Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 18 de abril de 2019

Confronto no Pavilhão 99 (2017): brutalidade sem limites

Em seu segundo filme, S. Craig Zahler deixa claro o estilo cru e violento de suas obras.

Apesar de estar no início de sua carreira, S. Craig Zahler já encontrou um estilo para chamar de seu. Se em “Rastro de Maldade” o diretor brincava com o místico sem tirar os pés da realidade, em “Confronto no Pavilhão 99”, ele trabalha com a frieza e brutalidade que envolve uma vida criminosa. Bradley Thomas (Vince Vaughn, “Até o Último Homem”) é um ex-boxeador que acaba de perder o emprego e de ser traído pela esposa. Sem saber o que fazer, ele termina retornando ao mundo do crime, pelo menos até uma de suas operações dar errado e ele ser preso. Na medida em que deseja se vingar daqueles que o colocaram naquela situação, tenta sobreviver em um ambiente hostil e violento.

A exemplo do seu longa anterior, Zahler demonstra uma crueza que parece ditar o tom de suas obras. Com um ritmo lento, o diretor (que também escreve o roteiro) consegue manter o interesse do espectador. Vince Vaughn, que já tinha dado um bom salto da comédia para o drama na segunda temporada de “True Detective”, se sai bem apesar de falhar nas cenas em que tenta emular um bad boy. É no drama que o ator surpreende e é exigido. Utilizando de grandes angulares, principalmente nas cenas internas, Zahler faz do público um grande observador sádico, que acompanha com atenção cada cena chocante que permeia a narrativa.

As cenas de ação são cruas e autênticas, filmadas com poucos cortes, às vezes com uma câmera no ombro que parece perseguir o protagonista. A fotografia azulada e cercada de sombra e penumbra de Benji Bakshi (que repete a parceria com Zahler) demonstra que cada personagem tem um lado sombrio – algo confirmado posteriormente em suas motivações questionáveis, mesmo assim é impossível torcer contra eles. Os diálogos são cercados de uma frigidez que deixaria qualquer um enojado, e todos envolvem um processo doloroso de humilhação do protagonista, seja ela física ou emocional.

A todo momento, Bradley está ultrapassando seus limites, seja para salvar a si mesmo ou a vida de sua esposa Lauren (Jennifer Carpenter, “O Exorcismo de Emily Rose”), que corre perigo. O protagonista se transforma e vai perdendo toda a calma e parcimônia presente no início do filme. A tranquilidade dá lugar a tortura e ao abuso de poder, ao passo que a produção se torna mais brutal e cercada de uma carnificina saída diretamente de um filme B. Ao exagerar no gore, a trama de S. Craig Zahler se perde totalmente, sendo perceptível quando um personagem é substituído por um boneco, é aí que a tensão é substituída pelo riso involuntário.

A escolha pela ausência quase total de trilha sonora ajuda a ambientar o “Confronto no Pavilhão 99”. Tendo o presídio como cenário predominante, o silêncio faz parte da vida de Bradley, não sendo necessário a inclusão de música. Amarga e às vezes difícil de olhar, a obra já coloca o americano S. Craig Zahler como um dos cineastas mais autorais e viscerais da atualidade.

Tiago Soares
@rapadura

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