Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Bravura Indômita

Revivendo um gênero que parece adormecido, os Irmãos Coen realizam este remake com a competência que se tornou a marca registrada da sua filmografia.

Há pouco mais de trinta anos (talvez menos), os westerns tomaram conta das produções de Hollywood. Um pouco antes disso, nomes como John Wayne, Claudia Cardinale, Sergio Leone, Clint Eastwood, Robert Redford e tantos outros contribuíram para que estas produções marcassem uma geração e parte de uma fase do cinema contemporâneo. Mas, de uns tempos para cá, pouco se faz filme deste gênero. Talvez porque não existam mais heróis como aqueles de antigamente, que foram transformados em ícones pela indústria cinematográfica e pelo público com o passar dos anos. Então, eis que surgem os irmãos Coen com mais um projeto e lançam “Bravura Indômita”, um remake do filme de mesmo título lançado em 1969 tendo John Wayne no papel de Jeff Bridges, e Kim Darby vivendo a personagem de Hailee Steinfeld.

A história se passa em 1878 e narra a aventura de Mattie Ross, uma menina de 14 anos que chega a Fort Smith, no estado do Arkansas, em busca do homem que matou o seu pai. Conhecido como Tom Chaney, ele assassinou o pai da garota por duas barras de ouro e fugiu para o interior das terras indígenas. Para conseguir vingança e vê-lo enforcado, Mattie procura o “Marshall” mais destemido e bravo da região. É assim que ela conhece Rooster Cagburn, um beberrão de um olho só considerado o xerife mais cruel da cidade. Mesmo com algumas objeções, ele resolve aceitar o acordo para conseguir achar Tom Chaney e vingar a morte do pai da garota. No meio do caminho, eles conhecem o Texas Ranger LaBouef, que também os acompanha nesta jornada.

Mattie é uma menina que, apesar de pouca idade, sabe exatamente o que quer. Ela consegue intimidar qualquer um com os seus argumentos e está decidida sobre o seu plano de vingança para a morte do pai. Sem contar muito com a mãe e tendo que viver de forma independente – ainda mais agora com a morte do pai –, ela não poupa esforços para conseguir o que quer. E isso fica claro na cena em que ela está negociando uma quantia em dinheiro com um senhor que vendeu alguns pôneis para o pai dela. Para conseguir o dinheiro que queria, ela vai até o final do contrato colocando cláusulas que lhe fosse boas para si mesma. Desta forma, ela financia a sua busca, contrata Cogburn e ambos partem para encontrar Tom Chaney em um caminho, claro, cheio de hostilidade.

Como característica dos irmãos Coen, eles conseguem preencher o filme com excelentes diálogos. Aliás, existe um elo de ligação entre “Bravura Indômita” e “Onde os Fracos Não Têm Vez”, filme dos Coen que levou a estatueta no Oscar de 2007. Neste filme, Javier Bardem interpreta um caçador de recompensas que vai atrás de Josh Brolin, que está com o tesouro o qual Bardem procura. Na história, Anton Chigurh, o personagem de Bardem, é a personificação da violência que acaba resistindo ao final, mesmo com as pessoas tentando combatê-la. Uma metáfora impressionante para um filme incrível. Já em “Bravura Indômita”, os irmãos Coen colocam em pauta os sentimentos de vingança que moviam as pessoas naquela época em que os Estados Unidos ainda estavam se construindo e os territórios sendo divididos.

A partir disso, enquanto Mattie procura alguém com coragem, ela acha a pessoa certa que é Cogburn, uma pessoa que tem o distintivo da Lei, mas que age completamente fora dos padrões estabelecidos por ela. E tanto Cogburn quanto LaBeuf perseguem Chaney com propósitos diferentes. O primeiro está ali pelo dinheiro e o contrato que fez com a garota. Já LaBeuf quer levar o fugitivo vivo para o Texas onde oferecem uma boa recompensa por ele. Os fratelli Coen desenvolvem isso muito bem, como é um costume dos roteiros que eles escrevem juntos. Porém, durante grande parte do filme, é como se fosse perceptível que a história não avança. “Bravura Indômita” se torna  burocrático neste sentido porque mostra a perseguição a Tom Chaney, mas acaba demorando demais para que eles se encontrem. E quando isso acontece, o impacto e a surpresa já não são mais interessantes, pois fica o sentimento de que algo mais poderia ser tirado desta trama.

Por outro lado, o elenco atua com muita harmonia. A estreante Hailee Stainfeld está incrível no filme, que é uma narração da sua personagem mais velha revivendo aquelas memórias de quando tinha 14 anos. Os Coen exploram o mundo brutal, visceral e hostil no qual estes personagens estão inseridos. E eles correspondem ao colocarem para fora a coragem que precisam para enfrentar o perigo. Jeff Bridges, em uma atuação que lembra o seu “The Dude” do filme “O Grande Lebowski” (1998), também dirigido pelos irmãos Coen, tem uma atuação interessante, mas muito semelhante com este personagem citado. Matt Damon também está bem no filme, mas ele não faz nada de excepcional. Assim como Josh Brolin, que somente aparece em duas ou três sequências e pouco consegue fazer com o seu personagem.

Já a fotografia de Roger Deakins mais uma vez enche os olhos de quem assiste. Assim como fez em “Onde os Fracos Não Têm Vez”, ele adota novamente os tons amarelados, mas sem optar por planos abertos como fizeram os Coen neste filme. Em “Bravura Indômita”, Deakins deixa mais à vista o estilo do clima e o ambiente hostil, bucólico e o “nada” que fazem parte dos cenários. A mesma criatividade e inventividade de Deakins não acontece com a trilha sonora de Carter Burwell, que até cria canções que parecem próprias do gênero mas de pouco destaque dentro da narrativa do filme.

“Bravura Indômita” tem um excelente elenco, uma ótima direção dos irmãos Coen e uma bela fotografia de Roger Deakins, mas a todo momento ele passa a impressão de estar congelado naquela trama de perseguição que nunca avança. E isso acaba desgastando o filme, pois não existe nenhuma outra trama que possa equilibrar a história. Ainda assim, o longa não deixa de ter o toque de ousadia dos irmãos Coen ao fazerem um remake de um gênero que parece perdido no “meio do nada” – exatamente como estes personagens estão quando partem para o violento e hostil território indígena para matarem Tom Chaney. Ele precisa pagar pelos crimes que cometeu. Naqueles tempos, era assim que as pessoas costumavam fazer negócios.

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Vinícius Silva é crítico do CCR desde 2010. Graduado em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pelo Centro Universitário Jorge Amado, em Salvador, foi repórter durante dois anos do Jornal Correio e faz do cinema uma parte integrante da sua vida.”

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