Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 30 de abril de 2013

E se Vivêssemos Todos Juntos? (2011): a velhice na França tratada com leveza

Diretor e roteirista Stéphane Robelin problematiza, sexualiza e torna divertido o sutil mundo de idosos que exibe nesta agradável dramédia.

E se Vivêssemos Todos JuntosSe Michael Haneke, com seu “Amor”, mostra de forma crua e cruel a velhice na França, em que um casal de idosos sofre suas dores isoladamente (e literalmente) em um enorme e vazio apartamento, Stéphane Robelin traz uma história bem mais leve sobre a mesma temática. Mas não espere idealizações. “E Se Vivêssemos Todos Juntos?” tem apenas um ponto de vista menos dramático e profundo, mas quase tão desesperançoso quanto. A diferença está no fato de que seus personagens preservam entre eles uma relação longínqua e de confiança baseada na lealdade, de nome “amizade”.

É graças a ela que cinco idosos, quase todos no mínimo septuagenários (se verificarmos as idades dos atores) decidem dividir o mesmo teto. A decisão é tomada depois que Claude (Claude Blanchard) sofre um acidente e precisa passar um tempo, por ordem do filho, em um triste e melancólico asilo. Uma visita rotineira dos amigos, então, vira uma fuga. E todos partem para a casa de Jean (Guy Bedos) e Annie (Geraldine Chaplin). Jeanne (Jane Fonda) e Albert (Pierre Richard) complementam o “time”. Juntos eles vão ter de enfrentar seus problemas de saúde, que não são poucos, suas limitações físicas e suas antigas e novas “birras”. Mas também vão repartir momentos de puro companheirismo.

Contextualizado em uma França atual, economicamente instável, o filme já faz questão de ressaltar, em uma única cena, a vitalidade de alguns de seus personagens e o preconceito dos jovens (advindo até da própria família) para com eles. Liderando um protesto, que chega ao ponto de segurar e bradar em um megafone, Jean é ignorado pelos policiais quando o movimento de repressão da mobilização tem início. É deixado de lado. Nem mesmo jogar um garrafa de vidro em um agente o faz ser preso. Ele quer ser visto, mas não consegue. Ao lado da rua, seus amigos tentam contê-lo, ao mesmo tempo que não escondem as gargalhadas. E dessa forma, “E se Vivêssemos Todos Juntos?” funciona, unindo seriedade com leveza em uma harmonia invejável que conquista facilmente o público.

O objetivo de Stéphane Robelin, que dirige e escreve a película, não é que sintamos pena ou remorso pelo estado de seus personagens. Trata-se muito mais de um registro documental, um alerta nada explícito ou didático sobre uma situação inevitável, pela qual todos nós, se tivermos sorte, teremos de passar. Por isso mesmo, o roteiro faz da maioria de seus personagens pessoas ativas, que ainda buscam prazer com prostitutas ou cuidam da casa com destreza jovial. E mesmo quando a saúde não coopera, como no caso de Albert, que sofre do Mal de Alzheimer, vem o humor, advindo das próprias situações embaraçosas causadas pela doença, para amenizar o clima.

Quando se reúnem, então, não faltam motivos para risos, mesmo que seja após uma pequena e habitual discussão. Logo, a ideia de viverem no mesmo lar jamais soa absurda, apesar de demorar muito para ser executada pelo roteiro. Robelin também faz questão de revelar uma essência crua do quinteto. Se alguns são mais amorosos do que outros, o mesmo acontece com o preconceito,  demonstrado explicitamente em cena em que expressam não gostar dos árabes que invadem seu país. A sexualidade também é introduzida sem medos, seja por meio de uma bonita sequência de sexo (em que é possível até confundi-los com jovens) ou por um bate-papo revelador.

A conversa, por sinal, é consequência da introdução do mais jovem personagem desta história, o etnólogo Dirk (Daniel Bruhl). De pretenso cuidador de cachorro, querendo apenas complementar sua bolsa de estudo, ele vira um pesquisador em contato direto com o objeto de sua tese. Dessa forma, o público, por diversas vezes, assume sua posição, sendo muitas vezes surpreendido, seja pela falta de pudor, seja pelos problemas que as limitações e enfermidades dos cinco amigos vêm a causar. Adentrar a intimidade de Dirk, e saber de seus problemas afetivos, logo, é um erro que o roteiro persiste em exibir.

Revelações e casos passados, que quase transformam essa história em um conto cômico de amor e traição, é outro tropeço do filme. Felizmente o elenco faz tudo ser amenizado por meio de performances mais do que carismáticas. Ver Jane Fonda atuando em francês, então, é uma grata surpresa. Ao lado dela, Geraldine Chaplin, Guy Bedos, Pierre Richard e Claude Blanchard tornam “E se Vivêssemos Todos Juntos?” um conto divertido e comovente sobre cinco amigos de idade avançada que souberam enfrentar  os males da saúde e da sociedade com uma dose extra de companheirismo. E tudo não poderia ser melhor representado pela metáfora da piscina que constroem.

Darlano Didimo
@rapadura

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