Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de março de 2005

Vôo da Fênix, O

Dennis Quaid, já não tão eficiente como em filmes anteriores, comanda uma equipe de desiludidos e sem esperança nesta refilmagem. No final das contas, o filme funciona como entretenimento, mas não passa disso.

Existem alguns filmes que o trailer parece entregar tudo do filme. O trailer de "O Vôo da Fênix" é longo e mostra as principais cenas do filme em cortes. Isso não chega a estragar, mas poderia ter sido evitado. Se eles evitassem, talvez o trailer não chamasse tanta atenção. Faz parte do jogo. Faca de dois gumes.

O filme é um remake do original de 1965 dirigido por Robert Aldrich, baseado no livro homônimo de Trevor Dudley Smith, estrelado por James Stewart ("Festim Diabólico", "Um Corpo que Cai", ambos de Alfred Hitchcock) , Richard Attenborough ("Gandhi", "Um Grito de Liberdade") e Ernest Borgnine ("A um Passo da Eternidade"). Uma boa pedida de entretenimento que teve a essência mantida, mas com pitadas Hollywoodianas.

Grupo de sobreviventes de um acidente de avião é lançado no meio do deserto de Góbi sem chance de escapar. Tendo de enfrentar um ambiente inóspito, com suprimentos acabando rapidamente, além de um ataque de ladrões do deserto, eles percebem que a única esperança é realizarem o "impossível": construírem um novo avião a partir dos destroços do primeiro e fugirem do deserto. Quando o piloto de aviões de carga Frank Towns (Dennis Quaid) e seu co-piloto AJ (Tyrese Gibson) são enviados para a Mongólia para retirarem o pessoal de uma exploração petrolífera interrompida, mas, logo depois da decolagem, enquanto sobrevoam o deserto de Gobi, eles são engolidos por uma terrível tempestade de areia e obrigados a fazer um pouso forçado.

Com o avião avariado e sem chances de conserto, os onze passageiros que sobrevivem se vêem com pouca comida e água. À medida que as tensões aumentam e as acusações começam, a situação deles se torna cada vez mais desesperadora. Um homem excêntrico e misterioso chamado Elliot (Giovanni Ribisi) – uma das últimas pessoas a serem incluídas na lista de passageiros – oferece esperança ao sugerir que eles construam um novo avião, que será batizado de Fênix, a partir das peças do C-119 que não foram afetadas.

Towns e os outros começam dizendo que o plano de Elliot, além de impraticável é absurdo. E mais ainda: ele iria rapidamente acabar com os já escassos recursos e energia. Contudo, quando o numero de sobreviventes começa a diminuir e todas as chances de serem resgatados desaparecem, eles percebem que o plano de Elliot é a única chance que têm, e o único jeito de fugirem é para o alto. Os sobreviventes colocam suas diferenças de lado e, sob a liderança de Elliot, começam a construção da Fênix. Mesmo quando o novo avião começa a tomar forma, a tarefa parece impossível. Mas o impossível é a única escolha que eles têm.

Tecnicamente, o filme é ótimo. A cena da queda do avião está perfeita. Passa um realismo absurdo. Uma pena que os atores não convencem tanto. De certa forma, essa falta de sintonia dos atores, faz com que um humor involuntário surja, o que agrada bastante e consegue manter o pique do longa. Como na música do Outkast, "Hey Ya", que toca no rádio e eles todos se divertem, dá um clima melhor ao filme. Afinal, estão todos no deserto, sem esperanças, lutando para sobreviver ao calor/fome, cansados e sujos. Nada mais justo do que um momento de diversão entre tantas adversidades. E funciona muito bem, por sinal.

Algumas indagações fazem você refletir. O personagem de Kevork Malikyan (Rady) conta uma espécie da fábula que questiona um pouco a religião. Muitos dizem que a religião levanta um homem, move montanhas e cura doenças. Há um contra-argumento. Segue o trecho:

Um Rabino e um padre assistiam uma luta de boxe. Eles observam os lutadores subirem ao ringue. O rabino vê um dos lutadores fazer o sinal da cruz. Assim o rabino vira ao padre e pergunta: "O que significa isso?". O padre diz: "Não é uma coisa ruim se o homem não pode lutar."

Espiritualidade não é religião. Religião separa as pessoas. Acredito em algo une.

John Moore cumpre o seu papel de fazer um filme pipocão. Filmes pra cinema mesmo. Ele possui todos os ingredientes possíveis para agradar os menos críticos: ação, drama, comédia, um pseudo-romance (Dennis Quaid e a fraquinha Miranda Otto), emoção, além de muito clichê. É difícil questionar um filme que cumpre bem seu papel de entretenimento, mesmo que ele não vá, além disso. Nas cenas em que o avião está caindo, John Moore faz com sucesso ótimas cenas de ação e convincentes. Cenas de ação fizeram de seu filme, "Atrás das Linhas Inimigas", uma boa pedida. Um gênero interessante. É como Walter Salles que só fez dramas, mas agora, está se aventurando em fazer filmes terror.

Se você não for muito exigente, vai acabar se divertindo com o filme. Da mesma forma que ele cai, a Fênix consegue levantar vôo. Vale reparar em cada personagem, cada um com sua particularidade. Mesmo que o esquizofrênico Giovanni Ribisi seja um anti-herói bem fraquinho, ele dá conta do recado que lhe fora exigido. Quem sabe, você aprenda algo com esse filme de auto-ajuda.

Jurandir Filho
@jurandirfilho

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