Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 07 de outubro de 2013

Metallica – Through The Never (2013): filme intercala show e revolta urbana

A bizarra, violenta e desnecessária história de um roadie se reveza na tela com um ótimo show de uma banda no auge de suas capacidades musicais, sendo a performance do grupo o que faz valer a experiência como um todo.

metallica_through_the_neverUma experiência estranha. Assim pode ser descrito este “Metallica – Through The Never”, novo longa-metragem da banda de metal americana capitaneada por James Hetfield e Lars Ulrich. Ao contrário do documentário “Some Kind of Monster”, esta nova empreitada, dirigida e coescrita pelo cineasta Nimród Antal (“Temos Vagas”, “Predadores”) é um musical. Mais ou menos.

Na verdade, a melhor descrição para essa empreitada seria “um videoclipe de 90 minutos”. Ao contrário do que aconteceu em obras como “The Wall” ou “Purple Rain”, a música não faz parte exatamente da jornada do protagonista da história nem é declaradamente um recurso narrativo para a história. Na verdade, o show do Metallica ocorre paralelamente às desventuras surreais que surgem na tela.

A trama mostra o jovem roadie Trip (Dean DeHaan) recebendo a incumbência de ir buscar uma encomenda para a banda durante o mais recente show da turnê. O problema é que uma revolta explode na cidade justamente neste momento, com o rapaz no meio da confusão. Mas a jornada acaba se tornando mais bizarra quando Trip começa a ser perseguido por um misterioso cavaleiro.

Como na maioria dos videoclipes conceituais (coisa rara hoje em dia, aliás), o herói é basicamente mudo. Portanto, Dean DeHaan conta apenas com seu expressivo rosto para compor o seu Trip, se saindo até bem nesta inglória tarefa. Além do fato de ser um fã do Metallica e andar pra cima e pra baixo com seu “puppet” da sorte, a única coisa que aprendemos sobre ele no decorrer da história é o fato de que aguenta levar pancadas. Muitas.

Esse fiapo de roteiro só serve de desculpa para Antal brincar com imagens que parecem ter saído de um pesadelo urbano, em imagens muito bem produzidas e coreografadas de revoltas que lembram uma versão mais distópica e violenta dos protestos que acometeram o Brasil em 2013.

Até mesmo as ligações das imagens com as letras das músicas do Metallica são deveras tênues, com apenas “Master of Puppets” ganhando uma importância mais acentuada dentro da narrativa. Mesmo a banda só participa da mise en scène no último ato da projeção e de maneira extremamente leve – o que faz sentido, afinal eles são músicos profissionais, não atores.

O prato principal do filme é mesmo o show do Metallica. E a banda não decepciona. Ali estão quatro músicos no auge de suas formas, especialmente James Hetfield, cuja presença e domínio do público impressionam. O próprio palco foi montado de maneira inteligentíssima, dando plena liberdade de movimentação para as câmeras e para os músicos que, com exceção óbvia do baterista Lars Ulrich, simplesmente não ficam parados.

Realizador visualmente ambicioso, Antal e seu diretor de fotografia habitual, Gyula Pados, não desperdiçam essa estrutura, aproveitando todo e qualquer espaço para retratar a banda dos ângulos mais icônicos possíveis, especialmente com a ajuda do 3D. Os efeitos práticos no palco são muito bem utilizados, com menção especial para as demolidoras performances na já citada “Master of Puppets” e em “…And Justice For All”.

O Metallica sempre foi muito ligado ao cinema (não é por acaso que “The Ecstasy of Gold”, do mestre Ennio Morricone, abre os shows da banda) e esta produção foi uma forma de estreitar esses laços. Enquanto a jornada do protagonista acaba pouco importando no final, até por conta dos contornos excessivamente oníricos que ela toma, a experiência vale por conta de um show competente e extremamente bem elaborado de uma das melhores bandas de metal em atividade. A única coisa que sentimos pelo roadie é pena por ele ter perdido o restante do espetáculo.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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