Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 17 de março de 2013

Linha de Ação (2013): neonoir escreve errado por linhas retas

Allen Hughes e Brian Tucker emulam o noir em um filme de dualidades.

Linha de AçãoEm “Linha de Ação” (“Broken City”) temos – como propõe o título original – uma Nova York  falida. A herança recente do crack da bolsa em 2008 sugere um universo repleto de personagens dúbios onde a aparência é o que vale; contudo, na tentativa de emular os chavões do film noir, o roteiro de Brian Tucker cai no fatalismo maniqueísta e esquece-se de camuflar a linha tênue que separa o bem e o mal.

Estrelado por Mark Wahlberg e Russell Crowe, o longa dirigido por Allen Hughes tem como personagem central o detetive particular Billy Taggart, ex-policial forçado a largar o distintivo após se envolver no controverso homicídio de um jovem rapaz imigrante. Depois de sete anos de trabalho com espionagem de adultério, Taggart se envolve em mais um caso trivial, mas de extremo apelo financeiro (cuja recompensa é sedutores US$ 50 mil): investigar e provar o pretenso affair que a esposa (Catherine Zeta-Jones) do prefeito (Crowe) estaria tendo.

Antes de tudo, um trabalho é só um trabalho. A lógica do detetive noir é pré-determinada por contingentes externos, como o dinheiro, por exemplo, para descambar no teste moral: estás disposto a abandonar o egoísmo mundano e fazer o que é certo? A redenção (ou a inevitável falência) é, portanto, o destino comum dos anti-heróis apresentados nesse tipo de filme. É inevitável que, ao exemplo dos clássicos noir e suspenses políticos, “Linha de Ação” se proponha a investigar uma grande teia de intrigas e conspirações ocultadas por uma premissa minimalista – no caso, sob simples véu de um caso de adultério.

O que Brian Tucker talvez não entenda é que a redenção do herói é só a cereja do bolo do gênero, e não a bússola narrativa. O que se propunha a ser um universo cheio de falsas intenções e personagens complexos vira uma caricatura não planejada e um discurso político tendencioso (e dualista). Em um cenário político norte-americano atual marcado pelo ferrenho combate democrata x republicano, Hollywood já fez sua escolha. Um prefeito caracterizado pela complexidade de seus interesses políticos vira instrumento de vilania republicana, enquanto um candidato democrata representa tudo o que há de mais puro e bem intencionado na política americana. Toda a dualidade e o maniqueísmo funcionam como estrada para a redenção moral de Billy Taggart.

Não deixa de ser interessante (ou patética) a tentativa de Hughes em emular a estética e o conteúdo noir, com direito a Catherine Zeta-Jones de femme fatale. Os frequentes closes angulares nos rostos dos atores, imersos em sombras ou não, são um tiro no pé: servem para reforçar a artificialidade das performances e deixar estampada a fraqueza cristalizada de seus arcos narrativos.

Billy Taggart é um anti-herói formulaico e para qualquer espectador que já tenha assistido a um par de exemplares do gênero, fica fácil deduzir as viradas narrativas e o destino do personagem. Em “Linha de Ação”, os fios soltos estão muito bem amarrados, e por isso mesmo Allen Hughes escreve errado por linhas retas.

Pedro Azevedo
@_pedroazevedo

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