Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Anna – O Perigo Tem Nome (2019): ação sem adrenalina

Filme tem uma única cena de ação boa, perdida num mar de reviravoltas enfadonhas, trama confusa e personagens desperdiçados.

Luc Besson despontou para o mercado americano com “Nikita – Criada para Matar”. Desde então ele lançou filmes de grande sucesso como “O Profissional” e “O Quinto Elemento”, e outros de qualidade duvidável, como “Lucy” e “Valerian e a Cidade dos Mil Planetas”. Após o fracasso do último, que foi uma tentativa do diretor francês de iniciar uma franquia de aventura e ficção científica nos cinemas, ele volta às raízes com “Anna – O Perigo Tem Nome”. Infelizmente, o que poderia ter rendido uma atualização da narrativa da femme fatale focalizada por suas câmeras acaba caindo num filme genérico, com roteiro confuso e falta de ritmo.

Besson é conhecido por ter trabalhado com atrizes em seus papéis principais, que exalavam carisma em filmes com ótimas sequências de ação mescladas com humor excêntrico e uma trama fora da caixa. A da vez é Sasha Luss, modelo que só havia aparecido no filme anterior do diretor, e sua interpretação já é um dos indícios que este não é dos seus melhores longas. Ela até tem o sex appeal que a personagem pede, mas não o magnetismo que, por exemplo, Milla Jovovich tinha em “O Quinto Elemento”.

Quanto às cenas de ação, o filme só tem uma que realmente surpreende, numa sequência em que Luss se mostra capaz de carregar coreografias de luta com impacto e energia. É onde Besson sabe abrir o plano para que tudo seja executado com poucos cortes, permitindo que o espectador se delicie com aquele momento. Faz também com que cenas similares sejam esperadas, o que só aumenta a decepção conforme o tempo de projeção vai passando e praticamente nada movimentado realmente acontece.

Na parte de misturar humor na narrativa, o roteiro sofre. Com uma pegada mais sóbria do que está acostumado, Besson erra a mão e não consegue equilibrar as raras (e falhas) tentativas de fazer o público rir com a jornada de sua protagonista, resultando num longa tedioso e decepcionante. Na trama, Anna é recrutada para ser modelo em Paris, logo se envolvendo com um dos sócios da firma, apenas para assassiná-lo a sangue frio após dois meses de relacionamento. Tudo isso nos primeiros quinze minutos, que são seguidos por constantes reviravoltas. Se as primeiras funcionam e surpreendem, logo fica claro que os incessantes pulos temporais serão repetidos à exaustão, o que faz com que os últimos sejam previsíveis e bobos. Ao bater na mesma tecla repetidas vezes, o peso dramático é perdido.

Não ajuda ter personagens mal aproveitados. A namorada de Anna, Maud (a estreante Lera Abova), tem zero função narrativa. O triângulo amoroso entre a protagonista, Alex (Luke Evan, “A Bela e a Fera”) e Leonard (Cillian Murhpy, “Dunkirk”) é ridículo e sem vida, e estraga o personagem de Murphy, que até então parecia misterioso e intrigante. Há uma cena com o casal dentro de um armário em que se nota, pela trilha e pelo lento zoom de Besson, a intenção de transmitir a tensão sexual entre ambos, mas é tudo tão sem tempero e sem nexo que só leva o espectador a levantar uma sobrancelha em dúvida quanto ao que realmente está acontecendo ali. A única personagem que realmente funciona e diverte é a Olga de Helen Mirren (“A Grande Mentira”), chefe de Anna na KGB que tem uma ótima mistura de sarcasmo e determinação, mas que sofre com um texto que tenta criar uma subcamada de maternidade que, francamente, é patética.

Com cenas desconexas e inúteis, uma protagonista medíocre, narrativa confusa e uma única cena de ação decente, “Anna – O Perigo Tem Nome” erra até em coisas triviais, como laptops altamente avançados para jovens pobres da periferia de Moscou em 1987, onde alguns dos itens nem sequer tinham sido inventados ainda. Esse tipo de descuido dá a impressão de que tudo foi feito sem carinho e real interesse, resultando no longa entediante do cineasta francês.

Bruno Passos
@passosnerds

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