Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 10 de setembro de 2019

Abigail e a Cidade Proibida (2019): aventura tediosa

Bons visuais não compensam roteiro confuso, ritmo inconstante e personagens sem carisma.

No início de 2019, chegava aos cinemas “Máquinas Mortais”, uma fantasia pós-apocalíptica com temática steampunk que prometia muito, mas entregou pouco. Meses após essa grande decepção, um filme russo de gênero idêntico estreia, trazendo esperanças para os fãs de boas aventuras. Infelizmente, “Abigail e Cidade Proibida” não só repete os mesmos erros narrativos como consegue ser ainda mais entediante.

A trama envolve a protagonista Abigail (Tinatin Dalakishvili), que mora numa cidade fechada dentro de muros erguidos antes da mesma nascer devido a uma suposta epidemia. Com flashbacks até razoavelmente colocados, descobrimos que seu pai foi levado pelo governo (pois era o que acontecia com os infectados) quando ela era criança, impelindo-a, já adulta, a desafiar o status quo para descobrir o que realmente aconteceu.

O visual do filme funciona. Os efeitos especiais, em geral, são de alta qualidade, com criações impressionantes e texturas palpáveis. Entretanto, há uma criatura mágica apresentada logo na primeira cena onde é notável a camada de CGI por cima do filme. É esquisito e esse tipo de falha se repete em alguns momentos. A ambientação acerta nos figurinos e nos belos cenários, tudo remetendo ao início do século XX. Infelizmente, os elogios acabam por aqui.

É realmente de cair o queixo o quanto o filme é ruim. A trilha sonora é mal utilizada. Ela tenta demais forçar sentimentos no espectador que simplesmente não estão lá, pois os personagens são pessimamente construídos, os arcos narrativos são risíveis e os diálogos bebem de uma fonte de clichês tão forte que engasga o ritmo do longa.

Evitar o tédio causado por um filme narrativamente caótico é uma tarefa impossível. A trama principal é arrastada demais e o diretor (Alexandr Boguslavsky, “Mentes em Jogo”) se pega tendo que correr com os outros acontecimentos porque o tempo de projeção está perto do fim, resultando no desperdício do potencial de qualquer peso emocional que a trama poderia oferecer. É tudo tão confuso que é complicado entender se a história é sobre revolta, família, amor ou seja lá o que for.

Com isso, os personagens são enfadonhos e possuem menos carisma que uma pedra. Vários não têm função narrativa alguma e contribuem para uma barriga narrativa severa como o inverno russo. Os flashbacks mencionados anteriormente rendem os únicos momentos bem compostos para o arco da protagonista, mas ficam perdidos num mar de atores sem química tentando fazer um texto desconexo e fraco render. Aliás, há uma tentativa de romance aqui tão patética que causa vergonha alheia enorme ao fazer “Crepúsculo” parecer “Romeu & Julieta”.

No início do século XXI, adaptações cinematográficas de livros feitos para jovens adultos eram produzidas às pencas. A pressa em lançar qualquer coisa do gênero resultou em inúmeros filmes esquecíveis claramente lançados sem o polimento narrativo necessário, cujo único objetivo é de tentar arrancar algum dinheiro do público. “Abigail e a Cidade Proibida” parece uma obra feita para sair nessa era, mas com pelo menos cinco anos de atraso, e consegue ser pior que a maioria dos longas sobre adolescentes liderando revoltas contra o poder opressor lançados entre os anos 2000 e 2015. A interessante premissa tinha potencial, mas acaba enterrada numa montanha de decepcionantes erros.

Bruno Passos
@passosnerds

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