nos decepcionado, fazendo filmes que se aproximam do ridículo, como o lacrimoso “A. I. – Inteligência Artificial” e o bonzinho “Guerra dos Mundos”.

Infelizmente, nem todas as pessoas compreendem o que digo, já que grande parte não conhece o projeto inicial de “A. I.” por exemplo (algo que não irei contar, tendo em vista que este texto é sobre “Guerra dos Mundos” e não sobre “A. I.”).

Este novo projeto de Spielberg é baseado em um dos livros mais cultuados de H. G. Wells, também chamado “Guerra dos Mundos”. Ray Ferrier (Tom Cruise, de “Minority Report – A Nova Lei”, “Jerry Maguire – A Grande Virada” e mais uma pancada de filmes) é um homem divorciado, que trabalha no docas local. Como de costume, ele tem que passar alguns dias com seus filhos, Rachel (Dakota Fanning, de “Amigo Oculto” e “Chamas da Vingança”) e Robbie (Justin Chatwin, de “Roubando Vidas” e alguns trabalhos desconhecidos para a TV). Durante a estada de seus filhos, Ray é testemunha de acontecimentos, no mínimo, bizarros. Daí então, ele descobre que a terra está sendo palco de um verdadeiro extermínio, no qual a sua espécie é a presa. Então ele tem que proteger seus filhos, ao mesmo tempo em que procura aumentar os laços afetivos com eles.

A partir daí somos entregue a um festival de efeitos especiais (excelentes, por sinal), uma busca sentimentalóide de Ray para conquistar o amor de seus filhos (que bonitinho!) e um final horroroso, no qual me aprofundarei mais à frente.

Quanto às interpretações, ouso dizer que Dakota é uma das atrizes mais promissoras dos últimos tempos. É incrível como ela rouba todas as atenções, principalmente quando divide a tela com Tom Cruise. Outro que também merece destaque é Tim Robbins, que faz o papel de Ogilvy, um personagem que surge furtivamente em cena e que foi tratado com um certo desdém da parte de Spielberg. No mais, as outras atuações beiram o mediano: Tom Cruise está correto, Miranda Otto (de “O Senhor dos Anéis – As Duas Torres”) aparece tão pouco em cena que não se tem muito o que falar e Justin Chatwin demostra segurança em seu papel.

Pronto. A partir de agora irei comentar pontos que comprometem as surpresas do filme. Portanto, é recomendável que apenas leiam se já assistiram ao longa. Vamos lá.

Uma das coisas mais decepcionantes do longa foi a atitude altamente covarde de Spielberg ao retratar a guerra (na verdade está mais para um extermínio do que uma guerra, como observou bem Ogilvy). Porque diabos as pessoas são pulverizadas e não mortas de fato? Não li o livro (sim, isso é um pecado de que pretendo me redimir em breve), mas, pelo que os leitores do livro dizem é que na obra original, os Tripods lançam raios de calor. Respondam-se sinceramente: não seria melhor ver as pessoas morrendo queimadas, e não sendo pulverizadas, como é mostrado? Acho que deste jeito o desespero da situação seria muito mais bem retratada.

Outra cena que também merecia mais “destaque” (no sentido literal da palavra) é a em que Ray assassina Ogilvy. Admito que fiquei louco para ver Ray matando Ogilvy, mas infelizmente, outra frustração ocorreu: nada é mostrado.

Entretanto, por outro lado, há quem veja poeticidade no ato de ver as roupas voando, sem nenhum corpo dentro. Admito que é bonito mesmo. Mas este não era o filme para ser poético (mesmo erro de “A. I.”, onde a violência e o desespero pensado por Kubrick foi suavizado demais por Spielberg).

O mesmo raciocínio se aplica ao modo como foi mostrado a morte de Ogilvy: sob a ótica de uma criança. Seria ignorância minha não admitir que foi angustiante ver os rictos de Rachel ao saber que seu pai iria matar Ogilvy. Mas, mesmo assim, volto ao raciocínio que este não era o momento para tal “modo de ver as coisas”.

Agora, algo que me deixou extremamente frustrado foi o final. Que coisa pavorosa foi aquela? Meu Deus do céu! Mas, não ouso reclamar, colocando a culpa no roteirista e/ou no diretor. Dizem que o final do livro é daquele jeito. Portanto, a culpa é, na verdade, do falecido H. G. Wells.

Isso sem contar que, foi no mínimo estranho, como bem observou Jurandir Filho (um de nossos diretores), ver, no início do ataque, um cara filmando tudo enquanto até os relógios haviam parado. E mais estranho ainda, a explicitação da estranheza, tendo em vista que Spielberg, com a intenção de criar uma cena bonita, teve a brilhante idéia de colocar a câmera dentro do visor da outra câmera.

No mais, considero o filme bom, uma boa diversão, mas, em detrimento dos trailers que foram exaustivamente exibidos nos cinemas, causa uma enorme sensação de frustração, já que ele não cumpre nem 60% do que prometiam. Espero que nos próximos projetos do diretor ele volte à velha forma e não se acovarde ao ter que utilizar violência para contar suas histórias.

Pedro Marques
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