Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 18 de outubro de 2019

O Sinal – Frequência do Medo (2014): questionando o impacto da realidade

A produção flerta com o suspense e surpreende na concepção de mundo. Anônimo do público, a obra é instigante e merece ser descoberta por todo amante de Sci-Fi.

A especulação está no cerne da ficção científica. É um gênero que gira em torno de conceitos imaginativos geralmente relacionados com o futuro, com a ciência e com tecnologia. E o que norteia essas abordagens é a relação do homem com essas questões, sejam elas físicas ou filosóficas. Em certo grau da análise, pode-se dizer que “O Sinal – Frequência do Medo” é um filme que pontua esses temas mesmo sem nenhuma inovação em sua premissa. É admirável como a narrativa cinematográfica é capaz de dizer muito com pouco, ou de fazer muito tendo menos. Para além da experiência visual, estamos diante de um filme que não veio para fazer perguntas sem respostas, mas para questionar se estamos preparados psicologicamente para o impacto da realidade.

Sem rodeios na apresentação e já estamos acompanhando três amigos em uma viagem pelo sudoeste americano para desvendar o paradeiro de um misterioso hacker. Com elipses agressivas para avançar a trama, logo entendemos a química entre o casal de namorados Haley (Olivia Cooke) e Nic (Brenton Thwaites) e do amigo Jonah (Beau Knapp). Paira entre o trio uma atmosfera delicada porque Nic tem um leve grau de deficiência física e recusa atenção especial para suas necessidades. Esse primeiro ato se desenvolve lentamente com a fotografia explorando enquadramentos contemplativos diante da paisagem de Nevada.

Logo, eles encontram uma casa isolada onde possivelmente encontrarão pistas, mas são surpreendidos por alguma coisa não identificável na escuridão da noite. Nic acorda em uma espécie de complexo misterioso onde começa a ser examinado e testado por cientistas inteiramente trajados com uma roupa de proteção. Nesse ponto a estética do longa muda. A atmosfera ganha contornos de terror e as sessões de interrogatório são cadenciadas por um suspense claustrofóbico. Afinal, Nic não sabe se a namorada e o amigo também estão sendo mantidos presos. O espectador é condicionado a acompanhar a narrativa pelo mistério porque estamos retidos na perspectiva do personagem.

As elipses que de início davam ritmo, no terceiro ato aceleram demais os acontecimentos. Os garotos se esforçam na atuação, mas são bem limitados. Apesar de proposital, a trama carece de uma melhor abordagem dos cientistas e dos seus reais objetivos. Porém, isso não tira o mérito do rumo que o final toma. Aliás, a imprevisibilidade do roteiro prende a atenção a cada novo ato. Nesse quesito, a escolha de Laurence Fishburne como inquisidor atiça a memória para o seu Morpheus de “Matrix”. O drama pela liberdade traz urgência e o visual abraça a ficção sem medo de assumir riscos. 

Com teor de road movie e um plot twist ambicioso que pode incomodar os desavisados, “O Sinal – Frequência do Medo” tem uma proposta ousada e coragem em suas decisões. É comum em ficções científicas que esses artifícios sejam usados como muleta, mas aqui o diretor William Eubank (“Love”) os usa como meios e fins. É um filme econômico nas respostas e atemporal em seus questionamentos. Nic luta para se libertar e aprende a lição: o maior anseio da humanidade sempre será pela verdade, mesmo que as pessoas relutem em aceitá-la.

Jefferson José
@JeffersonJose_M

Compartilhe