Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 23 de setembro de 2012

Kátia (2012): a luta pela igualdade no sertão nordestino

O primeiro travesti eleito a um cargo político no país desafia o conservadorismo e mostra com bom humor sua jornada.

A luta pelo direito das minorias, principalmente a do movimento GLBT, tem sido um tópico de discussão intensa na última década. Como não poderia deixar de ser, a indústria cinematográfica tem acompanhado este debate, permitindo retratar cada vez mais a vida, os amores e temores deste grupo. “O Segredo de Brokeback Mountain”, “Milk – A Voz da Igualdade” e “Direito de Amar” são apenas alguns exemplos deste nicho que ganha força e espaço.

“Kátia”, da diretora piauiense Karla Holanda, se encaixa perfeitamente neste momento, e acompanha a vida de Kátia Tapety, a primeira travesti eleita a um cargo político no Brasil. Tapety já foi vereadora por três vezes e chegou a ser vice-prefeita em seu pequeno município no sertão do Piauí, estado com maior taxa de denúncias de violação de direitos contra GLBT.

Em uma colcha de retalhos muito bem humorada, possibilitada em parte pelo trabalho da edição, somos convidados a vislumbrar logo cedo uma vida de contrastes quase inconcebíveis. Uma hora estamos na roça maltratada pela seca, na vida humilde de um município que não chega a ter oito mil habitantes e, na outra, participando de uma parada pela igualdade em um trio elétrico, ou em um encontro da causa gay no Rio de Janeiro.

Talvez tenha faltado uma abordagem mais direta com relação ao trabalho feito pela primeira travesti a ser eleita no país e sua contribuição direta para o movimento que luta pela igualdade de direitos. Esse detalhe não tira o brilho de “Kátia” e é compensado ao não se limitar à figura desta e levar a discussão um pouco mais além, tratando de respeito às diferenças, aceitação das pessoas como são – arrumando tempo até para alfinetar o governador do estado, universalizando o debate, que sai de Colônia do Piauí, onde reside, e fala com qualquer espectador.

O tom pode parecer otimista demais de início, pintando quase que um oásis de respeito e cooperação no meio do sertão brasileiro, mas tem um bom fechamento ao chamar atenção ao fato de que Kátia é uma exceção na região em que vive, e até mesmo no País. Mesmo com as conquistas dos últimos anos, a homofobia ainda existe e continua sendo um assunto que precisa de atenção. Felizmente, o recado é dado a tempo e saímos com essa mensagem de alerta da sala de projeção.

Karla Holanda é professora de Cinema na Universidade Federal de Juiz de Fora e doutoranda em Documentário. “Kátia” é o primeiro longa-metragem documentário de Holanda e já conquistou o Prêmio Petrobrás Cultural.

Esse filme fez parte da programação do 45º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em setembro de 2012.

Bruno Maranhão
@bmaranhas

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