Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 13 de fevereiro de 2010

O Lobisomem

O longa acerta ao construir um lobo mais ‘humano’, mas escorrega ao apressar a revelação dos segredos.

O LobisomemSeguindo a corrente de filmes fantásticos lançados e que ainda vão chegar aos cinemas brasileiros no início deste ano, está em cartaz “O Lobisomem”, o ousado remake do diretor Joe Johnston para o clássico que assustou plateias do mundo inteiro em meados de 1941.

Ao lado de vampiros castos, criaturas de coloração azulada e jovens ladrões de raios, o lobisomem de Johnston pode ser encaixado no rol dos seres fantásticos dos últimos lançamentos do cinema, mas o tratamento que o diretor conferiu ao filme garante à trama uma maturidade não presente nas outras produções do gênero. A carga emocional que permeia a narrativa consegue colocar o canino raivoso em um patamar superior aos seus colegas míticos, e a intensidade de suas sensações foi bem trabalhada nesta adaptação.

A história é  a mesma da produção original. Na Inglaterra Vitoriana, o ator de teatro Lawrence Talbot (Benicio Del Toro) retorna à cidade em que nasceu para tentar solucionar o mistério que ronda a morte do seu irmão. Ao reencontrar seu pai (Anthony Hopkins), percebe que suas vidas estão diretamente ligadas às circunstâncias do crime, e que seu irmão pode ter sido apenas uma das vítimas de uma verdade que não tarda a ser revelada.

O que garante destaque e diferencia o personagem do que seria previamente imaginado pelo público é a relação familiar desenvolvida na trama. Todos os acontecimentos carregam um peso que ultrapassa gerações e nada pode ser explicado antes que laços sejam restabelecidos e verdades domésticas sejam reveladas. Todo o terror anunciado pelos trailers divulgados se transforma em drama cotidiano, absolutamente comum aos mortais que não sofrem alterações ao luar.

A opção do roteirista Andy Walker (“A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça”) foi sábia por contextualizar a licantropia junto ao seio familiar, garantindo embasamento e excluindo uma possível superficialidade da trama. Sua falha reside no lapso temporal existente entre o início e o final da produção, que torna as ações e relações um tanto descompensadas, ou ainda injustificadas. A agilidade na descoberta dos fatos e na apresentação ao público de tudo o que ainda estava escondido é exagerada e incômoda.

Emily Blunt, ao lado de Del Toro e Hopkins, formam o elenco de estrelas de “O Lobisomem”, com interpretações seguras, embora um tanto contidas, como se estivessem guardando o melhor para um segundo ato que não existe. Hugo Weaving, no papel do detetive que investiga as mortes, é o ator que merece destaque por oferecer uma atuação mais vivaz e bem definida.

O maior mérito de “O Lobisomem” reside no que diz respeito ao trabalho dos envolvidos na produção e direção de arte. O vilarejo em que se desenvolve a narrativa foi perfeitamente trabalhado e as sequências de perseguição realizadas entre as árvores da floresta assustadoramente monocromática revelam um empenho dos profissionais de arte que merece ser citado. O clima sombrio foi construído de forma equilibrada: não parece falso, mas também não alcança os exageros estéticos de Tim Burton.

A fotografia cinzenta também é responsável pelo equilíbrio estético do filme e ajuda na construção dos dramas vividos pelos personagens. Ela parece reafirmar o sentimento de solidão e desamparo que cada um vivencia, colocando cada pessoa em uma posição de possível vítima do monstro.

“O Lobisomem” é falho no ponto em que deveria ter acertado. Ter incluído um drama familiar em uma narrativa fantasiosa foi uma escolha inteligente do roteirista, que conseguiu humanizar o personagem e oferecer uma explicação plausível para seus atos. Agilizar tal explicação e atropelar as revelações em prol da construção dos sentimentos do personagem, porém, não foi uma opção sensata. Para aqueles que prezam pelo equilíbrio entre fantasia e realidade, e que esperam por conforto estético e uma pitada de originalidade, o filme é uma boa pedida.

Jader Santana
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