Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Cloverfield – Monstro (2008): um exemplo de comunicação multimidiática e globalizada

Cinema é muito mais do que apenas observação. Um cineasta que não consegue convidar o público a participar de sua obra é um cineasta sem talento. "Cloverfield" é a excelência do envolvimento e, através da exploração de mídias diferentes, o diretor Matt Reeves consegue criar um filme de monstro tão realista quanto se pode desejar.

Não é possível escrever sobre “Cloverfield” sem comentar sua campanha de marketing viral, informações que circularam pela internet desde julho do ano passado. Tudo começou com o teaser trailer do filme dirigido por Matt Reeves. As imagens de uma explosão em Nova York, somadas à cabeça da Estátua da Liberdade rolando pelas ruas da cidade, completamente arranhada e mordida conquistaram o público quase imediatamente.

Lentamente, o site oficial do filme, até então sem título, divulgou fotos do que seria o relato de sobreviventes. A partir de horários impressos nas imagens era possível criar uma seqüência que antecipava o que estava por vir. Até que uma das imagens, um homem japonês segurando um prato típico, surgiu com uma receita japonesa atrás. A receita mencionava um ingrediente crucial: o “néctar do oceano profundo”. A palavra traduzida, uma vez pesquisada no Google, guiava o leitor para dois sites, o da companhia Tagruato (www.tagruato.jp), e o da bebida Slusho! (www.slusho.jp). As duas empresas, criadas para promoverem o longa-metragem, apresentavam pequenas pistas do que seria o sensacional “Cloverfield”.

“Cloverfield” é apenas um filme de monstro. Sua história não passa de um grupo de amigos que lutam para sobreviver em Manhattan na ocasião da invasão de uma criatura que não apenas destrói prédios e resiste aos ataques do exército americano, mas também carrega consigo outros pequenos seres que atacam humanos. O que torna a obra tão surpreendente e emocionante é, portanto, todas as pequenas informações colhidas ao longo dos meses e os detalhes captados entre as gravações amadoras de Hud ou Rob.

São 80 minutos de projeção, tempo exato da duração de uma fita filmadora comum. O filme começa com Rob e Beth, um casal apaixonado que decide passar o dia juntos. Em cima da gravação feita por Rob, seu irmão grava sua festa de despedida. Rob está de partida para o Japão, onde será o vice-presidente de uma grande companhia. Enquanto todos comemoram e Rob tenta dizer a Beth que a ama, um estrondo interrompe o evento.

Rob, seu irmão Jason e seus amigos Marlena, Lily e Hud, segurando a câmera, fogem do apartamento e, quando percebem que não estão seguros na ilha de Manhattan, decidem escapar. Rob, apaixonado, resolve voltar para salvar Beth, presa devido ao desabamento de seu prédio. A partir daí o ataque do monstro adquire uma trama paralela muito mais interessante: o resgate de Beth.

“Cloverfield” é intrigante, pois já carregava essa característica muito antes de estrear nos cinemas. Provocava o espectador com as pistas exibidas nos sites ou rumores criados para deixar todo o enredo ainda mais misterioso. O fato de acompanharmos os acontecimentos da noite do dia 22 de maio apenas através dos olhos de sobreviventes, desesperados em ajudar uma amiga e saírem vivos da cidade, complementam o que foi realizado durante toda a campanha de divulgação. O mistério está sempre presente e cabe aos interessados descobrir o que realmente aconteceu.

Matt Reeves e o produtor J.J. Abrams, mestre em causar comoção em torno de suas obras, convidam os cinéfilos a participarem do filme. Os 80 minutos gravados por Hud são um relato histórico de uma noite completamente assustadora, nada têm a ver com os personagens, que, aliás, são desinteressantes e agem de maneira estúpida.

Os que tiverem acompanhado a campanha de marketing viral de “Cloverfield”, sem sombra de dúvidas, irão se envolver muito mais, pois estão inseridas no mundo criado pela equipe criativa do longa-metragem. A operação “Cloverfield”, como foi chamada a defesa ao ataque do monstro, é muito mais do que apenas o filme homônimo e, portanto, há mais a ser descoberto do que a fita de Hud, Rob e os outros.

Há boatos de que outras informações surgirão com o tempo e o estrondoso sucesso de “Cloverfield” pode garantir uma seqüência, dessa vez filmada sob outro ponto de vista, algo que o diretor Matt Reeves já declarou ter interesse e material para realizar.

“Cloverfield” é um excelente filme do gênero monstro e uma prova ainda melhor do que é possível fazer com a comunicação multimidiática e globalizadas que existem. Sabendo explorar todos os recursos disponíveis na internet e a curiosidade natural da raça humana, a experiência do cinema se torna algo muito maior do que apenas a observação. O surgimento de um sucesso de bilheteria é garantido, mesmo com os personagens fracos, atores ruins e ângulos de filmagens ainda piores. O que importa é o espectador sair do cinema sentindo que fez parte de um momento único na história da humanidade, sendo ele real ou fictício.

Lais Cattassini
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