Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 08 de junho de 2018

Os Estranhos: Caçada Noturna (2018): continuação desperdiçada

Sequência de um bom longa de horror e suspense, o filme abre mão de toda carga dramática do primeiro para apostar no velho e desgastado gênero de assassinos mascarados.

“Os Estranhos”, filme de 2008, era um suspense/terror com a cara dos anos 2000, onde ainda se tateava sobre as novas descobertas e anseios da novíssima geração dos famosos millennials. Assim como seu “filme irmão”, “Violência Gratuita”, ele falava sobre um casal em crise que se instalava fora da cidade para tentar repensar a relação, e acabavam sendo surpreendidos por sádicos que os aterrorizavam durante uma noite inteira. Por termos algum tempo e espaço para conhecer o casal de protagonistas, e por não entendermos em nenhum momento os motivos que levam três jovens bem nascidos – pelo menos é o que sugere o figurino, já que você nunca vê o rosto deles, cobertos sempre por máscaras assustadoras – a levar a cabo um plano tão sanguinário contra quem eles nem conhecem. Já em “Os Estranhos: Caçada Noturna”, continuação lançada 10 anos depois, toda esta atmosfera de dúvida é substituída por um preguiçoso slash movie de quinta categoria, prestando um desserviço à obra original, principalmente quando aborda os jovens de hoje.

Substituindo o casal do primeiro filme, aqui temos uma família em crise. Por razões tão bobas que o roteiro nem se preocupa em explicar, a adolescente da vez será despachada para um internato e os familiares resolvem acompanhá-la na viagem. Como o local é distante, eles decidem passar a noite em um condomínio de chalés que, por ser um período fora de temporada, está deserto. Uma vez instalada, a família é visitada pelo mesmo trio do filme original, que passa a persegui-los e caçá-los de maneira impiedosa.

Mesmo apostando na repetição da trama, o resultado desta continuação é bastante inferior ao longa original, por diversos motivos. O principal deles é a falta de carisma da família protagonista. Não há espaço para conhecê-los ou mesmo para se compadecer de suas agruras. Os pais são extremamente mal explorados, sobrando para um casal de adolescentes chatos – ele bonzinho, ela revoltadinha – segurar mais da metade da duração do filme. Outro fator chave, que anula praticamente todo e qualquer tipo de envolvimento positivo que você possa ter com os personagens, é a extrema burrice com que eles agem em praticamente todas as situações. E nisso, sobra até para os indefectíveis vilões mascarados, que preferem deixar de dar aquela “apunhaladinha” final, para mais pra frente serem surpreendidos pelos mocinhos imortais. O erro de basear todo o andamento de uma trama, quase que somente no comportamento estúpido dos protagonistas, torna-se tão evidente, que não poucas vezes é mais fácil torcer pelo final do filme, do que pelos mocinhos em si!

Não ajuda o fato do diretor Johannes Roberts, que possui apenas três filmes em sua carreira, dentre eles o decente “Medo Profundo”, ainda não ter encontrado uma assinatura própria, ou mesmo um tom. Existem alguns agradáveis lampejos de bom cinema em “Caçada Noturna”, como na excelente cena da piscina, em que a câmera parece testemunhar assustada a violência sofrida, ou mesmo na angustiante cena do pai frente a frente com o assassino dentro do carro, que revela toda a impotência da força diante da alta perversidade. Mas é pouco, pois na maioria do tempo o que se vê é uma estrutura de filmes de terror feitos para a TV, no tempo em que a televisão possuía poucos recursos para tal. Toda a ambientação assustadora perde-se para uma inverosímel corrida em círculos, onde os ratos insistem em passar a todo momento pela “rodinha”, enquanto os gatos parecem usar teletransporte para efetuarem suas caçadas.

Um ponto muitíssimo interessante do longa é a utilização de canções populares dos anos oitenta como trilha sonora para os vilões, por vezes a combinação é mais empolgante que o próprio filme em si. A atração das músicas, com a aversão aos atos praticados pelos antagonistas, criam uma especie de sensação difícil de explicar, algo que hipnotiza. Pena que o roteiro não aproveite melhor estas sensações, preferindo os manjados clichês de terrores ruins. Com direito até a personagens que nunca morrem e infinitos clímax falsos.

Se o intuito do filme de 2008 era, além de agradar em cheio aos ávidos fãs do cinema de terror, levantar o assunto sobre os jovens da época – o que eles querem? O que eles fazem? Por que eles fazem? – não dando obviedade nenhuma nas poucas respostas que imprimia, em “Os Estranhos: Caçada Noturna” esse mote se perde como um jogador viciado em frente a uma máquina caça-níqueis. Quando joga na cara do espectador que a grande heroína da trama é uma adolescente rebelde padrão – qual não é? -, que usa sua “experiência” e, porque não, burrice, para salvar o dia, o longa joga fora toda a sua segunda camada e apela para o velho foge, corre ou morre.

Rogério Montanare
@rmontanare

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