Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 02 de março de 2015

Superpai (2014): talvez o pior filme nacional desde a retomada

Forte candidato a pior filme do ano, da década, do século...

Certa vez, o jornalista Diogo Mainardi disse que uma parte do dinheiro da Ancine (Agência Nacional de Cinema) era desviado e outra parte tinha um destino muito pior, virava filme. Claro que se trata de um exagero, mas, em alguns casos, seria realmente melhor que essa verba não chegasse às mãos e bolsos de alguns realizadores. E como, infelizmente, isso acontece muitas vezes, somos golpeados com coisas como esse “Superpai”, produção dirigida por Pedro Amorim (pelo menos ele é creditado assim).

O longa conta a história de Diogo Miranda (Danton Melo), que, para participar da festa de reunião de vinte anos de formatura da turma do colégio precisa encontrar alguém para cuidar de seu filho durante a noite. Enquanto sua esposa Mariana (Monica Iozzi) precisa levar a mãe ao hospital, Diogo decide encontrar os amigos Júlia (Dani Calabresa), César (Antônio Tabet), e Nando (Thogun Teixeira) e reencontrar uma “chance perdida” dos tempos de colégio. Porém tudo começa a dar errado quando Diogo busca a criança errada (!) na creche noturna. A partir daí, dezenas de absurdos se acumulam até o final da projeção.

E como, mesmo se tratando de apenas noventa minutos (tamanho padrão das “comédias” do tipo), esse final demora a chegar! Até lá, temos que ver a ex-panicat Nicole Bahls sendo mais objetificada do que em dias normais, uma avalanche de palavrões exagerados e pessoas tentando fazer sexo diante de crianças. E isso não é o pior que acontece na trama. Ou melhor, no decorrer do filme, já que chamar o que acontece de nossos olhos de “trama” é um elogio diante de tantas aberrações.

Não bastasse a incrível sucessão de clichês (como alergia a amendoim que deixa o doente completamente deformado, um homem negro, grande e forte que, na verdade, é gay, pessoas completamente inebriadas pelo uso de um ou dois anti-inflamatórios, uma criança encontrando acidentalmente o consolo da mãe e outras abobrinhas do tipo), ainda somos alvejados por diálogos sofríveis, interpretações igualmente lamentáveis e um desenvolvimento de personagens nulo. Até mesmo a trilha sonora, ou melhor, as três canções utilizadas são completamente inadequadas. Pelo menos no intuito de ilustrar a juventude do grupo principal, uma vez que foram lançadas quase uma década antes da festa de formatura. O único acerto, que parece involuntário dada a profusão de equívocos, é a escolha de uma determinada música dos Titãs, cujo adjetivo poderia muito bem ser utilizado para (des)qualificar o grupo de amigos.

O roteiro parece incapaz de produzir algo minimamente criativo. Em vez disso, passa a repetir palavras aleatórias na tentativa de gerar um novo bordão, fazendo com que o protagonista repita “Ah m…” mais de cinquenta vezes. Da mesma forma, somos lembrados algumas dezenas de vezes que algo extremamente importante ocorreu “a mais de vinte anos”. Mas não apenas os roteiristas realizam um péssimo trabalho. Estes são acompanhados pela equipe de fotografia, de montagem, design de produção e, principalmente, pelo diretor.

Igualmente difícil é entender como profissionais relativamente bem sucedidos, como Danton Mello, AntonioTabet e Dani Calabresa se submeteram a uma provação desse nível. Se já não fosse suficientemente deplorável ver a personagem de Dani Calabresa ser chamada de “vadia”, e outros sinônimos mais baixos, e apalpada constantemente por Antônio Tabet, que em contrapartida é sodomizado por ela, ainda temos que ver Danton Mello verificando uma área específica de sua anatomia e, para coroar o festival de sandices, realizar sua, digamos, higiene íntima, em um cabine do banheiro de um posto de gasolina.

Porém, nada mais complexo de entender do que a escolha do título da obra, parecendo mais um erro de adaptação de comédias americanas do que uma escolha consciente de seus realizadores. Afinal, como entender que seja chamado de superpai um sujeito desprezível como Diogo? Alguém capaz de deixar o filho de seis anos de idade sozinho em casa para ir jogar pôquer com os vigias da rua, tenta fazer sexo com a esposa ao lado do infante na mesma cama, deixa esse mesmo filho em uma creche noturna desconhecida para ir a uma festa com o único intuito de trair a esposa com alguém que ele não vê (como ele insiste em dizer) a mais de vinte anos? Nunca achei que isso iria acontecer, mas sim, estamos diante de uma produção cinematográfica pior que quaisquer Crepúsculos, Transformers, Lenadros Hassums, Adam Sandlers e Rob Schneiders…

David Arrais
@davidarrais

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