Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Crítica| Floresta de Sangue (Netflix, 2019): sem pé nem cabeça

Uma história sobre um serial killer, uma equipe de filmagem, meninas colegiais e um charlatão de meia idade. São muitos elementos que não conversam entre si e nem com o espectador, que termina de ver o filme sem entender o que assistiu.

O longa japonês “Floresta de Sangue” entra para o catálogo da Netflix, sem encontrar nenhum título semelhante. Afinal, nele estão misturados diversos gêneros e subgêneros como o drama, o gore e uma pitada de documentário. Além disso, há vários  elementos da cultura japonesa, como o hentai e o kawaii. Ademais, a definição do próprio enredo é difícil de ser descrita, já que há vários personagens distintos, várias linhas do tempo e a cada momento, durante seus mais de cento e cinquenta minutos, somos encaminhados para diferentes segmentos narrativos.

Enquanto há um serial killer matando garotas à solta, um grupo de jovens aspirantes a cineastas se dirigem até à casa de Taeko (Kyoko Hinami), um arquétipo conhecido de menina rebelde com cabelo curto e colorido. O objetivo da visita é pedir para ela ajudar a tirar a virgindade de um deles, Shin (Shinnosuke Mitsushima). Sua sugestão é a amiga Mitsuko (Eri Kamataki). Essa colega ficou enclausurada em casa desde a morte do amor da sua vida do colégio, uma garota que é mencionada como “Romeo”. No mesmo dia, um homem de meia-idade charlatão também é introduzido à equipe. A partir daí, várias pequenas histórias vão se desenvolvendo de forma metalinguística, pois os personagens começam a rodar um filme sobre esse senhor e, simultaneamente, atuam nele.

Uma dessas linhas temporais envolve o passado de Taeko, Mitsuko e “Romeo”: sua época de estudantes colegiais durante a montagem de uma peça, na qual as duas últimas interpretavam o famoso casal Romeu e Julieta e a outra dirigia a peça. Aqui, o filme parece estar totalmente desconectado do resto, tendo uma trilha sonora “fofinha”, uma fotografia estourada com muita luz, como se fosse um sonho, muitos tons de branco, elementos kawaii e hentai presentes no comportamento das estudantes. Porém, tudo isso está presente em cenas de dança, risos, beijos e sexo oral entre elas, dentro da escola e usando as roupas tradicionais daquele ambiente. Após uma tragédia metafórica onde “Romeo” morre de verdade, a vida das jovens no colégio se transforma, até o ponto de um suicídio coletivo.

O diretor Sion Sono provoca caos e confusão mental no espectador, tornando o filme quase intragável. Quando não há aspectos demais para serem entendidos, há pouquíssimos que não conseguem explicar a cena. Há uma falta de coerência e equilíbrio no roteiro e na direção, que acaba exagerando na tentativa de trazer algo renovador. Apesar da grande tentativa de inovar, o resultado é carregado de clichês e interpretações que são tão caricatas, beirando ao ridículo, que nos fazem questionar a seriedade e o objetivo do projeto.

Uma ressalva é o efeito visual positivo, que mostra suas qualidades artísticas e estéticas. A fotografia desperta interesse com luzes coloridas, muitos closes e câmera que se movem de formas inusitadas. Há cenários diferentes e contrastantes, que saltam aos olhos e transformam cada frame numa espécie de pintura.

A esperança de que tudo fará sentido no final até pode criar um esforço para conseguir assistir “Floresta de Sangue”. No entanto, a expectativa se transforma em decepção. A confusão é só maior e o desfecho fica em aberto. O filme é daqueles que, provavelmente, deixará lembranças por um longo período, mas não em um bom sentido. Serão lembretes da desordem mental provocada e da sensação de não o assistir novamente. 

Maduda Freitas
@MadudaFreitas

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