Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 05 de maio de 2019

Nosso Planeta (Netflix, 1ª Temporada): ainda há tempo de salvá-lo! [SÉRIE]

Dividida em 8 episódios, a minissérie documental ressalta as belezas da natureza e faz constantes alertas sobre a necessidade de contribuir a fim de evitar um colapso ambiental.

Você com certeza já ouviu falar em aquecimento global, o processo de aumento da temperatura média dos oceanos e da atmosfera da Terra causado por massivas emissões de gases que intensificam o efeito estufa. Ele é originado de uma série de atividades humanas, especialmente a queima de combustíveis fósseis e mudanças no uso da terra, como o desmatamento, exploração desenfreada, caça ilegal etc. Já foi comprovado que esse processo, por tantos ainda menosprezado, é uma realidade que reserva um destino muito cruel a longo prazo para os vários ecossistemas do planeta. A minissérie documental “Nosso Planeta”, narrada com extrema elegância e afinco pelo naturalista britânico David Attenborough (“Blue Planet II”) e disponibilizada pela Netflix, é mais uma tentativa de abrir os olhos do espectador para a tragédia que pode matar aos poucos as belezas, algumas delas bem escondidas, espalhadas pelos quatro cantos da Terra.

A população mundial cresce exponencialmente e quem sofre com isso é o planeta Terra, que vê crescer também o descaso para com a sua natureza majestosa e repleta de encantamento. A partir dessa premissa, a minissérie segue uma linha estrutural bem definida. Aqueles que esperam uma abordagem mais “National Geographic”, com animais devorando animais em combates sangrentos, disputas violentas entre machos-alfa e urubus esperando pela próxima carniça, podem se decepcionar. O propósito do argumento de cada episódio é destacar a grandiosidade de lugares específicos, os quais desfrutam de paisagens de tirar o fôlego e seres vivos fascinantes com estilos de vida peculiares. No meio dessas imagens, David Attenborough, cuja narração transita com fluidez entre tons alarmantes quando necessário e outros mais empolgados, transparece seu deslumbre com os objetos narrados e traz para o debate fatos que prometem colocar em xeque o futuro de certas espécies.

No entanto, não precisa ter sangue para chocar e algumas sequências conseguem provocar tristeza, por exemplo, num dos episódios é retratada a situação das morsas no estreito de Bering, que separa a Rússia e o Alasca. Com o derretimento da camada polar, milhares delas se concentram em locais pequenos, onde mal conseguem se mover e podem esmagar umas às outras até a morte. Algumas escalam costa íngremes para melhor se moverem, mas acabam caindo do penhasco ao tentarem voltar para a água em busca de comida. Como devem ser os documentários que desejam transmitir precisão em seus acontecimentos, “Nosso Planeta” apresenta ainda uma série de dados que corroboram os riscos que as mudanças pelas quais o mundo está passando trazem, ao passo que exibe números mais consoladores, afinal, apesar de toda a crítica embutida nos oito episódios, existe um sopro de ânimo que visa inspirar e conscientizar o público a fazer a sua parte quando se trata de ajudar o ambiente.

Outro fator que alimenta essa narrativa o suficiente para comover, entreter e de alguma forma revelar cenas graciosas é a trilha sonora perfeitamente adequada a cada um dessas ações. A minissérie mostra que não se trata apenas de jogar o espetáculo na tela auxiliado por uma narração envolvente. É preciso sobrepor os arranjos certos para que o clima edificante ou amedrontador paire pelas imagens em sequência, e isso fazem com muita eficácia. Durante uma das mais belas histórias reveladas, podemos ver a Ave-azul-do-paraíso mudando sua estrutura corpórea com o auxílio das asas versáteis para atrair sua companheira, tudo isso acompanhada de um arranjo dançante e bem humorado capaz de extrair delicadeza daquela ocasião. Por outro lado, nos deparamos com uma orquestra terrificante que antecede o exato momento em que uma onça-pintada pula de uma árvore em direção ao rio para atacar um jacaré. Ou até mesmo no maior encontro de baleias-jubarte já visto, que embalado por uma composição entusiasmante, termina sendo um ápice fascinante em meio a tanto pessimismo.

Com filmagens realizadas em mais de 60 países e cerca de 400.000 horas acumuladas, sendo 2.000 delas apenas embaixo da água, “Nosso Planeta”, com suas maravilhosas imagens jamais antes capturadas pelo ser humano, suas lições e estudos de caso – se assim podemos chamar – oferece à audiência uma experiência construtiva e horas de reflexão. Apela para o impactante quando fundamental, porém, no geral, entrega oito episódios equilibrados, onde a montagem alterna entre os ambientes com fluidez, trazendo sempre algo novo e importante. Passando pelas extensas florestas, paraísos congelados, selvas intimistas, desertos, campos e muita água doce, cumpre sua missão em advertir sobre a bagunça que o homem está fazendo com seu bem mais precioso. Pede socorro de maneira sutil e afirma que ainda há tempo para resgatarmos aquilo que estamos matando aos poucos. Aquecimento global não é besteira, muito menos invenção de naturalista. É real, está acontecendo e precisa da nossa atenção. Vamos acordar!

Renato Caliman
@renato_caliman

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