Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de março de 2005

Amigo Oculto, O

"O Amigo Oculto" veio com muita pretensão, mas com pouca coisa para mostrar. O filme não é o que todos devem estar esperando, mas como gosto não se discute, alguém, por ventura, pode voltar feliz pra casa.

"Estardalhaço", uma palavra pouco conhecida, mas que ouvi bastante nas últimas semanas. Talvez seja o que Hollywood procura a cada novo filme produzido. Infelizmente tudo em exagero acarreta problemas. A última prova disso foi esse filme que vos falo. A 20th Century Fox, em um exagero tamanho, resolveu adotar algumas medidas pra chamar a atenção do público para "O Amigo Oculto". Pra começar, a mesma anunciou em alto e bom som que o filme possui um final surpreendente. Depois, pra manter o suspense no ar e privar as pessoas de tamanha surpresa com os chatos 'spoilers', optaram por distribuir os rolos que contêm as cenas finais do filme apenas na data de estréia. E pra terminar, criaram um final alternativo pra ser exibido na outra metade das salas pelo mundo. Agora você, fã do cinema e do suspense, deve estar pensando: "Nossa, esse filme deve ser massa!". O problema maior deve estar aí. A 20th Century Fox fez tamanha propaganda, que acabamos criando uma expectativa enorme, quando na verdade o filme consegue apenas satisfazer.

Na mesma linha de "O Sexto Sentido", "O Amigo Oculto" é um suspense sobrenatural com o vencedor do Oscar® Robert De Niro, como David Callaway, um pai viúvo e dedicado, e Dakota Fanning como sua filha Emily. Quando a história começa, a esposa de Callaway, Alison (Amy Irving), morre repentinamente e pai e filha se mudam para separar Emily das memórias de sua vida com sua mãe. Logo depois, Emily desenvolve uma amizade com o amigo imaginário Charlie e uma série de acontecimentos terríveis leva David a pensar que Charlie pode ser real.

Em uma entrevista o produtor Barry Josephson declarou que Robert De Niro foi essencial para o filme, talvez porque no fundo ele soubesse que apenas boas interpretações poderiam salvar o longa. Boas atuações essas que garantiram Robert De Niro e Dakota Fanning o título de 'salvadores da pátria', pois suas interpretações são demais agradáveis. Suas personagens exigiam alto grau de concentração e até mudança de personalidade, algo que Dakota conseguiu com grande maestria. A cada filme que a pequena notável participa, percebe-se o quanto ela é talentosa. Prova disso foi a sua escolha para o papel de Emily. "Não acho que exista por aí uma atriz melhor na idade dela”, falou Barry Josephson.

Seguindo aquele ditado "Quando não é 8 é 80", temos do outro lado os coadjuvantes. Enquanto De Niro e Dakota dão o ar da graça, Elizabeth Shue, Famke Janssen e Dylan Baker não agradam em nada. Já vi Elizabeth em papéis melhores. Quem não se lembra da bela Sera de "Despedida em Las Vegas" ao lado do então ganhador do Oscar, Nicolas Cage? Até mesmo em "O Santo" ela estava mais disposta. Famke Janssen teve uma presença desnecessária e Dylan Baker como o Sherife pareceu mais uma criança com uma pistola d'água. Destaque para Amy Irving, que nos poucos minutos que aparece consegue agradar.

Seguindo a mesma risca de todo suspense sobrenatural, temos uma família abalada, uma criança maluca, um pai que não sabe o que fazer e uma fotografia que busca o sinistro. Grande parte do filme se passa durante a noite, e como sempre as cenas que se passam de manhã são sempre frias e nubladas. Uma pergunta sem muita pretensão, mas se ele quer sair daquele ambiente triste, porque eles não se mudam pra uma praia ensolarada, cheia de gente bonita como a do seriado "SOS Malibu"? Por que é um suspense clichê como todos os outros. Eles acabam indo parar numa cidade quase abandonada, numa casa que fica longe do centro, rodeada de mato e com uns vizinhos sorridentes, mas nada agradáveis.

Pra variar o filme tem aquela bendita cena na qual o pai entra no quarto e pega a criança fazendo desenhos absurdos de coisas macabras e pessoas sem rosto. Eles não se cansam disso? Foi assim em "O Chamado" e "Efeito Borboleta". Sem contar as inúmeras cenas de portas abrindo e barulhos pela casa, que de tanto assistir suspenses você já sabe o que vai acontecer. Continuamos batendo na mesma tecla. Está faltando originalidade. Está faltando criatividade. E o final tão surpreendente, na verdade nem é. Você fica torcendo pra que não acabe da forma que você está pensando, mas, pra sua tristeza, acaba do jeito que você menos deseja. O engraçado é que durante a cena final (sim, você já sabe que o filme vai acabar ali) você torce e esboça diversas outras maneiras legais para um fim chocante. Mas ai vem aquele momento tão esperado por todos, o ápice da história, quando tudo finalmente se revela… a mesma coisa de sempre.

Enfim, em uma rápida comparação, o filme veio cheio de amor pra dar, mas na hora H não levantou, e no final quem acaba dormindo é você.

Bruno Sales
@rmontanare

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