Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 09 de novembro de 2018

Deus Não Está Morto – Uma Luz Na Escuridão (2018): a mística do respeito mútuo

Terceiro longa da franquia aborda a liberdade religiosa como uma batalha egos.

Um renomado teólogo católico, Karl Rahner, afirmou certa vez que “o cristão do século XXI ou será místico ou não será cristão”. A mística cristã, o relacionamento com Deus, tornou-se vítima do racionalismo e é tido como mero sentimento ou emoção. Deus Não Está Morto – Uma Luz na Escuridão apenas molha os pés nessa mística e evita mergulhar fundo, mas toca num assunto polêmico nos dias atuais.

O longa mostra a luta do reverendo Dave (David A. R. White, de “Deus Não Está Morto 2”) para manter sua igreja, Saint James, que fica numa universidade estadual, cujo conselho determinou ser ruim para sua imagem do campus. Tudo acontece após um incêndio destruir a igreja e abalar toda a vida do pastor. Em meio a investigação da causa do evento, o diretor Thomas Ellsworth (Ted McGinley, de “Você Acredita?”) aproveita o acontecido para seguir com o processo a favor da universidade. Assim se inicia a batalha de egos; de um lado, a manutenção de uma história familiar, e do outro, a imagem e expansão de uma universidade.

Apesar do cunho religioso de toda a franquia, neste terceiro filme o diretor Michael Mason não coloca nenhum dos lados como vítima de fato, e mostra os erros e exageros de ambos, evidenciando a comunicação falha como a principal causadora de todo o transtorno. Por falar no cineasta, é o primeiro filme da franquia que Michael dirige (os outros dois tiveram direção de Harold Cronk). Aliás, essa foi a estreia de Michael, e o saldo é positivo. A franquia vinha com ares muito fortes de amadorismo, muito devido às atuações e argumento fracos. Fechando esta trilogia, Mason consegue trazer um cuidado maior como diretor e roteirista, com um bom roteiro e performances convincentes.

Como mencionado, o filme não mergulha na mística cristã, mas isso está longe de ser um demérito. De fato, poderia ter explorado melhor o tema da liberdade religiosa, mas não busca ser transcendente. Apenas deixa para o espectador uma cidade dividida, e as consequências dessa ânsia que as pessoas possuem por estarem sempre com a razão.

Além da luta igreja x universidade, há relações a serem trabalhadas no longa, e essas sim mereciam uma melhor atenção. A relação entre o pastor e seu irmão, Pearce (John Cobertt, de “Para Todos os Garotos que já Amei”), advogado convocado para ajudar Dave no processo, é bem desenvolvida e traz um emocionante ar familiar para a história. O próprio reverendo admite a falta de um irmão em sua vida, e após a perda da igreja – e de uma amizade construída ao longo dos três filmes – se vê obrigado a pedir ajuda ao seu irmão advogado, já há muito distante.

Mas o mesmo não se pode dizer dos outros personagens. Adam Richterson (Mike C. Manning, de “Teen Wolf”), que se envolve no incêndio de Saint James, merecia um cuidado maior, juntamente com sua namorada, Keaton (Samantha Boscarino, de “NCIS”), que inicia o filme promissoramente, como uma menina com a fé questiona, buscando respostas, mas acaba como uma personagem quase que esquecível.

O que mais chama a atenção no longa é finalmente o reverendo Dave ter sua própria história. Nos outros filmes, o personagem servia como apoio para a trama principal, e se tornou uma espécie de protagonista da franquia, mas não da obra em si. Apenas neste terceiro a narrativa de fato gira ao seu redor.

“Deus Não Está Morto – Uma Luz na Escuridão” traz um tema importante a ser discutido, e evidencia como ambos os lados cometem erros grosseiros. Apesar de abordar a religião de maneira rasa, acerta nos sentimentos que envolvem o caso e mostra literalmente que igreja é muito mais do que um terreno e uma construção de tijolos.

João Victor Barros
@jotaerrebarros

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