Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 28 de março de 2005

Terra dos Sonhos

Uma nova vida. Um novo lar. Uma vida vista pelos olhos daqueles que tudo vêem e nada escondem. Terra dos Sonhos encanta, emociona, ensina, diverte e cativa.

Sempre me disseram que a criança consegue passar um sentimento ou uma emoção com muita facilidade. E isso eu fui aprendendo com o tempo. O fato é que ela não consegue mentir. Sua sinceridade é uma dádiva que a criança recebeu de uma força superior. A facilidade de demonstrar que está triste ou feliz é coisa para poucos.

"Terra dos Sonhos" tem o objetivo de mostrar esses altos e baixos da vida na visão de duas crianças (a principal com 10 anos e a mais nova com 6 anos).

A história do filme começa quando uma família irlandesa que está no Canadá decide recomeçar a vida indo para os EUA. Logo no início do filme você já consegue sentir um pouco do que está por vir. O guarda na fronteira entre os dois países pergunta ao Johnny (Paddy Considine) quantos filhos eles têm, e logo ele responde: "três". Sarah
(Samantha Morton) logo corrige dizendo são apenas dois filhos. O problema é que Johnny não superou a morte recente de seu filho mais novo (Frankie). Ariel (Emma Bolger, com um carisma e talento absurdo), a filha mais nova, e Christy (Sarah Bolger), a mais velha, estão empolgadíssimas com a mudança para os EUA.

O título do filme é referente aquele típico sonho do imigrante nos EUA que vê o país como a solução dos problemas. Como um novo começo de vida, uma nova experiência, sempre almejando a felicidade e sucesso. O grande sonho do recomeço americano. Um lugar onde todos são amigos, ladrões pedem desculpa depois da tentativa de assalto, os travestis são amigos das crianças. Fato irreal, já que os americanos odeiam imigrantes. Mas isso não vem ao caso.

O diretor Jim Sheridan (ele disse que o personagem Frankie, o filho que morreu, foi baseado em seu irmão na vida real, que possui o mesmo nome) escolheu uma época de uma Nova York onde as coisas são difíceis para imigrantes (aliás, até hoje continua ruim). Enfrentando as dificuldades da vida em relação ao desemprego, clima, ambiente, falta de dinheiro e o perigo do preconceito dos locais. Para as crianças tudo é mágico. Um conto de fadas. Mas aos poucos elas vão percebendo as dificuldades que se entrelaçam com a ainda falta do irmão mais novo que morreu e as crises de família. Junto com a complexidade do papel do personagem Mateo (Djimon Honsou) que é pintor e soropositivo em fase terminal, os personagens vão se relacionando de acordo com os acontecimentos. O antes assustador Mateo, agora é amigo da família e passa a conviver com ela diariamente.

O carisma das crianças é algo sem noção. A mais nova, Ariel, é tão linda expressando e interpretando sua personagem que dá vontade de morder (rs). Ela sobressai em todas as cenas em que está presente, pois é a única personagem que ainda consegue ver a realidade com os olhos inocentes e otimistas de uma criança. Sua irmã, Christy (Sarah Bolger), foi obrigada a amadurecer mais cedo para ajudar a família a enfrentar situações adversas. O fato de Ariel e Christy serem irmãs na vida real fez com que a interação entre as duas fosse muito mais espontânea e realista. Christy consegue ver e entender os problemas da família, já que ela carrega esta nas costas desde a morte de Frankie, porquê o pai não consegue mais se emocionar, se divertir e viver da mesma maneira antes da morte do filho mais novo.

O papel de mãe interpretado por Samantha Morton é de fato emocionante. Ela consegue transparecer com muita facilidade as dificuldades que a família está passando por causa dos inúmeros fatores adversos. O drama paira em muitos momentos na película. Você fica com o coração apertado, torcendo para tudo dar certo. Está interação entre o filme e público é algo raro de se ver hoje em dia. A bela atuação dos personagens rendeu várias indicações a prêmios importantes como: 3 indicações ao Oscar (Melhor Atriz (Samantha Morton), Melhor Ator Coadjuvante (Djimon Hounson) e Melhor Roteiro Original) e 2 indicações ao Globo de Ouro (Melhor Roteiro e Melhor Canção Original – "Time Enough for Tears").

As vezes é melhor deixar esse lado técnico do filme (que tem altos e baixos, aliás, bem baixos) e avaliar o filme por seu conteúdo. Ele tem um elenco fantástico, que consegue passar com clareza e realidade os problemas do dia a dia, e uma belíssima história, que de fato, poderia acontecer com qualquer um. Esta realidade é que chama a atenção do público.

No final do filme, cuidado, os mais sensíveis podem se emocionar e chorar. O que não faz mal nenhum. Todo mundo gosta de ver superação de problemas e sucesso em tudo na vida, e eu fico feliz quando isso acontece, mesmo que seja apenas num filme.

Jurandir Filho
@jurandirfilho

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