Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Safety (Disney Plus, 2020): drama biográfico para toda a família

Baseada na história real de Ray McElrathbey, obra evita temas mais pesados para atrair um público mais abrangente.

Um jovem que acaba de ir para a faculdade jogar futebol americano precisa cuidar do irmão mais novo após sua mãe ser presa. Esta é a história de “Safety”, baseada em fatos que aconteceram em 2006 na vida de Ray McElrathbey (Jay Reeves). Se tivesse que imaginar qual plataforma de streaming seria a responsável por produzir essa trama, provavelmente a Disney Plus seria uma das últimas opções. A versão entregue, é claro, evita grandes conflitos e é direcionada para um público mais abrangente.

No drama biográfico, o diretor Reginald Hudlin (“O Pai da Black Music”) apresenta os três desafios que o protagonista precisa enfrentar ao mesmo tempo: tirar boas notas para não perder a bolsa, conquistar a confiança do treinador Tommy (Matthew Glave) para ganhar uma vaga no time titular e cuidar de Fahmarr (Thaddeus J. Mixson), seu irmão de 11 anos que vai morar escondido em um quarto na universidade.

Fica a impressão de que o roteiro de Nick Santora (da série “Prison Break”) precisou passar por alguns ajustes para transformar o drama em algo um pouco mais “Disney”. Isso significa cortar um aprofundamento da parte familiar, que merecia ser contada com mais cuidado, para abrir espaço para uma história esportiva cheia de clichês. O texto faz com que o espectador praticamente esqueça que o filme é baseado em fatos. Tem o treinador sábio que pega no pé dos novatos, os veteranos obrigando calouros a buscarem bebidas, o momento de queda e redenção esportiva, entre muitos outros.

Um exemplo que merecia ser mais explorado é a história de Tonya (Amanda Warren), a mãe dos garotos, que aparece por pouquíssimo tempo no filme e rouba suas cenas. Ao invés disso, Santora passa o primeiro arco criando uma rivalidade infantil com Keller (Miles Burris), o capitão do time, que simula um tipo de vilão padrão, que dificultará a vida de Ray no campo. Isso só para em seguida já estar tudo certo entre os dois. É evidente que essa é uma trama completamente desnecessária para o desenvolvimento da história.

Quanto à parte esportiva da obra, o diretor transparece se sentir bem à vontade. Ele capricha nos planos abertos do campo de futebol americano, usa a técnica da câmera subjetiva, ou seja, simula o olhar do personagem para demonstrar como o esporte é muito físico e cria um dinamismo com cortes rápidos e muitos gritos de treinadores.

Já quando o destaque está nos bastidores do esporte, os termos técnicos podem afastar os espectadores que não têm tanto conhecimento sobre o tema. O problema é que muitas dessas expressões não possuem tradução conhecida para o português, por exemplo: “O combo curl out para bloquear os screens e cobrir o três na deep route”. Outro ponto negativo é a propaganda excessiva da Nike e da própria Universidade de Clemson, local em que a história se desenvolve. Os closes na marca podem parecer inofensivos no início, mas a repetição em todo o longa mostra as reais intenções por trás da exposição.

Com “Safety”, o diretor Reginald Hudlin tinha uma história dramática e um protagonista forte. Ao escolher o lado mais leve da história, mostrando como o protagonista encontra uma outra família por meio do esporte, a vida real se perde um pouco. Quem dera se as dificuldades da vida fossem escritas pela Disney.

Fábio Rossini
@FabioRossinii

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