Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de março de 2005

Entrando Numa Fria Maior Ainda

A pior coisa do filme, pelo menos aqui no Brasil, é a tradução do seu nome original para o português, além da tradução do nome Focker para Fornika, que é extremamente bizarra desde a primeira versão. No mais, é uma comédia para dar ótimas risadas, mas nada, além disso.

Desde que eu comecei a tomar consciência sobre as coisas do mundo, coloquei na minha cabeça que o cinema tem como objetivo três fatores: divertir, ensinar e emocionar. Existem vários outros motivos pelo qual o cinema é importante, como socializar, mas estes são prioridade, na minha opinião. O filme quando consegue esses três feitos, pode-se dizer que é uma obra-de-arte. Quando alcança dois, é um ótimo filme. Quando cumpre pelo menos um, ele desempenha bem o seu papel.
"Entrando Numa Fria Maior Ainda" cumpre bem o seu objetivo de divertir, e isso faz dele um bom filme. Se há problemas no roteiro, se as piadas não encaixam bem para determinados públicos, se os ensinamentos são clichês, isso pouco importa quando você consegue extrair sorrisos da platéia. Creio que o grande feito para um cineasta de comédias é, além do filme faturar muito, conseguir com que as pessoas possam sorrir sem serem forçadas a isso (como aquela velha e manjada tática de flatulência nos filmes nacionais), mas que sorriam naturalmente.

Se o filme tem piadas ótimas para os norte-americanos e pouco engraçadas para o brazucas, pouco importa. Quando você consegue captar a essência do filme, todas as piadas passam ser engraçadas uniformemente. Seja você do Texas ou de Santa Catarina. Os críticos detestam esse tipo de comédia que abusa da escatologia para extrair risos. Má fé? Mal gosto? Talvez, mas o objetivo do filme não é bem esse, afinal, é sempre interessante mostrar as inusitadas presepadas de um personagem que faz de tudo para agradar seu sogro, jamais conseguindo êxito. Infelizmente nesta versão eles exageraram um pouco na imaginação, mas isso não prejudica o filme em seu todo. Você entenderá em breve o que quero dizer.

Há quatro anos o público foi convidado a acompanhar o enfermeiro Gaylord (também conhecido como Greg) Focker num fim-de-semana em que ele perde a bagagem, incendeia o quintal, se excede um pouco num voleibol aquático, pinta o gato e é submetido a um detector de mentira por Jack Byrnes, o pai da sua namorada. Jack dizia ser horticultor, mas, na verdade, é um ex-agente da CIA relutante em permitir a entrada de Greg no "Círculo de Confiança" da Família Byrnes. Agora que Greg conseguiu entrar para o tal círculo, as coisas vão muito bem. Ele e sua noiva Pam estão animados com o planejamento do casamento e falta apenas uma coisinha para liberar o caminho para o altar: os futuros sogros têm que passar um fim-de-semana juntos.

Greg e Pam sobem a bordo do moderníssimo "trailer" (um p*ta ônibus, que parece mais um quarto de hotel) do pai da moça para uma viagem à Ilha Focker, o domicílio em Cocoanut Grove de Bernie e Roz Focker. As próximas 48 horas darão aos parentes um pouco de tempo para se conhecerem e, o mais importante: darão a Jack a oportunidade de estudar os pais de Greg. As coisas começam bem, mas isso é antes de Jack descobrir que o advogado e a médica presentes são, na verdade, um pai liberal aposentado e uma terapeuta sexual. Há ainda o episódio no banheiro do "trailer", um jogo de futebol americano, a comida cubana condimentada, o incidente do garotinho com a cola…

Trapalhadas. Quem nunca fez uma, ao menos? Principalmente quando você quer mostrar um fato que agrade aos seus sogros, mas acaba tudo errado. O filme, desde sua primeira versão, bate nessa tecla. Pode cansar um pouco, mas a inúmeras atrapalhadas pagam o filme. É o tipo de película da qual você não se arrepende de ter pago o ingresso (que é caro, por sinal), mas que também não é lá essas coisas todas. Falta inteligência no roteiro, e no caminhar da vida dos personagens (há muitas contradições, como a personalidade do durão Jack). E se ele peca nestes pontos, ele agrada nas piadas. Clichês, sem dúvida, mas afinal, o quê na nossa vida não é clichê? Isso não é desculpa para terem piadas repetidas, mas pegar no pé do filme por causa das suas piadas batidas é, no mínimo, besteira. Funcionou uma vez, porque não pode funcionar de novo? Isso é mania de querer criticar tudo e a todos.

A química entre os personagens é ótima. E o que falar dos diferentes tipos de personalidades dos personagens? Jack Byrnes (Robert De Niro fazendo um ótimo trabalho) é o durão, o chefe da casa e o mandante de todas as reviravoltas do filme. Aquele sogro abusado e mal encarado que todo cara odeia e treme de medo. Dina Byrnes (Blythe Danner) é sua esposa, uma infeliz no casamento e acomodada sexualmente. Pam Byrnes (Teri Polo) é filha deles dois, uma linda e meiga mulher que está prestes a se casar com… Greg Focker (o engraçadinho Ben Stiller), um enfermeiro atrapalhado que faz de tudo para agradar aos seus sogros. Do outro lado temos Bernie Focker (uma ótima caricatura de personagem por Dustin Hoffman), um ex-advogado com pensamentos naturalistas, todo zen e que adora sexo. Roz Focker (Barbra Streisand, numa boa participação), mulher de Bernie, uma terapeuta sexual de idosos.

Todos os seis personagens interagem com o sétimo, Jack (interpretado pelos irmãos gêmeos Spencer e Bradley Pickren). Ele, depois de Dustin Hoffman e Barbra Streisand, é o principal personagem e motivo de risadas do filme. Uma graça! Imagino o tempo que demorou para fazer as cenas das quais ele participou. O mais engraçado é ele falando: "Ba … baca"! Muito engraçado mesmo! Jack Byrnes insiste em tratar o bebê como um adulto. Ensina linguagem dos sinais (muito engraçada por sinal), teorias e histórias. O mais engraçado de tudo, é que a família Focker o trata de outra forma. No filme temos também a participação de Owen Wilson, que está sendo especialista como Adam Sandler e Rob Schneider, em fazer pontas em filmes.

Dizer que um filme é uma droga dispensável, eu não direi. É uma boa comédia, com piadas básicas, personagens completamente diferentes e uma estorinha cotidiana. Enquanto presenciamos tanta droga ultimamente, vale a pena dar uma conferida. Algumas risadas você dará, mesmo que a tática para isso acontecer seja batida. Bilheteria não quer dizer se o filme é bom ou ruim, mas pelo menos o público norte-americano está aceitando bem a comédia, já que na terceira semana de exibição já havia faturado US$ 240 milhões em bilheterias. Acho que dá para prever uma continuação. Tomara que os clichês desapareçam… ou não.

Jurandir Filho
@jurandirfilho

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