Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 30 de setembro de 2008

Controle Absoluto

Divertido, embora muito falho, "Controle Absoluto" entretém durante suas duas horas e só, não sendo um filme lá muito marcante para o público, mas ainda assim possui um tema alarmante.

O Ato Patriótico e outras diversas leis que o governo dos EUA colocou em ação nos últimos anos para vigiar o seu povo têm deixado os americanos cada vez mais paranóicos. No entanto, assustadoramente, uma boa parcela da população de lá vê isto como um sacrifício necessário, afinal "o preço da liberdade é a eterna vigilância". Não tardou para que Hollywood resolvesse abordar esse tema. Depois deste aparecer de relance em "Batman – O Cavaleiro das Trevas", é a vez da vigilância eletrônica tomar conta completamente de um filme com este "Controle Absoluto".

O filme começa com uma tensa seqüência no Pentágono, onde vários militares altamente graduados discutem se bombardeiam ou não uma área onde provavelmente se esconde um procurado terrorista. Apesar de o computador central desaconselhar a ação e dos protestos do Secretário de Defesa (Michael Chiklis, da série de TV "The Shield"), o Presidente dos EUA dá o OK para a ação, algo que terá conseqüências trágicas para o seu país.

Passam-se alguns meses na história e somos apresentados aos dois protagonistas do filme. O primeiro é Jerry Shawn (Shia LaBeouf), um jovem que abandonou a faculdade e trabalha em uma copiadora, não tendo muitas perspectivas de vida nem muito dinheiro em sua conta-corrente. Do outro lado temos Rachel (Michelle Monaghan), uma assistente em uma firma de advocacia que tem de lidar com seu ex-marido relapso enquanto cuida do seu filho, Sam.

Jerry acabou de enterrar seu irmão gêmeo, morto em um acidente de trânsito. Após mais uma briga com seu pai, ele volta para casa para encontrar 700 mil dólares depositados em sua conta e um caminhão em armamentos e explosivos deixados lá. Ao receber uma estranha ligação de uma mulher que o manda fugir e cumprir com suas exigências, Jerry é rapidamente preso pelo FBI, acusado de traição e terrorismo. Rachel, por sua vez, também recebe uma ligação, com a mesma voz ameaçando matar o seu filho, caso ela não faça o que for ordenado.

Após uma fuga impossível do prédio do FBI, Jerry e Rachel são obrigados a cumprir as insanas determinações de sua coatora, enquanto são caçados de maneira implacável pelo agente federal Thomas Morgan (Billy Bob Thornton) e pela militar Perez (Rosario Dawson). Enquanto isso, todos os envolvidos nesta intricada rede vão descobrindo, aos poucos, que suas ações estão sendo controladas por alguém em uma elaborada conspiração.

O maior problema de um escritor ao trabalhar com um personagem impossivelmente inteligente é ter de arrumar um jeito das ações deste não terem um pingo da estupidez mortal. Pouquíssimos cineastas e autores conseguiram fazer isso com perfeição. E quando temos quatro escritores de blockbusters hollywoodianos bastante falíveis trabalhando em um projeto desses, é batata aparecerem furos de roteiro que levam por terra a credibilidade do esquema do conspirador, que acaba tendo a profundidade de um plano infalível do Cebolinha. E é isto o que acontece neste "Controle Absoluto".

No entanto, dependendo do diretor, tais pequenos e importantes detalhes podem ser relevados em nome da diversão, caso o cineasta tome o cuidado de inserir, nos momentos certos, cenas de ação alucinantes que anestesiem o espectador da fragilidade da trama, sempre com o auxílio de atores carismáticos para que o público se importe com o destino de seus personagens. Michael Bay é um mestre em fazer isso (vide filmes como "Armageddon", "A Rocha" e "Bad Boys"). Mas, apesar de parecer, "Controle Absoluto" não é um filme dirigido por Bay, mas por D.J. Caruso, especialista no bom e velho feijão-com-arroz, mas que não se sai mal ao fazer um churrascão gorduroso bem ao estilo do seu colega.

Caruso cria vários planos visualmente emocionantes em suas cenas de ação, mas falta-lhe a pegada para tornar tais seqüências mais perigosas e menos confusas. Em "A Rocha", Bay fez uma perseguição automobilística bastante parecida com uma que ocorre em dado momento em "Controle Absoluto", mas na qual o espectador realmente ficava grudado na tela e tenso com o que iria acontecer com os personagens, já que víamos os carros dos protagonistas se desgastando (embora continuassem em frente). Aqui, parece que os personagens principais estão em um jogo com modo de invencibilidade, já que parece impossível para seus perseguidores ao menos arranhar seus carros ou para os próprios protagonistas – apenas pessoas comuns – se machucarem de maneira mais séria.

A mentirada toda acaba sendo compensada pelo elenco, que está muito bem em cena. Shia LaBeouf e Michelle Monaghan seguram as pontas vivendo Jerry e Rachel de maneira convincente, com os dois sendo muito bem explorados pelo diretor. O carismático LaBeouf concede credibilidade ao drama pessoal de Jerry e seu afastamento da sua família. Já Monaghan, por sua vez, está muito longe de ser apenas mais um rostinho bonito, possuindo presença de cena e se mostrando bastante segura no papel de uma mãe desesperada para rever o seu filho.

Billy Bob Thornton vive um velho papel, pois figuras de autoridade parecem ser uma das especialidades do ator, fazendo muito bem seu serviço como o agente Thomas Morgan. Quem surge um pouquinho fora de seu ambiente natural é Rosario Dawson como a militar Zoe Perez. A despeito de seu perfil de durona, algo não soou certo em sua atuação aqui, parecendo que ela estava um tanto apagada.

Por sua vez, Michael Chiklis marca presença em sua curta participação como o sensato Secretário de Defesa Callister, sendo uma pena que não apareça muito mais. Já a voz da mulher misteriosa ficou por conta da (quase) sempre ótima Julianne Moore, que com seu tom característico, confere respeitabilidade à fria "vilã" da fita, embora a personagem acabe soando excessivamente absurda no último ato da projeção.

A edição da fita segue o padrão dos filmes de ação atual, tendo algo da trilogia "Bourne" com uma pitada dos longas de Michael Bay. No entanto, o editor Jim Page conseguiu evitar com que a fita ficasse excessivamente confusa nas cenas mais movimentadas (à exceção da perseguição automobilística anteriormente citada). Na direção de fotografia, o polonês Dariusz Wolski se sai muito bem, embora uma determinada cena tenha ficado com uma parte absurdamente branca, que chegou a incomodar mesmo. No entanto, sua iluminação e cores na câmara Aria e na cena do túnel compensa tal deslize de longe. Já a trilha sonora de Brian Tyler nem fede nem cheira, mas ao menos fica longe daquela composta por ele para os terríveis "Perigo em Bangkok" e "Aliens Versus Predador 2".

Embora tenha suas várias e diversas falhas, "Controle Absoluto" não é um filme ruim, garantindo suas duas horas de diversão inofensiva, embora não seja uma produção marcante de maneira alguma.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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