Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Roda Gigante (2017): onde está a originalidade?

Os filmes do Woody Allen se destacam não pela grandeza das cenas, mas pela inteligência dos diálogos. São filmes que repetem alguns elementos para criar obras interessantes com ideias novas. Tudo isso, porém, é deixado de lado neste filme.

Woody Allen (“Café Society”) constantemente se repete em sua filmografia. Isso, entretanto, não significa que ele seja limitado como diretor. Apesar de temas e tramas recorrentes, seus diálogos ágeis são repletos de excelentes argumentos e, por vezes, seus roteiros vão além do que já estamos acostumados – como nos excelentes “Match Point” e “O Sonho de Cassandra”. Contudo, quando menos inspirado, seus filmes soam como lembranças de trabalhos passados, dirigidos com pouca criatividade.

Em “Roda Gigante”, Ginny (Kate Winslet, de “Depois Daquela Montanha”) sonhava em ser atriz, mas acabou trabalhando como garçonete em Coney Island. Seu casamento com Humpty (Jim Belushi, da série “Twin Peaks”) é desestimulante para ela, que supre a carência sexual com o salva-vidas Mickey (Justin Timberlake, de “Trolls”). Este por sua vez sonha em se tornar dramaturgo e acaba se apaixonando por Carolina (Juno Temple, de “A Mulher Mais Odiada dos Estados Unidos”), filha de Humpty, que está fugindo do marido mafioso.

Diferente de outros grandes diretores com assinatura narrativa, Woody Allen aqui não cita a si mesmo ou faz referência à própria obra. O que vemos é uma cópia pouco rebuscada de filmes que tornaram o diretor uma referência no meio cinematográfico. Sobretudo, o filme mais parece um rascunho finalizado às pressas e sem muito esmero. O triângulo amoroso (que aqui se divide em dois) é uma desculpa mal aproveitada para impulsionar Ginny e suas camadas são expostas gradualmente, ora quando se vê traindo, ora quando se vê traída. Mas o roteiro pouco consegue extrair do que é apresentado, o que torna a trama pouco interessante, algo que pode ser sentido principalmente durante o clímax do filme.

Com a história flácida, resta à Kate Winslet brilhar com seu talento. Seu monólogo final é inspirante, mais pela atuação do que pelo texto em si. Há uma certa limitação imposta pelo roteiro, algo que Winslet consegue contornar (até onde lhe é permitido) com maestria e elegância. Suas angústias são tão nítidas e evidentes em sua fala, que causam empatia ao público. A cena ainda ganha destaque pela forma como foi rodada. Se ao longo do filme os planos sequências são cansativos e desnecessários, aqui eles servem à narrativa, uma vez que fica clara a intenção de Allen em transformar todo esse momento numa peça de teatro (o que reforça a metalinguagem da obra).

Há ainda um brilho de criatividade na forma como o diretor de fotografia Vittorio Storaro consegue colocar, na mesma cena, ambientes diferentes com iluminações diferentes (a cena em que Ginny espera seu filho na psicóloga é particularmente bela), para mostrar a diferença de tensão entre os espaços. Storaro também usa a iluminação a favor da narrativa, como por exemplo em sequências cuja luz muda do vermelho para o branco e então para o azul, conforme o personagem que está falando ou que entra em cena.

“Roda Gigante” consegue, ao mesmo tempo, ser um filme pouco criativo e limitado, com breves momentos interessantes. Trata-se de uma obra fraca e repetitiva, que é montada apenas com a bagagem que Woody Allen construiu ao longo de décadas como realizador. Bagagem esta que está sempre sendo reaproveitada em suas obras e dando origem à coisas novas, mas que aqui não acrescenta e nem entrega algo diferente do que já foi feito no passado. 

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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