Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 12 de março de 2020

Bloodshot (2020): uma somatória de clichês de Vin Diesel

Dentro de toda a carreira de Vin Diesel, 'Bloodshot' não merece ocupar um local de destaque. O filme tem seus méritos, mas por estar preso demais ao ator, se obriga a seguir uma fórmula já esgotada. Mesmo que (quase) tudo funcione bem, soa como algo repetido.

Vin Diesel é um ator que conseguiu construir uma carreira muito específica. Assim como Nicolas Cage fez no final da década de 1980 e, principalmente, durante a de 1990, quando o nome de Diesel aparece em algum projeto, é possível já ter uma imagem de como o filme será. E, mesmo que isso estrague parte da experiência — afinal, o ator se construiu em uma fórmula dentro do cinema de gênero —, por vezes é capaz de algum projeto trazer novidades, mesmo que ele seja uma somatória de clichês de Vin Diesel. “Bloodshot” é um bom exemplo disso.

A trama segue Ray Garrison (Diesel), um soldado de elite que foi morto por um terrorista, mas é trazido de volta à vida por uma tecnologia avançada que lhe deixa com superforça e dá a capacidade de se regenerar rapidamente. Com suas novas habilidades, ele decide se vingar do homem que matou sua esposa, mas com o tempo ele descobre que as coisas não são exatamente como ele imaginava. Agora Garrison precisa descobrir se existe alguém em quem ele pode confiar, incluindo ele próprio.

O novato Dave Wilson demonstra saber para qual direção seu filme deve seguir, o que deixa a narrativa fluida e pouco confusa. Por um lado, é um mérito importante, pois a trama permitiria caminhos mais densos, como a ficção científica já cansou de apresentar. Porém, para que o longa consiga se comunicar mais diretamente, as escolhas se mostram genéricas. Em alguns casos simplistas demais, em outros convenientes. Basta ver como todo o controle sobre o corpo tecnológico de Garrison e dos demais supersoldados é facilmente “hackeado”.

Vale lembrar que isso não é um demérito do filme. As escolhas, apesar de simples, são coerentes com o que o roteiro apresenta. O ponto é que havia espaço para que o filme entregasse mais. As habilidades dos supersoldados iniciam um diálogo sobre o que eles são — o próximo passo da humanidade? —, mas além de Garrison e KT (Eiza González), o tema é deixado de lado para que o filme possa se focar no que ele realmente é: uma somatória de clichês de Vin Diesel.

A jornada que o protagonista atravessa é semelhante a outras vistas ao longo da carreira do ator (de “Triplo X” a “O Último Caçador de Bruxas”) e Diesel tem uma atuação satisfatória dentro do que é esperado dele. É convincente nas cenas de ação, exagerado no drama e o humor é sempre duvidoso, mas funciona (novamente, assim como Nicolas Cage no passado). O filme é construído ao redor do ator, e existem poucas ações que acontecem sem depender da presença dele. Como o longa não nega em momento algum que segue o formato de “filme para o Vin Diesel”, há um acerto aqui, para o bem e para o mal.

Com tudo isso, a grande aposta do filme em algo diferente, é a narrativa de corrida contra o tempo, já explorada em diversos filme de ficção científica e que aqui não consegue ir além do básico. Da mesma maneira como acontece com a discussão sobre humanidade, o tema tem uma importância dentro da narrativa, faz a trama avançar, mas serve principalmente para criar as boas sequências de ação. Ao não se propor a explorar a ideia de um protagonista perdido dentro do próprio corpo e punido com a tecnologia a repetir os mesmos crimes, roteiro e direção deixam de dar mais substância a um filme que possuía potencial para ser algo realmente diferente.

“Bloodshot” não é um novo clássico, mas entrega algumas novidades interessantes dentro de um mercado já tão saturado. Por adaptar uma HQ pouco conhecida, pode se libertar do material original, mesmo que faça isso timidamente. Caso a discussão sobre a humanidade dos personagens percorresse o filme com mais consistência, ele poderia oferecer algo além de algumas boas sequências de ação. Ao apostar no que Vin Diesel é expert em fazer, a direção de Dave Wilson oferece um filme com bons momentos, mas que raramente sai da zona de conforto. No final é apenas uma somatória de clichês de Vin Diesel. Com bons clichês, mas que oferece pouco além disso.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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