Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 10 de agosto de 2019

45 Dias Sem Você (2018): tour do coração partido

Um jovem que acaba de ter seu coração destruído decide se curar com uma viagem por Inglaterra, Portugal e Argentina. Uma trama rasa, mas com atuações convincentes.

O que você faz em 45 dias? Pode acompanhar seu clube jogar pelo menos 14 partidas de futebol, quem sabe maratonar aquela série que tem 10 temporadas, ou talvez zerar aquele jogo novinho que você comprou? Mas que tal você esperar arduamente seu amor por todos esses dias e quando ele reaparecer você escutar que está tudo acabado? “45 Dias Sem Você”, escrito e dirigido por Rafael Gomes (“De Onde Eu Te Vejo”), nos apresenta o drama de uma pessoa que viveu isso, mas agora o que mais quer na vida é superar esse acontecimento.

O roteiro se desenrola quando Rafael (Rafael de Bona) é surpreendido pelo seu “namorado” com o anúncio do fim do relacionamento após ter esperado por sua volta durante 45 dias. Muitas pessoas afogariam suas mágoas em guloseimas, músicas tristes, filmes e séries ou simplesmente em baladas e bebidas, porém Rafael decide fazer um pouco diferente. Ele escolhe pegar um voo para uma jornada de autoconhecimento. Nesta viagem passa por várias cidades e encontra alguns amigos, Júlia (Júlia Corrêa) em Londres (com um breve pulo em Paris), Fábio (Fábio Lucindo) em sua passagem por Coimbra e Lisboa e Mayara (Mayara Constantino) em Buenos Aires.

O longa é todo desenvolvido nessa busca pela cura de seu coração partido, em cima do egocentrismo de Rafael, um rapaz que é um tanto privilegiado e faz questão de deixar isso bem claro, e de seus amigos. O roteiro escrito por Rafael entende bem esse ponto dos personagens e cria diálogos que giram em torno deles próprios e de seus problemas, o que faz com que se torne clichê e previsível em alguns momentos. No entanto, é nessa dualidade doença/cura e amor/amizade que o filme cresce.

Em pouco tempo de imersão se percebe que o longa quer lhe vender algo bem mais íntimo que uma obra qualquer. A fotografia que, por vezes, parece ser um vlog bem trabalhado, o roteiro com suas conversas que tentam lhe trazer para dentro da história e a naturalidade com que esses diálogos são trabalhados formam um todo interessante nesse sentido. As atuações de Júlia, Fábio e Mayara são excelentes e totalmente naturais, sendo esse um dos pontos mais altos do filme. Todas as cenas em que os amigos aparecem juntos com Rafael, seja indo à uma festa, um bar ou sentados numa sala, ganham um tom realista na história e não somente como algo cômico ou terapêutico. O espectador facilmente acredita que há uma relação de amizade entre os personagens.

E se na química entre os amigos o filme se saiu super bem, não podemos dizer o mesmo sobre o outro lado da moeda. Rafael é um rapaz de 30 e tantos anos, mas que em relação ao amor parece que estagnou nos 15. O fato de não querer falar mais o nome da pessoa que o deixou, de não querer desabafar (a menos que esteja bêbado) soa mais como algum adolescente fazendo birra do que com alguém que está numa jornada de autoconhecimento. Essa luta interna do personagem parece ter atrapalhado um pouco na atuação de Rafael que demora a se encontrar no papel. Consequentemente, também custa a criar empatia com o espectador. Em poucos momentos você consegue enxergar que a dor é real e que o sofrimento está ali.

Por fim, “45 Dias Sem Você” se mostra um tanto atrevido por trazer para o cinema nacional algo bem diferente do que é visto, mesmo que às vezes o filme seja muito raso, tanto no drama como na parte técnica. Isso acontece por falta de ousadia em planos, até mesmo pela ausência de aprofundamento nas cidades em que Rafael passa, fazendo com que sejam usadas apenas como cartões postais e mais um clichê do tipo “estou triste, mas estou triste em Paris”. Contudo, o tom humorado que é tratado o amor e as confusões da vida é bem bacana. A forma com que as narrativas conseguem se tornar pessoais e trazem o espectador para trama, mesmo mostrando uma realidade social distante para muitos brasileiros, e o fato de conseguir passar a mensagem do real sentido de ter uma amizade verdadeira merecem ganhar um destaque especial junto às boas atuações de parte do elenco. Esse conjunto faz com que a história seja leve e a obra cativante.

André Bastos
@_drebastos

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