Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 11 de agosto de 2019

O Filho Protegido (Netflix, 2019): muita promessa, pouca entrega

O suspense argentino até se esforça, mas é vencido pelo fraco roteiro.

A Netflix apostou em um intrigante suspense trazido pelo diretor argentino Sebastián Schindel (“El patrón: radiografía de un crimen”), mas apesar de ter um bom potencial, “O Filho Protegido” decepciona. A trama adaptada do romance “Una Madre Protetora”, do escritor Guillermo Martínez, conta a história de um pintor chamado Lorenzo (Joaquín Furriel, “Árvore de Sangue”), que tenta reconstruir a sua vida após um divórcio conturbado, ao lado da nova esposa Sigrid (Heidi Toini, “A Caverna: Perigo Subterrâneo”). Porém, ao engravidar, a mulher começa a demonstrar um cuidado excessivo com o filho, tomando decisões duvidosas que aos poucos vão prejudicando a relação dos dois. Após um incidente, Lorenzo é detido e impedido de ver o bebê. Passa então a contar com a ajuda do casal de amigos Julieta (Martina Gusman, “Elefante Branco”), que é advogada, e Renato (Luciano Cáceres, “Ponto Morto”) para conseguir ver seu filho novamente.

O filme utiliza uma montagem não linear, misturando eventos do presente e futuro, em uma tentativa de pôr em questionamento a sanidade mental do protagonista diante dos acontecimentos. No entanto, o roteiro falha ao entregar as viradas e revelações, causando um imenso anti-clímax.

É notável o esforço do diretor em criar uma ambientação interessante e instigante, buscando enquadrar os personagens na fotografia referindo-se à profissão do protagonista, e compondo as cenas em forma espiralada em alusão ao desenvolvimento embrionário. Porém, o resultado fica forçado devido ao roteiro ser fraco e não conseguir preencher os signos criados para a trama. É como usar uma capa bonita para um livro em branco. Não há substância na obra de Schindel.

Vários elementos que poderiam dar mais profundidade à trama foram inseridos e abandonados, como por exemplo a relação entre os personagens Julieta, Lorenzo e Sigrid. Fica sugerido que há um estranhamento entre os três que resultaria em ciúmes e talvez até em um triângulo amoroso, porém essas sugestões são completamente esquecidas. Pouco se sabe sobre de Heidi, muito menos sobre os amigos do pintor. Esse e outros detalhes resultaram em personagens rasos com pouco desenvolvimento, sendo Lorenzo o único a cativar o espectador, embora o roteiro questione suas ações. Isso se deve também à boa atuação de Joaquín, que consegue carregar boa parte do filme pra frente.

Além disso, desde sua introdução, o longa deixa jogadas várias referências à sequência de Fibonacci, sendo a principal inspiração de Lorenzo em suas obras, apenas para seres descartadas completamente. Nenhum dos signos plantados tem alguma utilidade para o roteiro, não evolui a trama, não se conecta com os personagens, nada. Nota-se que há uma boa história querendo ser contada, mas o espectador fica com a incumbência de terminá-la, uma vez que o filme acaba sem responder às próprias perguntas. Mesmo que em sua última cena pareça haver algum esforço para completar lacunas que o roteiro não conseguiu preencher, resulta-se em um epílogo desnecessário e descartável que em nada acrescenta ao filme.

Assim, com uma história interessante, elementos instigadores e algumas boas atuações, “O Filho Protegido” tem várias ferramentas, mas não sabe usar nenhuma. Não consegue ser mais que uma boa ideia mal desenvolvida.

Tayana Teister
@tayteister

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