Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 20 de dezembro de 2015

Pegando Fogo (2015): soluções simplistas desperdiçam drama com potencial

Bradley Cooper protagoniza drama com potencial sobre personagem complexo, mas que acaba se autossabotando pela covardia do roteiro em apostar em soluções fáceis.

Bradley Cooper é umpegandofogo dos principais nomes de Hollywood nos últimos anos. Desde que foi projetado ao estrelato no primeiro filme da franquia “Se Beber, Não Case”, o ator protagonizou outros bons trabalhos e alcançou o ápice da sua carreira (até então) com uma indicação ao Oscar, no ano passado, por sua atuação no ótimo “O Lado Bom da Vida”. Atualmente, todos os projetos que envolvem seu nome no meio exalam uma certa credibilidade, e adquirem, com merecimento, um voto de confiança por parte do público em geral. Neste “Pegando Fogo” não é diferente, o que, no caso, acaba não sendo uma coisa muito interessante.

Aqui, acompanhamos a jornada de Adam Jones (Cooper), um ótimo chef de cozinha que acaba tendo sua carreira prejudicada pelo estilo de vida que leva(va) e por supostos erros cometidos no passado. Para recuperar o prestígio e ganhar a tal sonhada terceira estrela em um famoso guia da culinária mundial, ele monta uma equipe de antigos amigos e cozinheiros de alto nível em um investimento vindo do amigo Tony (Daniel Brühl). No meio do caminho, claro, antigos “fantasmas” de seu passado vão lhe atormentar, enquanto sua personalidade forte e ríspida não o ajuda dentro da cozinha.

O ponto mais interessante do longa é o fato de que a culinária nada mais é do que um pano de fundo para que possamos acompanhar a história de vida deste homem errante e complexo. O Adam Jones de Cooper é daqueles personagens sinistros capaz de atos tão doces e humildes, quanto atitudes canalhas, o que confere a ele sempre um ar de instabilidade, deixando dúvidas para o espectador sobre qual personalidade irá prevalecer em cada cena, e o astro hollywoodiano, com a competência habitual, consegue transmitir essas diversas facetas com simplicidade e eficiência.

Por outro lado, a sua narração no começo da projeção, explicando praticamente tudo o que devíamos saber sobre o seu passado, com a finalidade nos fazer entender dilemas do presente, acaba soando artificial, rasteira e apressada (ela não volta a aparecer em nenhum outro momento, o que só escancara sua fragilidade), na medida em que todos aqueles temas serão retomados no decorrer da trama e deveriam ser melhor trabalhados pelo roteiro.

Roteiro este que, escrito por Steven Knight e Michael Kalesniko, ainda que consiga evocar toda a complexidade já citada de seu protagonista (o que é bastante alavancado pelo talento de Cooper), prefere apostar em soluções fáceis aos relacionamentos propostos ao longo de todo o enredo, o que sabota parte de suas ambições em ser mais do que apenas um feel good movie de um chef de cozinha em um momento difícil querendo recuperar o seu prestígio. O diretor John Wells, cujo último trabalho foi justamente sobre essa temática de relacionamentos conturbados e indivíduos falhos (“Álbum de Família“), pouco pode fazer com tal script simplista.

Assim, o que temos como resultado final nada mais é do que um filme que se entrega aos clichês que tanto parecia querer se distanciar durante boa parte da projeção. Vale pela primeira metade, onde um bom estudo de personagem é desenvolvido, mas do fim do segundo ato em diante, a covardia do roteiro quase põe tudo a perder, desperdiçando uma ótima oportunidade de alçar voos mais altos.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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