Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 03 de agosto de 2019

Os Papéis de Aspern (2018): o passado aprisiona

Tem coisas do passado que precisam ficar no passado ou simplesmente não querem sair de lá. Um longa mediano, salvo principalmente pelas atuações de Vanessa Redgrave e Joely Richardson.

Inspirado no livro “Os Papéis de Aspern” de 1888, escrito por Henry James, o drama de mesmo título dirigido por Julien Landais, que fez sua estreia como diretor neste longa, ganhou vida nas telonas. Além da responsabilidade que dirigir seu primeiro trabalho traz, Julien tem o peso de dirigir um filme que tem no elenco Vanessa Redgrave (“Ao Entardecer”). Vanessa volta a fazer parte desta história, pois já havia atuado em 1984 em uma adaptação ao teatro da mesma obra, mas agora atuando ao lado de sua filha Joely Richardson (“Fallen”).

A trama nos apresenta Morton Vint, vivido por Jonathan Rhys Meyers (“O Som do Coração”), o protagonista da história. Ele é um editor americano completamente apaixonado nas obras de Jeffrey Aspern, famoso poeta romântico que havia falecido de forma misteriosa. Ao saber da existência de que cartas e livros, nunca antes revelados a ninguém, estariam escondidos por Juliana (Vanessa Redgrave) que foi amante do artista, Morton não mede esforços para conseguir tê-las em mãos. Em meio ao desafio de conseguir tais tesouros, Morton conhece Tina (Joely Richardson), que parece estar predestinada a cuidar de sua tia Juliana e condenada a viver aquém do mundo, e tenta seduzi-la para obter as cartas.

“Os Papéis de Aspern” tem uma produção muito boa em vários aspectos. Visualmente, o filme lhe carrega rapidamente para o século XIX. O filme se passa em Veneza, sendo assim, quase impossível falar mal da fotografia, que também nos apresenta tomadas deslumbrantes e planos bem fechados que acrescentam à trama. O figurino é praticamente impecável, chega a parecer que pegaram um quadro de Pierre Auguste Renoir e deram vida a ele. Tudo isso, alinhado ao tom sempre sério e sombrio imposto por Julien Landais, dá um ar apreensivo ao filme.

O roteiro de “Os Papéis de Aspern” é interessante e apresenta uma história intrigante. Quanto às atuações, elas ficam bem divididas. A dupla Juliana e Tina é o ponto alto da trama. Já era de se esperar a bela atuação da Vanessa, mas sua filha Joely surpreende e consegue entregar toda inocência que Tina carrega. Em contraponto, Rhys Meyers não entrega um personagem no nível das outras duas atrizes. Ele não consegue convencer e parece um tanto perdido e forçado em seu papel. Fazendo até o personagem ganhar uma antipatia do público.

O filme se propõe a ser bem direto, sem muitos arrodeios em seu roteiro, mas por vezes se complica até mesmo nesse ponto. A trama chega ao seu fim sem explicar muitos pontos jogados ao telespectador durante o longa e simplesmente termina em branco. O roteiro também apresenta algumas falhas, começa muito lento e sem localizar o espectador. O longa se perde algumas vezes no tom que adota, pois para explicar o passado de Aspern se utiliza de flashbacks. Em certa cena isso se confunde, ficando muito difícil saber o que é flashback, sonho ou realidade. O arco de Tina, que é o que mais há desenvolvimento, tem uma mudança muito brusca sem uma explicação concreta.

No geral, “Os Papéis de Aspern” se mostra um filme regular, afinal, sempre é difícil adaptar um livro nas telonas. E entre os erros e acertos, os acertos merecem certo olhar carinhoso. O clima sempre tenso com personagens quase nunca demonstrando felicidade ou simplesmente sorrindo, o fato de não responder algumas perguntas deixa o ar de mistério bem carregado, as ótimas atuações de Vanessa e Joely, entre outros pontos, agregam muito a trama e fazem com que se mostre uma boa obra para quem quer fugir dos filmes mais badalados do momento e quer um pouco de calma. Entretanto, está longe de ser um filme maravilhosamente cativante.

André Bastos
@_drebastos

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